Amanda Brandane Minari
Mizael Galbrian de Souza Costa
Felipe Gonçalves Campelo
Vinicius Alexandre
Érika Arantes de Oliveira-Cardoso
Manoel Antônio dos Santos
(Grupo Videverso)
A escola tem por missão proteger e acolher toda a complexidade inerente aos seres humanos. A inclusão das questões da diversidade sexual e de gênero no ambiente escolar é uma questão urgente. Segundo Zioti e Santos (2018), o desafio é construir um ambiente inclusivo que acolha as diferenças e, assim, seguir na contramão dos preconceitos que alimentam as estatísticas alarmantes, como as que evidenciam a transfobia que viola direitos das pessoas trans. A fragilidade das políticas públicas faz com que as abordagens sobre gênero e sexualidade sejam marcadas como temas perigosos, sendo vistas com suspeita, pavor e receio (COSTA; SOUZA, 2013).
Com o intuito de pensar gênero e sexualidade no ambiente escolar, a Escola Pública Municipal João Nogueira (E. M. E. B. João Nogueira), do município de Cravinhos-SP, procurou o Grupo de Ação e Pesquisa em Diversidade Sexual e de Gênero – VIDEVERSO para promover um debate sobre as questões de gênero e transexualidade, a partir de palestras e discussões direcionadas ao corpo docente. O VIDEVERSO está inserido no Laboratório de Ensino e Pesquisa em Psicologia da Saúde (LEPPS-CNPq) da FFCLRP-USP.
Para incentivar a circulação do conhecimento científico qualificado e promover um olhar despatologizante sobre os temas da diversidade na escola, o VIDEVERSO constituiu um Grupo de Trabalho (GT) com seus/suas integrantes. Em junho de 2021, o GT promoveu um encontro presencial com as(os) professoras(es) de educação básica para conhecer suas demandas e debater conceitos fundamentais sobre o tema. O debate foi extremamente profícuo do ponto de vista da promoção da diversidade e da inclusão, e permitiu diferenciar, por exemplo, identidade e expressão de gênero, sexualidade e sexo biológico.
A discussão sobre a estigmatização que historicamente recai sobre os corpos trans foi incorporada à pauta do encontro, de forma a se reafirmar a responsabilidade da escola no combate à discriminação por identidade de gênero e orientação sexual. Essa perspectiva se mostra crucial para que se possa assegurar o cumprimento da missão institucional de sustentar o acesso à educação, assim como a manutenção de estudantes trans na escola (ZIOTI; SANTOS, 2018).
Durante o encontro realizado com as(as) professoras(es) o VIDEVERSO tomou conhecimento de que a iniciativa do convite partiu de questões suscitadas pelas inquietações de alunas(os), que as(os) levaram a produzir cartazes sobre o movimento LGBTQIA+. A comunidade escolar está cada vez mais sensibilizada por essas questões ao identificar a presença de estudantes trans no ambiente escolar, mobilizando a busca de parceria com o grupo VIDEVERSO. Questões tais como: Onde fica a escola no debate sobre a diversidade? Qual o papel dos educadores na formação de jovens abertos a conviver com a diferença? Até onde a escola pode ir quando há resistência da família no respeito à identidade das crianças e adolescentes trans? Como lidar com o preconceito das famílias? De que forma abordar o tema com pais e responsáveis?
A ciência aponta os impactos gerados pela violência a crianças e adolescentes trans que, na ausência do acolhimento e manutenção do respeito ao convívio escolar, deixam de comparecer às aulas, prejudicando seu desempenho e oportunidade de aprendizagem e socialização. Além disso, indicadores sobre a evasão escolar de alunos trans escancaram os impactos da transfobia na escolarização: 56% da população trans não completa o Ensino Fundamental e apenas 0,02% está na universidade (BENEVIDES, 2022).
