Passada a euforia da vitória, mas ainda vivendo as alegrias da reconquista do país, a frente ampla que ganhou as eleições enfrenta, agora, o desafio de estabelecer as prioridades para a reconstrução do país. A tarefa não é nada fácil, tendo em vista os 6 anos de ininterrupta destruição e os interesses dos diferentes grupos que se uniram para derrotar a ameaça fascista.
O conflito de interesses no interior da frente pode ser percebido, por exemplo, na reação de parte do capital nacional e internacional ao simples discurso do Presidente eleito de que é preciso combater a fome, como se este fosse um ato revolucionário ou crime de lesa pátria. O capitalismo e muitos dos capitalistas que apoiaram a eleição de Lula convivem tranquilamente com a morte e o aniquilamento, mas têm enorme dificuldade de aceitar a inclusão dos mais pobres ao mundo dos que se alimentam três vezes ao dia!
No campo da educação, o lastro destrutivo é tão grande e tão profundo que quase tudo é prioritário. No entanto, como sabemos, quem tem muitas prioridades não tem nenhuma! Por isso, o GT de Transição na área de educação, agora recomposto de forma a espelhar melhor as forças que atuam na defesa e na construção da escola pública para todes, terá a tarefa hercúlea de estabelecer as prioridades para os distintos tempos no interior dos 4 anos de governo. Há que se planejar e, logo, há que se priorizar e estabelecer estratégias de curtíssimo, curto e médio prazos.
Tais prioridades, no entanto, não são naturais e as suas definições se darão no jogo de forças no interior das alianças estabelecidas e na relação do governo com os movimentos sociais que lhe dão e/ou darão sustentação. Não faltam organizações empresariais, articulistas de jornais, jornalistas, economistas, instituições de pesquisa e afins, além de sindicatos e movimentos estudantis, para explicitar as pautas que lhes parecem prioritárias na reconstrução nacional da educação, e o fazem com maior ou menor legitimidade.
O próprio Presidente eleito, em vários momentos da campanha, já adiantou que pretende dar à alimentação escolar e ao investimento nas universidades o destaque que estas ações merecem. No entanto, sabemos que, no conjunto dos desafios, estes são apenas a ponta do iceberg dos enormes problemas a serem enfrentados.
Deixado de lado o desafio da busca de recursos para o atendimento ao conjunto das promessas de campanha e sem os quais nada será possível fazer, os maiores desafios do novo governo não serão aqueles relativos às políticas sobre as quais o executivo tem autonomia para agir. Estes, estabelecidas as prioridades, poderão ser enfrentados imediatamente. No entanto, muitas dessas ações demandarão a reconstrução das estruturas de Estado que as executarão. Este é um desafio notável naquelas áreas que foram destruídas pelo atual governo, tais como promoção e fortalecimento das diversidades e da educação do campo, indígena, quilombola, infantil e das pessoas jovens, adultas e idosas, para dizer de algumas.
Há também aquelas prioridades que precisarão ser negociadas com estruturas do executivo que permaneceram funcionando, mas que foram tomadas de assalto pelos adversários da escola pública, como é o caso do Conselho Nacional de Educação. Aí, sem dúvida, muitas pautas precisarão ser negociadas, dentre elas as novas Diretrizes para a formação de professoras e professores, em quase tudo contrária ao que defendem as instituições que atuam na área.
Mas, não poucas ações dependerão, também, de negociações no interior mesmo das forças que integram a frente ampla que sustentará o governo e com o próprio Congresso Nacional. Um exemplo claro disso é a lei que institui o Novo Ensino Médio, patrocinada por muitas das instituições que hoje fazem parte da frente e que, do ponto de vista dos movimentos e coletivos que defendem historicamente a escola pública, deve ser imediatamente revogada. Reformar ou revogar a Lei dependerá não apenas de uma negociação interna do executivo e de diversas forças que lhe darão sustento, mas também do Legislativo, já que se trata de uma lei aprovada pelo parlamento e, portanto, não poderá ser alterada por decreto.
Os rumos tomados pelas políticas educacionais do novo governo, as quais têm enorme impacto no conjunto da federação, já estão sendo debatidos e definidos. É preciso acompanhar com atenção e cuidado os debates no interior do GT, instituído para coordenar a transição no campo da educação, mas não apenas aí. Esta é uma pauta de interesse de uma enorme gama de forças, inclusive daquelas que querem aprofundar a privatização da educação no país. É preciso, mais do que nunca, que estejamos atentos e fortes para disputarmos os sentidos da educação no espaço público e no novo governo. Este é o grande desafio do momento!
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