A ideia de transição na política brasileira ganhou uma centralidade e caiu no domínio público quando, a partir de um discurso do Presidente General Ernesto Geisel, em 1974, estabeleceu-se a ideia de uma abertura e, portanto, de uma transição “lenta, gradual e segura” da ditadura para a democracia. Estavam, assim, anunciadas as bases daquilo que, uma década depois, se realizaria no país: a condução do processo de “redemocratização” sendo conduzido pelos algozes da própria democracia! Disso resultou, como sabemos, também uma anistia “ampla, geral e irrestrita” que não puniu aqueles que atentaram contra a democracia, torturaram e mataram, criando espaços para a manutenção de uma cultura política violenta e antidemocrática, cuja feição mais acabada é a do atual Presidente da República e seus apoiadores a pedir intervenção militar.
Mas a palavra “transição” sempre reaparece nos momentos de substituição dos agentes políticos do poder executivo, sobretudo o federal, inclusive porque, neste último caso, a transição é regrada por lei específica. É este o caso neste momento. Na imprensa e nas rodas sociais fala-se muito das Equipes de Transição para as várias áreas da administração pública federal. No caso da Educação, a Equipe de Transição já tem os nomes que a compõem divulgados e os trabalhos já começaram.
Chama a atenção que, na composição da Equipe de Transição da Educação, o presidente eleito e sua equipe de assessores tenham dado ênfase à presença de pessoas ligadas à fundações e instituições privadas de ensino, que ocupam quase a metade das posições na Comissão, do que aos movimentos e coletivos que sustentaram historicamente e, sobretudo, nos último 6 anos, a luta contra o desmantelamento da escola pública no país. Estes, de um modo geral, têm ocupado o segundo plano na elaboração do diagnóstico sobre a educação brasileira, bem como no apontamento de possíveis soluções para os problemas.
Mais uma vez, as forças que pouco atuaram na construção da escola pública e em sua defesa diante das políticas do caos implementadas nos últimos anos e que, em muitos sentidos, apoiaram o golpe de 2016 e a eleição de Bolsonaro em 2018, sejam agora as primeiras convidadas para compor a Comissão, pelo menos em sua quase maioria.
Ao encher a Equipe de Transição da Educação de forças representativas da iniciativa privada na área e ao concentrar as indicações em São Paulo, o presidente eleito e sua equipe de assessores podem prestar um desserviço à nação correndo o risco de desconsiderem a história da luta democrática e popular pela educação no país, sobretudo por não levarem em conta as regiões que deram a vitória ao campo democrático na última eleição presidencial.
Era de se esperar que, num governo de coalizão, como este que se anuncia, as diversas forças que compõem a frente que ganhou a eleição tivessem assento à mesa onde se discute a reconstrução do país, e isso em todas as áreas. Mas seria incoerente que fossem deixadas de fora exatamente aquelas do campo democrático e popular.
O 3º Governo Lula já começou e, no campo da educação, começou dando prioridade na interlocução com os mesmos grupos que, há alguns anos, fizeram a interlocução com o governo da presidenta Dilma e mantiveram as costas para os sindicatos, os movimentos estudantis e para as instituições de pesquisa da área. Torçamos por um outro começo, de modo que as forças democráticas e populares estejam em igualdade de condições para disputar o Governo com aquelas que estão ávidas para continuarem dirigindo o governo da República.
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