Marxismo e educação para a cidadania (Parte II)

Antônio Carlos Will Ludwig

Gramsci também concedeu valor à democracia embora tenha acrescentado a ela uma conotação pessoal. Segundo Grisoni e Maggiori, estudiosos deste filósofo, Gramsci não abordou o conceito de democracia entendido como sistema de organização política do Estado. Ele também não se restringiu ao seu significado primordial de poder do povo ou soberania popular, pois adicionou o vocábulo povo dirigente. Acrescentou ainda a expressão centralismo democrático, por oposição ao centralismo burocrático. 

O  sentido atribuído  por  Gramsci à  democracia  aparece  de maneira  clara em seu livro “Os Intelectuais e a Organização da Cultura”, na seção em que ele trata do tema relativo à escola única que é destinada a ensinar o aluno a pensar, estudar e controlar ou dirigir aqueles que dirigem. Ela deve ter por objetivo principal fazer com que cada cidadão possa se tornar governante, pois segundo Gramsci a democracia política tende a fazer coincidir governantes e governados, no sentido de  governo com o consentimento dos governados, assegurando a cada governado aprendizagem gratuita das capacidades e preparação técnica geral ao fim de governar. 

Embora tenha adotado uma abordagem diferente, Poulantzas  também manifestou um apreço pela democracia. Em uma de suas obras na parte em que abordou as relações entre o socialismo e a democracia este apreço aparece de maneira notória. Antes, porém, ele ressaltou que Marx não deixou mais do que algumas vagas indicações, todas no sentido de uma estreita relação entre socialismo e democracia. Logo no início desta parte ele asseverou que Marx não fez nenhuma apologia das instituições pertinentes à democracia representativa e das liberdades políticas por ela garantidas. Segundo ele, Marx defendeu que elas devem ser substituídas pela democracia direta na base, com mandato imperativo e revogável. 

Segundo Poulantzas as liberdades e as instituições da democracia representativa que foram também uma conquista das massas populares precisam ser devidamente articuladas com o desenvolvimento das formas de democracia direta na base e a proliferação de focos autogestores. Uma articulação bem sucedida se apresenta como uma via democrática para o socialismo, para a efetivação de um socialismo democrático e, consequentemente, para a transformação radical do Estado rumo à sua possível eliminação da vida em sociedade.

Este referencial teórico de cunho marxista serve para embasar o processo de preparação de um tipo específico de cidadão ativo. Embora ele possa desenvolver os conhecimentos, habilidades e atitudes que são próprias daquele formado segundo a concepção comunitarista o mesmo tem que apresentar particularidades consoantes. Em relação ao aspecto cognitivo ele precisa se voltar para o exame sobre os partidos progressistas principalmente quanto às suas propostas e modos de proceder, se familiarizar com as formas de atuação política e principalmente se aprofundar nos estudos sobre as concepções de Estado e de organização da sociedade em função da existência de classes sociais antagônicas. Necessita aprimorar as habilidades de falar em público, redigir petições, moções e denúncias e organizar manifestações grupais. As atitudes de coragem, resistência e perseverança são fundamentais.  

Encontram-se disponíveis alguns expedientes favoráveis a este aprendizado. A desobediência civil, derradeiro recurso democrático disponível é um tipo de protesto que pode e deve ser concretizado em decorrência de injustiças e ilegalidades praticadas por governantes. O envolvimento com as atividades partidárias  realizadas  por parlamentares são importantes porque podem resultar na elaboração de projetos de iniciativa popular. A insistente cobrança a políticos  favorece a viabilização dos interesses populares e amaina a crise de representatividade. O engajamento em  movimentos sociais  dos mais diversos tipos é muito significativo porque inclina-se a auxiliar o fortalecimento deles. 

A prática de  ouvir a voz da comunidade requer o deslocamento pelas ruas do município para entrevistar as pessoas a respeito de suas demandas, insatisfações e propostas. Após registrá-las e organizá-las, elas podem ser encaminhadas para os meios de divulgação, ou seja, os jornais e as rádios da cidade, os canais regionais de televisão e as redes sociais.  Ao mesmo tempo são enviadas aos poderes executivo e legislativo com vistas à obtenção do devido retorno.

 

Leia a primeira parte do texto.


Imagem de destaque: HenriqueCrang

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