No decorrer da discussão, identificou-se o temor de “influenciar” os(as) alunos(as) menores com a exposição dos cartazes produzidos pelo Ensino Fundamental II sobre a pauta LGBTQIA+. Tal receio, ainda que não encontre amparo na literatura científica produzida sobre o tema (CECÍLIO; SCORSOLINI-COMIN; SANTOS, 2013), configura entrave na tomada de decisão. As(os) professoras(es) solicitaram que o VIDEVERSO analisasse as produções dos alunos e avaliassem se haveria algum inconveniente em expô-las no pátio da escola. Mesmo após o debate, notou-se relutância por parte de alguns/algumas que, durante a discussão, expuseram o temor do julgamento negativo por parte das famílias. Por outro lado, percebeu-se uma postura de abertura do corpo docente para buscar conhecimentos que auxiliem a refletir sobre o tema, assumindo assim sua responsabilidade de atuar para a promoção de um ambiente saudável e inclusivo para se incentivar o combate aos preconceitos e à discriminação das pessoas trans.
A experiência corrobora a urgência de inserir as discussões de gênero/sexualidade na formação e atuação dos professores da rede de ensino. Promover iniciativas e intervenções junto à escola colabora para a diminuição da violência que afeta a população trans de diferentes formas, evidenciando a necessidade de se discutir continuamente os processos de formulação de políticas públicas de educação visando viabilizar propostas de um ambiente acolhedor às diversidades.
Sobre os(as) autores(as)
Amanda Brandane Minari é graduanda em Psicologia pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP-USP). Membro do Grupo de Ação e Pesquisa em Diversidade Sexual e de Gênero – VIDEVERSO, inserido no Laboratório de Ensino e Pesquisa em Psicologia da Saúde (LEPPS-CNPq) da FFCLRP-USP. Áreas de interesse: estudos de gênero e sexualidade, lesbianidades e maternidade lésbica.
Mizael Galbrian de Souza Costa é graduando em Psicologia pelo Centro Universitário Unifafibe, regularmente matriculado no 10º período. Diretor Social em Políticas Públicas na Secretaria Municipal de Promoção e Desenvolvimento Social de Monte Azul Paulista, integrante do Grupo de Ação e Pesquisa em Diversidade Sexual e de Gênero – VIDEVERSO, inserido no Laboratório de Ensino e Pesquisa em Psicologia da Saúde (LEPPS-CNPq) da FFCLRP-USP.
Felipe Gonçalves Campelo é mestrando pelo Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP-USP). Co-coordenador do Grupo de Ação e Pesquisa em Diversidade Sexual e de Gênero – VIDEVERSO, inserido no Laboratório de Ensino e Pesquisa em Psicologia da Saúde (LEPPS-CNPq) da FFCLRP-USP.
Vinícius Alexandre é mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto – FFCLRP-USP. Psicólogo pelo Centro Universitário Barão de Mauá. Coordenador do Grupo de Ação e Pesquisa em Diversidade Sexual e de Gênero – VIDEVERSO, inserido no Laboratório de Ensino e Pesquisa em Psicologia da Saúde (LEPPS-CNPq) da FFCLRP-USP.
Érika Arantes de Oliveira Cardoso é professora Permanente do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto – FFCLRP-USP. Psicóloga do Departamento de Psicologia da FFCLRP-USP. Co-coordenadora do Laboratório de Ensino e Pesquisa em Psicologia da Saúde (LEPPS-CNPq). Coordenadora do LUTE – Grupo de Estudos Lutos e Terminalidades.
Manoel Antônio dos Santos é professor Titular do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto – FFCLRP-USP. Bolsista de Produtividade Científica do CNPq, PQ-1A. Coordenador do Laboratório de Ensino e Pesquisa em Psicologia da Saúde (LEPPS-CNPq) da FFCLRP-USP.
Para saber mais
BENEVIDES, Bruna G. (2022). Dossiê assassinatos e violências contra travestis e transexuais brasileiras em 2021. Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA). Acesse aqui.
CECÍLIO, Mariana Silva; SCORSOLINI-COMIN, Fabio; SANTOS, Manoel Antônio dos. Produção científica sobre adoção por casais homossexuais no contexto brasileiro. Estudos de Psicologia (Natal), v. 18, p. 507-516, 2013. Acesse aqui.
COSTA, Vera Lúcia do Vale; SOUZA, Norma Soares de. (2013). Violência escolar e homofobia: reflexões a respeito da diversidade. Acesse aqui.
ZIOTI, Mariana Coimbra; SANTOS, Manoel Antônio dos. O contexto escolar do aluno transexual. In: ALFERES, Marcia Aparecida (org.). Qualidade e políticas públicas na educação 2. Ponta Grossa: Atena, 2018, p. 73-80. Acesse aqui.
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