O mito da representatividade partidária nas esquerdas: “falam deles”, às vezes “pra eles” e quase nunca “pela boca deles”.

Tiago Tristão Artero

O debate não foi suficiente para a mudança de paradigma e de materialização das ações de representatividade nas candidaturas, foram necessárias intervenções nas leis para que a intenção de equidade de gênero fosse posta, a passos curtos, na prática. Diga-se de passagem, que a porcentagem destinada às mulheres ficam, muita das vezes, sem representação alguma e a porcentagem de eleitas é ainda menor se comparada com a mesma porcentagem de homens que disputaram as eleições, dando a entender que há uma soma de fatores, desde a (falta de) prioridade na campanha até a atitude das/dos eleitoras(es).

Por que falar das esquerdas? Porque esta dimensão está entre suas pautas sociais defendidas, o que leva a crer na imensa distância entre discurso e ação, especialmente quando o calcanhar de aquiles é flechado no espaço da representatividade negra, indígena, quilombola e dos mais diversos povos tradicionais da Terra das Palmeiras, Pindorama (que, colonialmente, foi batizado com o nome da “mercadoria” pau-brasil que representou a morte de milhões de encantados e ancestrais).

Daí que representantes indígenas e quilombolas estão saindo de seus territórios para enfrentar o ambiente norteamericanizado, excludente e eurocentrado que ainda perdura no espaço acadêmico para aprender a fazer “o papel falar”, dada a distância de sua oralidade em relação a burocracia construída pelos grupos dominantes para que se mantenham no andar de cima. Mas não só na academia, ao enfrentar a política branca – diferente das mais diversas políticas praticadas em seus próprios territórios – entram num território pantanoso, onde “falam deles”, às vezes “pra eles” e quase nunca “pela boca deles”.

Este espaço historicamente dominado pelas elites (brancas) é disputado pelas esquerdas que insistem em reproduzir os mecanismos consolidados pela direita. Como esmola, inserem no nível formal, mas não na prática, a possibilidade de consulta dos povos, por meio da Convenção 169 da OIT que indica, na teoria, que eles serão consultados em relação a tudo que afeta “suas vidas, crenças, instituições e bem-estar espiritual, bem como as terras que ocupam ou utilizam de alguma forma, e de controlar, na medida do possível, o seu próprio desenvolvimento econômico, social e cultural”.

Digo em teoria porque quando foi que consultamos os povos quilombolas, indígenas e outros tradicionais para realizarmos as ações em educação, territoriais, laborais, na política?

Coloco na roda outra pergunta: quando suas vozes, mais do que serem ouvidas por pseudo-representantes, farão protagonismo por si mesmas?

As explicações para candidatos homens dizerem-se representantes das mulheres, para candidatos brancos apresentarem-se como a voz dos mais diversos povos são as mais distintas.

“– Eles não constroem a burocracia dos partidos…”

“ – Eles não estão envolvidos nas formalidades partidárias…”

Burocracia dos partidos e formalidades colonizadas e colonizantes, podemos dizer?

Não era à toa que Mario Juruna carregava sempre um gravador porque a palavra das elites do poder não valiam (valem) muito, precisavam ser gravadas para provar as falsas promessas e falsos compromissos.

Nos anos que virão, surgirão cotas raciais para que, enfim, tenham uma mínima representatividade.

Entre um presidente que se diz claramente contra povos tradicionais, indígenas, quilombolas e LGBTQI+ e uma esquerda que os mantém quietos porque, hipoteticamente, sabe o que é melhor para eles, a opção dos povos é a luta pelo próprio espaço, num terreno hostil, bélico e traiçoeiro, que faz do genocídio e do açoite a regra.

Daí que, a olhos vistos, pululam candidatos e candidatas loires (quem sabe alisados e pintados) que encaixam-se perfeitamente na “neurose cultural brasileira” (saudades de Lélia Gonzalez) e fazem dos Yankee um modelo a ser seguido, perpetuando a matriz colonial que banha de sangue e encarcera os vulnerabilizados pelo sistema, oprime as mulheres, a natureza, as pessoas com deficiência, as velhas, os velhos, as crianças, os povos de terreiro, das aldeias, imigrantes e tantos outros.

A esquerda que deveria fazer oposição, inclusive aos métodos usados pela direita, reproduz muitos deles. Neste cenário, continuaremos agudizando a “crise dos cuidados”, típica de uma sociedade mercantilizada, que assim faz questão de se apresentar, independentemente de legenda partidária.

Para as/os não representadas(os) e, principalmente, para os que não têm representação efetiva (não digo como vice, mas como titular) fica aquela sensação de: “sabe quando você está na sala e estão conversando sobre você na sua presença?”. Enquanto isso, esperemos as (importantes e válidas) cotas raciais para, formalmente, dizermos que está tudo bem.


Imagem de destaque: Deputadas Dani Monteiro e Renata Souza do PSOL, na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj). Foto: Fernando Frazão/Agencia Brasil

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