Uma das lembranças mais felizes que guardo dos tempos de escola foi um dia da visita ao museu. Aquela era a primeira vez que ia a um museu, e eu já tinha 17 anos. Nesse dia inesquecível, eu vi que o mundo era muito maior do que os arredores da ilha onde eu vivia.
O ano era 1998. Eu era uma adolescente que estudava numa escola pública. Naquele tempo, eu acreditava que arte não era para mim. Eu também acreditava que eu era boa com números e letras, mas que pintar não era o meu forte. As aulas de Educação Artística também não ajudavam muito. Eu nunca tinha visto uma obra de arte de pintores como Monet, Dalí ou Picasso. Meu contato com as obras de arte era apenas por meio dos livros didáticos. Eram desenhos que ilustravam os livros, apenas. Não eram nem fotografias. Eram apenas ilustrações. Algumas borradas. Sem muita vida, expressão, nitidez…
O ônibus repleto de jovens estacionou em alguma rua próxima ao Museu de Belas Artes. A primeira vez que eu entrei num museu foi para ver a exposição Dalí Monumental, e foi uma experiência sensorial única. Eu finalmente via beleza na arte. Surreal! Surrealista! Impressionantemente extraordinário! Eu desejei que aquele dia nunca terminasse. Quando cheguei em casa, desenhei um dos quadros que não saiam da minha cabeça. Foi uma experiência libertadora. Eu aprendi com Dalí que a arte é para ser sentida. Não cabe em fórmulas ou formas pré-concebidas. Foi a primeira vez na vida em que eu não tive vergonha de expor um desenho. Eu sentia muito orgulho do que eu fui capaz de fazer. Mesmo de olhos fechados, as imagens estavam ali, na minha cabeça. Aquela experiência me marcou. Me tornei uma adulta que viaja a procura de museus. E eu passei a procurar por Dalí nos museus das cidades que eu visitei: Barcelona, Madri, Paris, Nova York…Dalí era um artista do mundo. E o mundo se abriu para mim.
Em função da falta de condições financeiras para realizar passeios e excursões numa escola pública da década de 1990, aquela foi a única vez que cruzamos a ponte Rio-Niterói. As professoras planejaram aquela atividade com muita antecedência, com muita dedicação e esforço. Aquele foi um dia que mudou a minha vida. Naquele dia eu aprendi que eu precisava de arte, pois a arte também liberta. Eu deixei de ser aquela menina que via o mundo desde uma janela. Eu aprendi que eu era capaz de voar.
Imagem de destaque: “Figura na janela”. Pintura de Salvador Dalí, 1925. Museu Nacional Centro de Arte Reina Sofía, Madri, Espanha