Aprendizagem: autorregulação proporcionada em ambientes distintos (família, escola, karatê) – Tiago Tristão Artero

Aprendizagem: autorregulação proporcionada em ambientes distintos (família, escola, karatê)

Tiago Tristão Artero

Quando se fala em autorregulação do cérebro, manifestada nas funções corporais e nas funções cognitivas, pouco se sabe, pouco se opina, pouco se discute.

Acontece que, quando falamos em neurociência, muitos mitos vêm à tona.

Desde a década de 90, considerada a “Década do Cérebro” (devido à uma investimentos na  neurociência), possibilidades diversas de compreensão e intervenção tornaram-se possíveis, não somente na medicina, mas em âmbitos diversos.

Eis alguns mitos:

“Usamos uma porcentagem pequena do nosso cérebro”.

A verdade é que usamos o cérebro todo em todos os momentos, inclusive durante o sono.

“Estimular o cérebro e a aprendizagem é sempre bom”.

Ledo engano. Os estímulos devem seguir as orientações baseadas nas fases de desenvolvimento humano. Cada fase exige estímulos distintos (sociais, cognitivos, psicomotores).

A partir de agora, citarei alguns exemplos que selecionei para falar de autorregulação que, segundo Bandura (1991) abrange o automonitoramento, julgamentos autoavaliativos e autorreações.

Logo, não somente reagimos ao ambiente, podemos refletir sobre ele, antecipando cenários e escolhendo as ações, julgando, utilizando a autorreação.

Esse conhecimento não descarta o que nos trouxe Piaget, quando cita a formação dos esquemas a partir da assimilação, acomodação e equilibração majorante, nem mesmo se contrapõe a Vigotski, que cita os processos psicológicos superiores como a memória e a atenção voluntária.

Imaginemos a criança em casa, em uma rotina delineada junto aos pais (que possuem um cérebro adulto capaz de um julgamento mais eficaz e capaz de antecipar a consequência, habilidade que, segundo Suzana Herculano, será adquirida de maneira mais plena no final da adolescência), eficazmente se contribui emocionalmente saudável.

Na escola, mesmo com um método pedagógico excelente e um(a) professor(a) dedicado, o processo de memorização ficará prejudicado por ruídos excessivos, dificuldade em autorregular-se e sustentar a atenção em uma atividade. Não houve domínio de sala pelo professor, acarretando um ambiente não propício para a aprendizagem (mesmo que haja preconceito em utilizar o termo “domínio de sala”, este é fundamental para, segundo a neurociência, haver o aprofundamento de raciocínios e o desenvolvimento das associações da memória, tão bem estudadas por Iván Izquierdo).

Note-se que, em atividades nas quais há a possibilidade de concentração, de refletir sobre os próprios atos e estratégias de aprendizagem (metacognição), de utilizar todo o potencial a partir da sustentação da atenção, há a possibilidade da real aprendizagem (aquela que resiste ao tempo, modificando o cérebro).

Encontramos essa possibilidade em uma aula em que o professor da escola leva sua turma ao total empenho. Encontramos em uma eficiente rotina familiar. Encontramos na artes marciais, cito o karatê.

Funakoshi, a partir do karatê Shotokan, traz alguns eficientes ensinamentos que denotam essas capacidades, em um conhecimento milenar japonês que extrapola os limites do tempo, quando diz:

“Evitar o descontrole do equilíbrio mental”, ou seja, autorregular o comportamento, contendo os impulsos, típico do controle executivo da região do córtex frontal que, em crianças com TDAH, deverá ser uma habilidade a ser desenvolvida.

“A falha surge com a acomodação mental e física”, ou seja, quem nega a contínua e necessária evolução social e cognitiva do ser humano, erra mais, não aprimora os comportamentos e fica limitada em suas conexões neuronais.

“Dará frutos quando associado à vida cotidiana”, por isso, todo conhecimento deverá ser associado a uma função social (como também nos traz Gasparin, baseado na pedagogia crítico-social de Saviani) para que tenha relevância e faça parte do arcabouço de conhecimentos úteis.

“Mude sua posição conforme o tipo do adversário”, Funakoshi, dessa forma, nos ensina a nos adaptarmos às diferentes situações. A plasticidade cerebral nos dá essa possibilidade, permitindo que a autorreação seja um comportamento aprendido, contendo os impulsos e gerando comportamentos voluntários.

“No princípio, seus movimentos são artificiais, mas com a evolução, tornam-se naturais”, assim, este princípio tão bem treinado no karatê que, em uma perspectiva psicomotora, permite visualizarmos movimentos cada vez mais refinados, amplia nossa visão ao entendermos que a leitura pode tornar-se natural, o raciocínio lógico também e tantas outras capacidades que, se treinadas, podem ser desenvolvidas.

“Estudar, criar e aperfeiçoar-se constantemente”. Este princípio, fecha com chave de ouro a permanente evolução do ser humano que, considerando seus aspectos ontogenéticos e filogenéticos, ao esforçar-se, motivando-se com sua própria melhora, poderá criar e gerar constantes adaptações positivas.

Então, como diziam nossos avós, se esforce, preste atenção, dedique-se, embora tenha saído de moda, era ciência pura!!!

 

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