O Brasil como educador: contextos de desenvolvimento para crianças – Marcelo Silva de Souza Ribeiro

O Brasil como educador: contextos de desenvolvimento para crianças

Marcelo Silva de Souza Ribeiro

É consenso que a educação tem uma abrangência e repercussão maior do que a escolarização. De modo semelhante, o sentido de educação infantil é maior do que o de escola para crianças. Ao delinear o amplo raio de ação da educação infantil, quero incluir também as relações da sociedade, da família e do estado para com as crianças no seus processos educativos e contextos de desenvolvimento.

Essas relações, portanto, tem também um alto nível de complexidade, além da abrangência. Valendo-se, pelo menos sumariamente, da teoria ecológica do desenvolvimento humano, criada por Bronfenbrenner, é possível compreender os processos educativos vividos pelas crianças, ao longo de suas vidas, a partir das interações das dimensões micro-sistémica (relações face a face que afetam as crianças), meso-sistémica (conjunto de relações face a face que afetam as crianças), exo-sistémica (ações dos ambientes que afetam indiretamente) e macro-sistêmica (valores, políticas, etc. que impactam a vida das crianças).

Se tomarmos os recentes acontecimentos vividos no Brasil, sobretudo os que dizem respeito a política e as tensões sociais, destacando os escândalos da corrupção, o impeachment da presidenta Dilma, a PEC 241/55, a reforma da previdência, a tensão entre os poderes legislativo e judiciário, além da ascensão da intolerância social e de posições ultraconservadoras,  quais são os possíveis impactos em termos de processos educativos e contextos de desenvolvimento vividos pelas crianças?

Certamente esta é uma questão que exigiria uma longa e contínua atividade de pesquisa. Entretanto, é tangível elencar cadeias de variáveis que possibilitem, ao menos, reflexões iniciais. Dentre elas, destaco:

  • Os valores que as crianças interatuam em seus contextos de desenvolvimento são deveras contaminados pela impunidade, pela corrupção e descrença a dimensão política e pública. Os exemplos assimilados e as possíveis internalizações nos diversos meios que as crianças interatuam estão prenhes de mensagens dessa natureza; 

  • O modo como se deu o impeachment da presidenta Dilma, cercado de incoerências e contradições, abala o símbolo maior da autoridade de um estado democrático, via representação política. Todo um edifício social de relações de autoridade sofre, com isso, impacto, inclusive as vividas pelas crianças, sobretudo nas importantes relações de poder intrínsecas ao desenvolvimento; 

  • A PEC 241/55, que adota uma equação que não vai acompanhar os processos demográficos da população brasileira, coloca em cheque as duas pontas mais vulneráveis: as crianças e os idosos (das populações mais pobres). Isto significa que as crianças terão menos do que tem hoje (escola, saúde, alimentação, etc.). Além da vivência concreta que as crianças estarão sujeitas, há uma mensagem que a sociedade e o estado estarão passando: a mensagem da exclusão! 

  • A tensão dos poderes legislativo e judiciário aprofunda a insegurança institucional e abre as comportas para um rio de desrespeito e instabilidade social. Novamente, os desdobramentos sistêmicos atingem, direta e indiretamente, o contexto de desenvolvimento das crianças. 

  • A ascensão da intolerância social e de posições ultraconservadoras não só passam mensagens diretas às crianças em termos de valores e perspectivas de vida, como também molda toda a trama das relações sociais, contagiando famílias e escolas, como é o caso, por exemplo, dos desdobramentos da chamada “escola sem partido”.

O legado que estamos forjando, em termos de contextos de desenvolvimento para as crianças não é nada alentador. As perspectivas são mais deficitárias porque haverá menos direitos garantidos e intersubjetividades mediadas pela negligência e autoritarismo. Relembrando o próprio Bronfenbrenner e William Corsaro, ainda bem que as crianças não só reproduzem, elas também interpretam a realidade. Que as nossas crianças possam interpretar um Brasil melhor do que o que estamos deixando para elas.

BRONFENBRENNER, U. A Ecologia do Desenvolvimento Humano: Experimentos Naturais e Planejados. Porto Alegre, Artes Médicas, 1996.

CORSARO, W. A. Sociologia da infância. Porto Alegre: Artmed, 2011.

Marcelo Silva de Souza Ribeiro  – Universidade Federal do Vale do São Francisco

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