Mulheres na EJA: desigualdade de gênero e atravessamentos interseccionais em tempos de pandemia

Rebeca Cristina Nunes Lloyd Gonçalves
Flavia Renata Guimarães Moreira

A violência contra as mulheres é reconhecida como um fenômeno mundial, o qual foi potencializado no contexto da pandemia da COVID-19, intensificando a desigualdade de gênero. Dados iniciais demonstram que a pandemia trouxe consequências sociais e econômicas devastadoras para mulheres, podendo, inclusive, reverter o progresso obtido nas ações de políticas públicas de equidade cujo objetivo seja alcançar a igualdade de gênero e alicerçar os direitos das mulheres (UN WOMEN, 2020).

Refletir sobre as violências de gênero na Educação de Jovens e Adultos (EJA) numa perspectiva interseccional permite que alcancemos as várias singularidades deste fenômeno, estabelecendo sobre as violências uma relação rizomática composta de fluxos e movimentos estruturados socialmente.

O conceito de interseccionalidade pode ser compreendido como um fio condutor para a análise da opressão feminina que atravessa as violências contra as mulheres: deve-se compreender como os eixos de opressão se entrecruzam e se potencializam, uma vez que permitem a identificação dos problemas sociais, capturando suas consequências estruturais e dinâmicas das complexas intersecções entre os vários eixos de subordinação, que estruturam os terrenos sociais, econômicos e políticos por onde as dinâmicas do desempoderamento acontecem (CRENSHAW, 2002).

Dado o contexto contemporâneo, o Brasil, com um governo de extrema-direita e ultraconservador, cuja política atinge implacavelmente as parcelas mais vulnerabilizadas da população, as mulheres da EJA são as que experimentam, na radicalidade, o regime estruturado pela opressão e são também aquelas que têm menores chances de se protegerem. Conseguinte, há uma década, Alves (2011) já chamava a atenção para as consequências da agenda neoliberal ortodoxa que possui intencionalidades para a gestão das políticas públicas da/para a EJA, tendo em vista os impactos atuais diante da retração estrutural/conjuntural dos direitos, simétricos à extirpação das garantias historicamente conquistadas/consolidadas e dos movimentos reativos que, consecutivamente, conflagram o sociometabolismo da barbárie (ALVES, 2011), onde um dos fatores deflagrados é a redução da expansão da escolarização.

Dessa forma, tratar das relações de gênero no espaço escolar, principalmente na EJA, significa problematizar relações assimétricas de poder e defender um projeto de sociedade plural, inclusivo e democrático, onde as relações de gênero possam ser debatidas no cotidiano de professores(as), estudantes e famílias, a fim de promover processos em que haja a escuta dos ruídos da pandemia, na busca da audição dos “silêncios” que desvelam violências naturalizadas, historicamente constituídas.

Sobre as autoras
Rebeca Cristina Nunes Lloyd Gonçalves é prof.ª na Rede Municipal de Educação de BH, doutoranda em Educação pela FaE/UFOP.

Flavia Renata Guimarães Moreira é prof.ª na Rede Municipal de Educação de BH. mestra em Educação pela FaE/UFMG.

Para saber mais
ALVES, Giovanni. Trabalho e subjetividade: o espírito do Toyotismo na era do capitalismo manipulatório. São Paulo: Boitempo, 2011.

CRENSHAW, K. Documento para o encontro de especialistas em aspectos da discriminação racial relativos ao gênero. Revista Estudos Feministas, Florianópolis, v. 10, n. 1, p. 171-188, 2002.

UN – UNITED NATIONS WOMEN. Policy brief: the impact of covid-19 on women. New York: UN Women, 9 abr. 2020. Disponível em: <https://bit.ly/31Y7HgJ>. Acesso em: 14 jul. 2020.


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