Sâmara Carla Lopes Guerra de Araujo*
Futebol, política e religião não se discutem! Quem nunca ouviu isto? Contudo, precisamos e devemos dialogar, debater, entender e respeitar a diversidade de opiniões, em quaisquer assuntos, sejam quais sejam os esforços − pessoais ou coletivos − que precisemos realizar para que esta realidade seja uma constante e para que a tolerância esteja sempre em pauta. Atualmente está posto um considerável desafio, uma vez que estamos vivenciando um contexto bastante atípico, onde há extremismos, dualidades, divisões e discordâncias, em quase todos os campos da esfera social, e a discussão de diversos assuntos tem sido bastante calorosa, havendo exceções, é claro.
Há algum tempo vivenciei uma experiência com turmas de Educação de Jovens e Adultos (EJA) numa instituição escolar da Rede Municipal de Educação de Belo Horizonte, a qual localiza-se na Região Nordeste da Capital Mineira. A partir de demanda dos próprios jovens, adultos e idosos das turmas, a equipe pedagógica a qual eu compunha constatou a necessidade de conversar sobre a questão da diversidade religiosa no contexto escolar. Havia, naquele momento, um singular coletivo de educandos, no qual havia consideravelmente pessoas que professavam crenças pelo viés das religiões tradicionalmente cristãs, católica e evangélicas, porém, ainda havia algumas outras, em menor número, que expuseram o seguimento de crenças correlatas às religiões de matriz africana, em especial, do candomblé, e aquelas que não professavam fé. No corpo docente, a diversidade também se apresentava contemplando ainda um docente que se autodeclarou, à época, gnóstico.
Ainda que houvesse um ambiente amistoso, no momento em que se discutiu a teoria do evolucionismo, alguns educandos mostraram-se resistentes e as falas se voltavam cada vez mais para o viés criacionista, sem abrir muito espaço para outras vertentes. E, ainda que de maneira indireta, a comparação entre as crenças religiosas professadas ocorria. Tornou-se necessária a discussão da laicidade entrelaçada com aquela do direito à liberdade religiosa e de culto, como também da importância da tolerância religiosa para o bom convívio social e a discussão da existência de outras vertentes que explicavam a origem da vida na Terra.
Pois bem, organizamos leituras, estudos, assistimos a filmes organizamos uma rica feira de cultura e realizamos oficinas também. Dentre as ações desenvolvidas, voltadas para discussões coletivas, ocorreu uma roda de conversa − muito rica e estimulante − entre professores, alunos e alguns convidados externos. A pauta era sobre religiões. Cada um pôde expor os princípios e as práticas religiosas que vivenciavam, fossem eles católicos, espíritas, evangélicos, candomblecistas, gnósticos ou ateus (eram estas as crenças dos convidados à Mesa para exposição das falas. Ao final, foram feitas perguntas pelos presentes). Avaliamos aquela roda como um real exercício de respeito e alteridade! Ocorreram uma escuta atenta e um diálogo aberto para os sentimentos, as histórias, as experiências e as visões de mundo de cada um. E isto tudo no espaço escolar. Assim, as diversas vivências e saberes compartilhados ganharam a mesma ênfase: nenhuma fala foi interrompida, interpelada ou desrespeitada. Foram feitas perguntas para todos os componentes da Mesa e as avaliações das turmas, após o evento, foi de que tudo havia sido muito bom.
Nos últimos anos, temos visto emergir de maneira intensa, no contexto brasileiro (em especial, no contexto político), a discussão sobre o lugar da religião na sociedade e aquela sobre as práticas sociais ocorridas neste âmbito. Somos, então, desafiados a colocar em pauta como a escola precisa se comportar diante das ameaças à laicidade do Estado, por meio de práticas pedagógicas mais inclusivas, afetivas e que combatam toda forma de discriminação e intolerância religiosa, por meio da formação integral do cidadão, a qual inclua, dentre outros pontos, a discussão do Estado Democrático de Direito e do papel de cada ator social na garantia deste.
Acredito que, em nosso cotidiano escolar, todos os sujeitos envolvidos precisam estar atentos para o desenvolvimento de práticas pedagógicas que reconheçam a diversidade religiosa valorizando sua contribuição no processo de constituição da identidade brasileira, que promovam uma atitude de empatia e solidariedade para com aqueles que sofrem discriminação, que possam repudiar toda forma de discriminação religiosa e valorizar o convívio pacífico e criativo entre todos.
A escola é laica! E isso diz respeito a uma posição imparcial em matéria de religião, seja nos conflitos ou nas alianças entre as crenças religiosas, seja diante da atuação dos não crentes. Não se trata de uma rejeição a qualquer religião, nem do envolvimento com alguma delas, em virtude do proselitismo ou por disputas motivadas pela fé; menos ainda se caracteriza pela crítica a qualquer das manifestações religiosas existentes ou ao não adesão a alguma crença, pois isto também é lícito.
Para ampliar esta discussão, gostaria de compartilhar o texto de minha autoria intitulado Gênero, Diversidade Religiosa e Laicidade na EJA. Nele exploro referências teóricas e conceitos e apresento uma sequência didática sobre a temática em tela.
Vamos juntos dialogando e construindo uma educação pública, gratuita, laica, democrática, inclusiva e de qualidade social para todos, uma vez que o Estado Democrático de Direito reserva a todos a garantia da convivência social amistosa e isto inclui as expressões culturais e religiosas.
* Professora na Rede Municipal de Educação de Belo Horizonte, pedagoga e doutora em Educação.
Imagem de destaque: Representantes de diversas matrizes religiosas participam de lançamento do Plano Estadual de Promoção da Liberdade Religiosa, no Cristo Redentor. Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil
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