Buscando melhorar as tecnologias educacionais, muito se tem falado sobre as evoluções necessárias à educação. Não me refiro aqui à tecnologia normalmente conceituada no senso comum, como sinônimo de tecnologia digital, mas aos avanços necessários em dimensões conceituais e estruturais da educação como um todo e da escola, em especial (que também são considerados tecnologia, ou seja, tecnologia enquanto novas formas de realizar algo). Muito se fala, também, sobre a possibilidade de modificar a atuação docente e de adaptar os currículos. Em alta, está a organização do ensino de uma maneira interdisciplinar, transdisciplinar e, infelizmente, muitas das vezes integral (no sentido de colocar como refém todo o processo de ensino-aprendizagem dos processos de avaliação seletivos, como, por exemplo, o ENEM). Digo isso porque o avanço ocorreria se o ensino integral se voltasse para a formação de um sujeito integral, em contraposição à permanência da criança e jovem em tempo integral na escola.
Muito se fala a respeito do formato da escola e do ensino e o que pouco se discute é sobre a essência do ensino. No jargão escutamos “para quê ensinar”, no entanto, as possibilidades referem-se, quase sempre, à concepções acríticas. O que se tem desenvolvido de criticidade voltam-se à sustentabilidade, trânsito, bullyng, dentre outros temas transversais. No entanto, pouco se fala sobre os sistemas que regem a vida dos indivíduos, as relações sociais, as mudanças estruturais necessárias e/ou possíveis em nossa sociedade.
O cuidado que se deve ter é para que não ocorram mudanças somente no formato, e não na essência. Melhorar a tecnologia digital no contexto escolar, inserir organizações de ensino voltado a uma concepção inter ou transdisciplinar não garante um processo de democratização (necessário à crítica da sociedade).
Por exemplo, somente questionando a veracidade que se dá a determinados aspectos dos conteúdos históricos ou a direção que se toma sobre a utilidade dos conteúdos de exatas é que novos conhecimentos serão gerados em uma perspectiva que questione os problemas pelos quais a sociedade passa (e está condicionada).
Experiências feitas para que as disciplinas escolares “conversem” entre elas podem ser bem sucedidos em sua forma. É válido questionar se a interação entre as disciplinas está se dando de maneira a realizar uma crítica às bases que condicionam/geram os problemas sociais atuais.
Não me refiro aqui em implantar ideias eminentemente positivistas, marxistas ou baseadas em conceitos que referem a solução dos problemas somente ao mérito dos indivíduos em melhorar as condições de vida (meritocracia). Refiro-me ao direito que os indivíduos têm em tomar contato com estes saberes e terem a oportunidade de filtrarem os conteúdos a partir de reflexões mais profundas.
Desta maneira, independentemente se a escola irá trabalhar em um contexto com as disciplinas separadas ou fundidas, a capacidade do aluno de encontrar novas formas de organização a partir de reflexões coletivas deve ser valorizada.
Mudar o formato da escola para uma organização interdisciplinar ou transdisciplinar pode significar somente novas formas de ‘disciplinar’ os alunos, caso eles não tenham a liberdade de pensamento para encontrar soluções sociais que questionem as relações de poder e reconheçam não somente seu papel na sociedade, mas questionem seu papel na sociedade.
Questionar o papel na sociedade fará com que o aluno questione o papel da escola na sociedade e, consequentemente, fará com que tanto as escolas, quanto os alunos questionem os conteúdos que são trabalhados no contexto educativo. É certo que um conteúdo não necessariamente necessita ser abolido, mas é importante que se saiba que há vários pontos de vista em relação a ele. Somente este conceito já exigiria da escola uma total reformulação de suas bases, pois se um professor não oportuniza ao aluno observar um conteúdo sob muitos pontos de vista, a aprendizagem não estará acontecendo (mas sim um processo de memorização e transmissão de conteúdos engessados). Pior seria (ou pior é) se pensarmos que o próprio professor não tem condições de observar um determinado conteúdo a partir de pontos de vista diferentes.
Na tentativa de ministrar o maior número de conteúdos, realizar relações com a sociedade ou buscar uma culminância social vinculada àquele conteúdo são ações secundárias. Na tentativa de cumprir determinado currículo não sobra tempo de aplicação real deste currículo no contexto regional em que os alunos se encontram. Os saberes ficam em espécies de ‘nuvens flutuantes’ distantes não só da realidade do aluno, mas, muitas das vezes, de sua compreensão (cognição).
Portanto, o “formato” não salvará a escola (pior, poderá ser somente mais uma forma de disciplinar os alunos). A interdisciplinaridade não salvará os alunos ou os professores, mas poderão ser grandes aliados das mudanças necessárias à educação… o desenvolvimento do olhar crítico e a aplicação prática dos conteúdos.