Informativo semanal do projeto “Pensar a Educação, Pensar o Brasil – 1822/2022”
Ano III – Edição 076 / quinta-feira, 02 de abril de 2015
Autobiografia de todo mundo, uma inspiradora leitura de contexto
Nem sempre nos damos conta de que situar uma obra em seu contexto de produção é, além de um exercício acadêmico necessário que pode evitar inúmeras gafes, uma forma de compreender texto e autor, o diálogo que ali se estabelece, quem são os interlocutores, o porque de algumas escolhas. Ainda que muitas vezes não seja possível destrinchar o emaranhado de situações e detalhes que envolvem a construção textual e teórica, o exercício continua válido. Nesta tarefa temos alguns aliados e aqui destaco um livro singular, escrito por Gertrude Stein (1874-1946) cujo título já é uma provocação “Autobiografia de todo mundo”. Publicado originalmente em 1937 pela Random House recebeu inúmeras reimpressões e traduções. Entre as versões publicadas no Brasil a mais recente vem a lume pela Cosac Naify em 2010, com tradução, posfácio e sugestões de leitura de Júlio Castañon Guimarães.
O lugar de mecenas que Gertrude Stein e a família (os irmãos Leo e Michel e a cunhada Sarah) passam a ocupar e seu próprio ofício irão colocá-la entre muitos dos grandes nomes das artes e da literatura das primeiras décadas do século XX. Segundo Júlio Castañon Guimarães “O catálogo da exposição que o Museu de Arte Moderna de Nova York dedicou em 1970 à coleção dos Stein mostra que eles chegaram a possuir 110 obras de Picasso e 77 de Matisse” (In.: Stein, 2010: p. 334). A organização deste acervo se dá em grande parte no período que Gertrude Stein fixa residência na Europa (passando a maior parte do tempo em Paris) e organiza sua vida numa rede entretecida por pintores e escritores, entre eles Picasso (que se torna um de seus maiores amigos), Hemingway e Scott Fitzgerald.
Desta convivência Gertrude Stein retira o substrato que irá compor as páginas de “Autobiografia de todo mundo”, para alguns uma continuidade de “A Autobiografia de Alice B. Toklas” (publicada em 1933), este último indicado como o livro que teria inspirado Woody Allen na realização de “Meia Noite em Paris”.
É inserida neste mundo que Gertrude Stein vai escrever sobre a vida dos outros, em muitos momentos a partir de sua própria vida, e vai oferecendo ao leitor elementos que auxiliam na composição de um cenário explicativo que nos ajuda a entender, ainda que em parte, influências, características, vícios que serão registrados em páginas e telas. Como ela mesmo afirma “Gosto de ler com meus olhos e não com meus ouvidos. Gosto de ler por dentro e não do lado de fora” (Stein, 2010: p. 170). Ainda que o contexto do argumento seja outro, o que se reafirma aqui é a capacidade de retratar o fora por dentro e neste exercício o livro é inspirador (e porque não, educativo) como referência que reconstrói um cenário e nele situa suas obras-objetos.
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