Bullying: a educação que vem do berço!
Jacqueline Caixeta
Recentemente, um caso chamou a atenção na mídia: um aluno foi espancado e morto por um colega. Motivo? Segundo relato do pai, o filho sofria bullying na escola.
Nós, professores que passamos alguns anos nos cursos de licenciatura, especializações, mestrado, doutorado, enfim, que buscamos nos bancos da academia uma formação que pudesse nos garantir sucesso profissional, muito aprendemos sobre psicologia emocional e social, além, lógico, do aprofundamento nas áreas pedagógicas de cada curso, no entanto, estamos diante de um problema que vem surgindo cada vez com mais força em nossas salas de aula: o bullying.
Crianças e adolescentes trazem para a escola comportamentos que, por mais que tentemos trabalhar com eles, somos vencidos, somos derrotados em muitas ações. Falta de competência nossa? Falta de formação? Alguém pode dizer que um professor não soube lidar com o bullying em sala de aula porque não estava preparado para tal situação? Não, definitivamente não. Nós, professores, estamos nos descabelando em busca de mais e mais leituras e formações para lidar com essa onda de violência que chega nas escolas.
É comum ouvir um pai relatar que “na escola do meu filho tem bullying”. Eu pergunto: “Quem levou o bullying para a escola?” Porque, até onde eu sei, em nenhuma matriz curricular tem a disciplina bullying, professor nenhum ensina bullying. Se tem bullying na escola, quem leva são os alunos.
Na tentativa de resolver o problema, trazemos para nossas matrizes e colocamos como algo importante, necessário e urgente, um trabalho de prevenção contra o bullying, que conta com discussões, palestras, encontros com dinâmicas, e tantas outras ações. Não sei se a palavra seria essa, mas essas ações, são o “limite” da escola. Quando falo em limite, trago para discussão até onde podemos ir.
Meu filho sofre bullying na escola e a escola não faz nada. Será mesmo que não estamos fazendo nada? Ou será que todas as nossas ações estão esbarrando em algo que nos impede de ser mais competentes?
Esse “algo” nada mais é do que as famílias. Se, em casa, os pais continuarem a pensar que o problema de resolver o bullying na escola é só da escola e não começarem a cuidar de seus filhos, ouvindo-os e orientando-os com mais afinco e mudando suas posturas enquanto pais educadores, estaremos nadando contra a maré.
Uma criança que chega com falas homofóbicas, piadinhas racistas, comportamentos de superioridade e preconceitos, com certeza não aprendeu isso na escola. Ela traz de sua formação, o espelho de seus pais. Não adianta querer ir na escola e brigar porque o filho está sofrendo bullying, se, em casa, você permanece com comportamentos como rir de certas minorias, menosprezar certas condições, debochar de pessoas com características diferentes das suas, humilhar e desprezar pessoas por sua cor ou condição social. Seu filho, mesmo bem pequeno, aprende direitinho com o seu comportamento. O bullying só surge em situações assim, em que alguém se sente superior a outro alguém, e se acha no direito de rir, perseguir, humilhar.
Lidar com crianças e adolescentes que trazem uma diversidade incrível de famílias, que pensam e comungam de valores tão distintos, é extremamente desafiador. Infelizmente, trazem atitudes que, aos olhos dos pais, são normais. E, como convivem com essas atitudes, também acham que “não tem nada a ver” eu “zoar” meu “amigo”. E aí, quando chamamos as famílias das crianças e/ou adolescentes que estão “brincando de zoar”, de “pegar no pé do colega”, ainda escutamos a seguinte frase: “ Nossa, que “chatura”, hoje em dia não se pode nem brincar mais”. E vamos percebendo que todo bullying começa de uma brincadeira oriunda de uma intenção de diminuir, desprezar alguém e que, pior, isso o aluno que faz bullying, aprendeu em casa, como sendo uma coisa normal.
É normal, pelo menos até seu filho sofrer bullying, não é mesmo? O que acontece com as famílias dos alunos que praticam o bullying é que elas não conseguem perceber que estão, de maneira inconsciente, reforçando comportamentos que machucam.
A questão do bullying ultrapassa os muros da escola e toda e qualquer formação que nós, professores, possamos ter. Se, em cada lar, preconceitos continuarem a perpetuar, piadinhas racistas, homofóbicas, e tantas outras, desfilarem pelas risadas dos churrascos de família, vai ser muito difícil vencer essa luta. Se cada pai e mãe não abrir os olhos para perceberem que seus comportamentos ensinam muito mais do que qualquer fala hipócrita, vai ficar cada vez mais difícil. Não adianta eu falar para o meu filho não rir do coleguinha porque ele é diferente e me comportar com ações que evidenciam a pouca importância que dou para minha fala. A educação, principalmente a de valores, não pode ser desvinculada da prática. Ter uma fala e agir de maneira contrária é hipocrisia e não educa.
Calma, não estou jogando a bola só para as famílias, embora eu acredite que elas sim devem ser as maiores responsáveis quando o assunto é educar em valores, mas também me coloco, como escola, estando tanto tempo dentro deste espaço rico e diverso em que as relações acontecem, como responsável. A minha (nossa) responsabilidade é em trabalhar temas preventivos e agir mediante situações reais. Digo situações reais, porque muito tem se banalizado o bullying. Nem tudo é bullying, e tudo vira bullying quando não se enxerga a situação com clareza.
A função da escola é clarear aos pais e alunos sobre o que realmente é bullying, trabalhar o tema com respeito e muita seriedade e intervir sempre que ele acontece. Precisamos, também, fortalecer nossos alunos emocionalmente para lidarem com questões adversas e não se fragilizarem tanto.
Por fim, se escola e família fizerem seu “dever de casa” direitinho, teremos condições para fazer com que os dias entre nossas crianças e adolescentes sejam mais frutíferos, respeitosos, afetivos, e que nossos alunos tenham plena consciência de que somos todos diferentes, e ser diferente é normal. O fato de conviver com alguém diferente em tantos aspectos só enriquece as relações e amplia possibilidades sociais. O respeito precisa ser a base de toda e qualquer convivência.
O preconceito e as piadinhas que visam diminuir as pessoas ou ridicularizá-las não cabem mais neste século. As famílias precisam repensar seus valores.
Com afeto,
Jacqueline Caixeta
Poir e quando seu filho sofre isso em uma escola pública, por querer estudar e nada é feito . A escola sagrada família, o famoso sagradinha e assim.
Texto maravilhoso!!
Belas palavras e doam a quem doer, a responsabilidade de ensinar cabe aos professores, mas a de educar sempre será dos pais, nada de inverter ou transferir para a colaboradora que trabalha na casa da família ou para os professores.
Sempre valerá a fala de quê: educação vem de berço e valorização e respeito se vem do exemplo. Acordemos pais, nós que parimos os nossos filhos, nós que somos responsáveis pela formação do caráter dele, acordemos pais, com as nossas atitudes e com a nossa responsabilidade de criar e educar os nossos filhos.