Ivane Laurete Perotti
−Filha, mostra para a professora que você já sabe escrever o nome inteiro de sua escola.
−Eu sei escrever o nome inteiro, quer ver professora? Quer ver? Ó!… E-S-C-O-L-A!
−Não! Filha! Eu disse o nome… o nome… começa com a letra… a letra… E!
−Então, mamãe! Ó! … já escrevi. Vou ler…
E a menina de sete anos soletra o nome de referência de sua instituição escolar relacionando-o com a inicial da palavra /escola/. Enquanto a mãe insiste em corrigi-la, ela, diligentemente, insiste em provar que aprendera a escrever. Aprendera. O nome de sua escola registra-se gráfica e juridicamente ESCOLA (…) (…) de (…) em homenagem a um destacado patrono de Minas Gerais.
Mais do que perfeita a atuação da pequena aprendente ao registrar uma ação que acontecera antes de outra ação passada. Quem ainda lembra os valores verbais no modo indicativo do “pretérito mais-que-perfeito”? A menina com nome de flor lembra. Certamente todas as flores com nomes de meninas também! Alfabetizar é um jogo de truco, ou uma rodada de amarelinha com sementes de girassóis, ou uma valsa que desabrocha no rodopiar dos pés descalços. Descalços, sim, pois as letras são sensíveis e carregam impávidas o peso de muitos sons: tantos quantos a criativa identidade de um povo der conta de colocar-lhes às costas. As costas largas das letras nem sempre suportam, pois, há de se ter resistência a tanta criatividade em uma língua que se diz uma e já começa com duas. Língua oral e língua escrita mantêm uma agenda para os pretendentes ao baile de muitas danças e curiosamente, dão-se o direito à infidelidade. Dançam e jogam com quem se apresentar. Não elegem parceiros, passam de boca em boca, de papel em papel, de celular em celular, de salão em salão, trocam de roupas, desnudam-se, servem a quem lhes tomar para si e conseguem brincar em medidas de teraflops. Língua oral e língua escrita são falsos acrônimos do pão francês, do cacetinho, do pão de sal, do pão de ló, do pão-de-leite, soladas, ambas, pela entrada e saída do hífen mal educado/maleducado, do trema sem coroa, dos ditongos de boca aberta, dos prefixos divorciados em litigiosas sílabas. Eis o que a menina de 7 anos e nome de flor está a aprender sobre aquilo que, naturalmente já sabe. Sabe? Sabe, nasceu usando a língua materna, é nativa falante de Língua Portuguesa Brasileira, está na escola com nome de escola… deseja-se mais?
−Mãe, a “psora” falou que é assim. É assim e pronto!
−Você não entendeu ainda, minha filha, escreve o nome de sua escola por inteiro…
−Já escrevi…
−Mostra prá professora que você…
−Que eu sei escrever? Já tá aqui, ó… mãe! Você não sabe ler?
Nesses momentos a estação das aprendizagens aduba o ensino. O sol, a chuva, o vento, a lua e as estrelas descem de seus postos para beijar a sabedoria que tem nome derivado da flora brasileira. Não! Não é da flora brasileira que vem o nome da pequena ensinante. O nome dela vem de muito longe: vem da flora oriental, atravessando longas noites de narrativas ao pé do fogo. O nome dela inicia-se com Y… e, aí, começa outra história. Mas essa ficará no salão das valsas e dos jogos que, infelizmente, nem todos são convidados a entrar. A culpa não é da língua: aprender/ensinar, ensinar/aprender é decisão política. A Língua Portuguesa Brasileira não tem portas, e as travas que colocam nela são ilusões provocadas pela injustiça social.
NOTA: a conversa entre mãe, filha e uma professora transcorreu no espaço de um ônibus, centro de Belo Horizonte, MG.
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