No momento em que refletimos juntes sobre os 200 anos da independência do Brasil, há muita energia empregada em repensar o país. Nesse processo, não apenas o presente é objeto de disputas, mas também o nosso passado, nossos símbolos nacionais, nossos marcos e nossos mitos fundadores.
Aqui, ainda que o genocídio, a escravidão, o medo e a violência constituam elementos estruturais de nossa história desde as guerras de invasão dos territórios que vieram a constituir o Brasil, durante muito tempo se construiu uma representação muito “positiva”, de que os brasileiros são cordiais e avessos à violência. Felizmente, há, hoje, uma crítica fundamentada de todas as áreas do conhecimento a essa visão idílica do Brasil, a qual, como temos visto na atualidade, encobre a violência que se alastra pelo país.
No entanto, ainda permanece, entre nós, a ideia de que a educação e, sobretudo, a escola, trará a salvação para o Brasil. Mais emprego, mais renda, mais democracia, mais comida, mais moradia… mas tudo é visto como dependente da escola, ou melhor, de uma “escola de qualidade para todos”.
Essa ideia, como já se disse aqui, é uma forma de jogarmos sempre para um futuro incerto a necessidade de estabelecimento de políticas, hoje. Sobretudo para que a vida da população mais pobre seja digna. Sabemos que nossas vergonhosas desigualdades não serão superadas apenas e tão somente pelo concurso da escola, por melhor e mais abrangente que ela seja.
Além disso, é sempre preciso considerar que, mesmo a escola, ao longo de nossa história, foi uma promessa continuamente postergada pelos poderosos. Não fosse a luta das camadas populares e dos movimentos sociais organizados, não teríamos nem mesmo o ensino fundamental para todes neste país.
E essa falta de responsabilidade das nossas elites com a educação escolar é patente ainda nos dias de hoje. Para pegar apenas um de tantos exemplos, dados recentemente publicados sobre os gastos do Poder Executivo mineiro mostram as prioridades do Governo, não por acaso aliado de primeira hora do atual Presidente da República. Dos grandes dispêndios do executivo estadual mineiro com pessoal, mais de 57% são com a força policial, boa parte dela mobilizada pra matar e prender negros e pobres. Enquanto isso, o gasto com o pessoal da Educação não chega a 36%. Gasta-se mais com 80 mil policiais do que com 244 mil professoras! E, na média salarial de cada setor, um policial ganha quase 4 vezes mais do que ganha uma professora!
Estes são dados eloquentes sobre os processos e as opções que nos trouxeram até aqui. Que passado autoriza este presente? Que futuro estamos gestando?
Não se pode dizer que é uma vergonha, pois não se trata disso. Trata-se de uma opção, continuamente atualizada e da qual os governos Zema e Bolsonaro são expressões acabadas, de políticas de violência e de morte como forma de governo.
Enquanto com um canto da boca dizem priorizar os interesses públicos e investir suficientemente em educação e em outras políticas, tais governos e seus aliados na sociedade civil e no parlamento vão se armando para aumentar o terror, acabar com as instituições democráticas e infundir o medo. Hoje, mais do que nunca, independência e liberdade não se coadunam com medo, desigualdades, racismo, homofobia, machismo e outras formas de violência. Por isso, como ontem lutaram e disseram muitas pessoas que morreram por um país melhor, é preciso fazer cessar essas políticas de morte e fazer valer a vida.
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