Aprender a expor o que pensa
Ana Luísa Miranda
São uma e meia da tarde, a professora entra na sala de aula e fala: “Façam um círculo!”. Quantas vezes você se lembra de fazer isso quando era criança? Na minha memória, me recordo de dezenas de vezes ter de arrastar minha carteira para fazer esse tal círculo, olhar para os meus amigos e ficar feliz de enxergar todos da minha turma.
Quando somos crianças, muitas vezes somos levados a viver experiências como essa, que no início, ou para pessoas que nunca terão contato com bases pedagógicas de ensino, podem não fazer muito sentido. No entanto, quando um professor propõe que seus alunos se organizem assim para discutir qualquer assunto que seja, de forma alguma é apenas “fazer por fazer”. Nesse ambiente o aluno entenderá que sua voz vai ser ouvida, que sua opinião é válida, além de entender para que a conversa/discussão flua é preciso ter respeito, já que podemos ver os rostos de todos na roda, sabemos quando alguém está falando e não devemos interromper sem que a pessoa termine seu raciocínio.
Vemos algo similar quando nos sentamos na mesa de nossas casas para comer, os pais falam, os mais velhos comentam, e as crianças? Normalmente elas apenas escutam e não tem tanto direito assim de expor suas opiniões. Quando se sentam para comer na escola, todas têm direito a fala, todas podem comentar o que bem entender e não passam tanto tempo só ouvindo. Por isso, mesmo que seja uma tarefa complicada fazer com que os alunos se sentem em círculo, se interessem pela discussão, exponham suas ideias, respeitem a fala do colega, é de grande importância para o desenvolvimento daquele aluno não só academicamente, mas para toda a sua vida. Quando um tema é trazido para uma roda de conversa em sala de aula, normalmente os alunos ainda não formularam muitas ideias a respeito daquele tema, mas o interessante é quando, mesmo não dominando muito o assunto, eles buscam ouvir o que o outro tem a dizer e, ao decorrer da discussão, se interessem pelo tema e procuram mais informações. Assim, quando estiverem inseridos em conversas sobre o mesmo tema, terão algo a mais para dizer.
Debatendo em roda, os alunos também vislumbram outro cenário importante do mundo: os conflitos. Entendem que nem sempre vamos concordar, que o mundo não é perfeito, que cada um pensa de uma forma diferente, e que mesmo assim todos têm direito a falar o que pensam e devem ser sempre respeitados. Vivemos atualmente em um mundo em que as redes sociais nos deram grande poder de fala. Podemos expor o que pensamos a respeito de tudo, mas será que fomos ensinados desde novos a saber como expor essas ideias? Será que precisamos que nossas crianças façam mais círculos em sala de aula? Aprender a ouvir, a entender as diferenças e respeitá-las acima de tudo são algumas bases para se expor o que pensa. Talvez seja uma boa hora para que atividades como a roda de conversa sejam cada vez mais intensificadas, para que, quando adultos, os alunos saibam como melhor expor o que pensam.
Desde criança aprendemos de forma simples dicas valiosas para levar para a vida, somos condicionados a fazer atividades que podem nos ajudar a estabelecer limites importantes para situações do cotidiano. Nem sempre fica claro o objetivo do que estamos fazendo, e aí que mora o mágico da educação básica, aprender sem perceber. Quando você vê, está simplesmente usando aquele conhecimento sem se lembrar de que um belo dia, às uma e meia da tarde, a sua professora entrou pela sala e propôs que todos fizessem um círculo.
Como dito antes, moram grandes desafios em sair do padrão clássico de aula. Muitas vezes não sai como o esperado e muitos alunos ficam dispersos no princípio, mas é a força de vontade dos professores da educação básica em preparar seus alunos para o mundo que movem atividades assim. Cada vez que uma criança expressa o que pensa sem medo, sem receio de não ser compreendida, sem precisar gritar para receber atenção, cada vez que ela se sente capaz de falar o que deseja, em cada uma dessas vezes um objetivo da educação básica foi concluído. Sabemos expor corretamente nossas ideias nos meios atuais de comunicação? Acredito que ainda não. Precisamos que nossas crianças façam mais círculos em sala de aula? Com toda certeza, sim! A base deve ser ensinada para nossos pequenos, para que um dia, já grandes, possam usar desse conhecimento para tornar o mundo um lugar mais respeitoso, onde todos possam ser ouvidos de forma igualitária.