Um retrato do Brasil que a Educação precisa alcançar

Tiago Tristão Artero

O que segue abaixo não é um retrato simplificado de um país corrupto ou que por algum motivo não deu certo, mas sim um retrato do modelo neoextrativista, da colonização, da divisão internacional do trabalho, do racismo, do patriarcalismo e da condição imposta para a periferia do capital pelos defensores da mentira do “bem estar social”.

O estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) relaciona as taxas de homicídio entre homens no Brasil ao desemprego e à evasão escolar. A cada 1% de aumento no desemprego, há um aumento de 1,8% no número de homicídios. Os dados são do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), colhidos entre 1980 e 2010. A pesquisa foi realizada num recorte a partir dos 15 até 65 anos.

O Atlas da Violência de 2019 indica que dos 35,7 mil jovens assassinados no Brasil em 2017, 94,4% eram homens. O sexo masculino é o que mais mata e o que mais morre.

Para cada aumento de 1% no atendimento escolar entre 15 e 17 anos, os homicídios caem 1,9%. Nesta faixa etária há a passagem para o Ensino Médio, também indica a fase onde há o maior número de evasão.

Mais escolas significa menos crime. Mas não podemos achar que é qualquer escola, nem que o modelo voltado às avaliações de larga escala corresponde ao contexto social e cultural da diversidade da sociedade brasileira (que historicamente é conivente com o genocídio das/dos negras(os) e indígenas.

O Estupro bate recorde nestes tempos. A maioria das vítimas são meninas de até 13 anos. Num estudo do 13º Anuário Brasileiro de Segurança Pública os dados mostram que num recorte de 2007 até 2018 a taxa de estupro só tem aumentado. Só em vítimas registradas, foram 66 mil em 2018. Quem é o agressor? Alguém próximo (pai, avô, padrasto).

Há algo estrutural nesses números e há um ações por parte do governo para que não se fale desse assunto nas escolas, não se fale do corpo, nem das partes íntimas (que está contido na educação sexual). Mais da metade das mulheres estupradas são negras.

Junto com o conservadorismo e fundamentalismo religioso, o papel de submissão das mulheres também aumenta. Com isso, o feminicídio também dispara. São homicídios contra mulheres em razão de gênero.

O aumento do número de igrejas nas aldeias indígenas acompanha o aumento da violência nestes locais. Há alguma relação? Talvez. O aculturamento é notável, isso podemos dizer.

Só em 2018 1.206 mulheres foram vítimas de feminicídio, alta de 4% em relação a 2017. Numa proporção de dez mulheres que foram mortas em razão de gênero, seis eram negras. Nove em cada dez assassinos de mulheres são companheiros ou ex-companheiros. Parece haver algo relacionado ao machismo e patriarcado nestes números, não? A reportagem que fez a análise dos números é a Agência Brasil.

Numa sociedade que supervaloriza a razão e a competição, a “crise dos cuidados” vulnerabiliza crianças, idosos, pessoas com deficiência e outros.

O secretário nacional de promoção e defesa dos direitos da pessoa idosa, Antônio Costa, ao mencionar a violência contra idosos, disse: “No começo de março de 2020 tivemos 3 mil denúncias, em abril esse índice passou para 8 mil e, em maio, foi para quase 17 mil”. Afinal, para quê valorizar os velhos e velhas, se o sistema diz que o bom é o novo, num senso comum produtivista.

O registro de novas armas no Brasil teve um enorme aumento em 2020, de 205% nas emissões de documento para posse pela Polícia Federal, como reflexo das regras novas deste governo. No DF, aumento foi de mais de 1.400%.

A cada 1% a mais de armas na população há um aumento de 2% no número dos homicídios, segundo levantamento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. E após uma queda dos homicídios em 2019, agora, em 2020, nos cinco primeiros meses, já houve um aumento de 7%, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública em parceria com o Núcleo de Estudos da Violência da USP.

O Brasil foi o terceiro país com o maior número de ativistas ambientais assassinatos: indígenas, camponeses e muitos outros que as mortes não foram registradas, mas que morrem pela luta ao direito à terra. Nas últimas décadas, as mortes eram dos grupos da mineração, hoje são por causa do agronegócio. Segundo a ONG Global Witness, só ficamos atrás das Filipinas e Colômbia, o que retrata que este é um tema importante para a América Latina.

As recentes queimadas no Pantanal e o desmatamento na Amazônia, segundo investigações, também decorrem das atividades do agronegócio (especialmente, para abrir pastagem). Mas também há o garimpo ilegal e a mineração.

Nos últimos dias, com a publicação do texto da PEC (Projeto de Emenda Constitucional) da Reforma Administrativa, sofremos um gigantesco ataque aos serviços públicos, um verdadeiro desmonte que afetará os servidores atuais, os futuros servidores e toda estrutura dos serviços públicos do Brasil, dando abertura, na prática, para a privatização dos serviços sociais.

Diante do avanço da extrema direita, da criminalização dos movimentos sociais, do aumento da miséria e da precarização do trabalho, faço alguns questionamentos.

Quais as respostas que o modo de vida moderno traz respostas para o século XXI? A possibilidade do modo de vida consumista se alargar para os países (mesmo que se queira) é impossível, os biomas não resistiriam.

O sistema hegemônico de produção da vida e de escassez na abundância (uma contradição) e a financeirização das relações humanas não irá retroceder. Só as crises e a alternativas ao desenvolvimento poderão guiar outras possibilidades de organização.

A conjuntura atual de crise econômica atinge a soberania alimentar de milhões e escancara a distorção dos valores construídos na competição bélica e exploradora de todos os tipos de vida, especialmente nos lugares chamados de “periferia do mundo”.

Parece haver uma naturalização de um trabalho alienado e alienante e ele está presente desde a escola no ensino básico. O condicionamento aparece nas primeiras séries, onde as crianças só podem se expressar no intervalo, no recreio, e voltando para a sala de aula devem estar disciplinadas e não questionar, assim como acontece no mercado de trabalho. Quando chegam à adolescência, só querem competição e estão prontos para alimentar o sistema voraz contra a natureza, contra deficientes, contra os mais velhos e velhas. Jovens que ousam refletir sobre o sistema ou que sentem a hostilidade nas relações sociais e na mercantilização da vida, caem na depressão e tornam-se apáticos, sem reação, ou violentos. O egoísmo e o individualismo é um valor hegemônico.

Você não tem amigos, você tem adversários.

Por meio da mídia e dos discursos hegemônicos o trabalho, na sociedade atual, é posto como algo salvador e dignificante. É vinculado à liberdade, igualdade e fraternidade (valores da Revolução Francesa) que deram as bases para a continuidade do genocídio programado que iniciou-se na cruzada pelo Atlântico. Afinal de contas, liberdade para quem? Igualdade entre quem? Fraternidade para com quem?

O retrato do Brasil é o retrato da opressão causada por este sistema.


Imagem de destaque: Faris Mohammed / Unsplash

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