República, Educação e Utopia

Editorial do Jornal Pensar Educação em Pauta número 338

No dia 15 de novembro, completamos mais um aniversário da República brasileira. Esta que deveria ser uma festa cívica das mais importantes do país, cada dia que passa é praticamente ignorada pela população e pelas instituições republicanas. Tal esquecimento, no entanto, é apenas um dos sintomas de que, entre nós, para lembrar alguns dos republicanos históricos mais importantes, “a República ainda está por ser feita”.

Poder-se-ia argumentar, por um lado, que o Governo que se instalou na República nos últimos anos, sobretudo a partir do Golpe de 2016, tem feito todo o esforço para transformar a res-publica em res-privatia. No entanto, ao longo da história do Brasil, a privatização do público, sobretudo naquilo que beneficia as elites nacionais e internacionais, é mais uma regra do que uma exceção.

Há, portanto, que se buscar em raízes mais profundas o quase desprezo nacional pelas festas cívicas e, particularmente, pela festa da Proclamação da República. Em nossa história recente, o que Temer e Bolsonaro fizeram, e continuam a fazer, é tão somente atualizar e aprofundar uma longa tradição, nascida com a própria República, de proteção estatal dos interesses privados dos donos do poder.

Trata-se de um longevo processo educativo posto em marcha para naturalizar a existência e, mesmo, a “necessidade” de uma “república das bananas” como sendo a única possível entre nós. E, infelizmente, desse processo participam ativamente as próprias instituições republicanas, entre elas a própria escola, a mais capilar e inclusiva das instituições públicas.

Aqui, a República que deveria ser “Do Povo” e “Para o Povo” jamais cumpriu seus compromissos junto à imensa maioria da população. Pelo contrário, o processo político-educativo que se estabeleceu visou afastar o povo, pelo convencimento e, sobretudo, pela força, do exercício do poder e da efetiva proclamação da República. Nesta perspectiva, não é que a República não tenha dado certo já que, para nossas elites políticas, empresariais e religiosas, ela tem sido “tudo de bom!”.

Do calendário oficial, marcadamente cristão e católico, à explícita proteção aos interesses das elites contra os ideais democráticos e igualitários cultivados pelas forças contrárias à ordem vigente, a República brasileira sempre mostrou sua face perversa e violenta. Tal “pedagogia da ordem” tem sido uma poderosa ferramenta de cultivo dos corpos e das mentes brasileiras.

A efetiva publicização da República é, ainda, apenas uma das possibilidades postas nos movimentos da história. E, a considerar os acontecimentos dos últimos anos, estamos hoje mais distantes da “República dos nossos sonhos” do que estávamos no início deste século. Avançamos para trás e quem mais paga pela crescente privatização da res-publica é a população mais pobre.

É urgente a retomada das utopias que ao longo do tempo animaram milhões de brasileiras e brasileiros a lutarem por uma República em que as ações das instituições públicas e, mesmo, da iniciativa privada tem como meta o bem estar do conjunto da população. E isto passa pelo sonho, pela utopia, de uma República efetivamente democrática, laica, igualitária e contrária a todo e qualquer tipo de violência e discriminação. Esta não é, ainda, a República que comemoramos no dia 15 de novembro, mas é preciso mantê-la como horizonte de nossas lutas e de nossas melhores utopias!


Imagem de destaque: Béria Lima de Rodríguez 

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República, Educação e Utopia

No dia 15 de novembro, completamos mais um aniversário da República brasileira. Esta que deveria ser uma festa cívica das mais importantes do país, cada dia que passa é praticamente ignorada pela população e pelas instituições republicanas. Tal esquecimento, no entanto, é apenas um dos sintomas de que, entre nós, para lembrar alguns dos republicanos históricos mais importantes, “a República ainda está por ser feita”.

Poder-se-ia argumentar, por um lado, que o Governo que se instalou na República nos últimos anos, sobretudo a partir do Golpe de 2016, tem feito todo o esforço para transformar a res-publica em res-privatia. No entanto, ao longo da história do Brasil, a privatização do público, sobretudo naquilo que beneficia as elites nacionais e internacionais, é mais uma regra do que uma exceção.

Há, portanto, que se buscar em raízes mais profundas o quase desprezo nacional pelas festas cívicas e, particularmente, pela festa da Proclamação da República. Em nossa história recente, o que Temer e Bolsonaro fizeram, e continuam a fazer, é tão somente atualizar e aprofundar uma longa tradição, nascida com a própria República, de proteção estatal dos interesses privados dos donos do poder.

Trata-se de um longevo processo educativo posto em marcha para naturalizar a existência e, mesmo, a “necessidade” de uma “república das bananas” como sendo a única possível entre nós. E, infelizmente, desse processo participam ativamente as próprias instituições republicanas, entre elas a própria escola, a mais capilar e inclusiva das instituições públicas.

Aqui, a República que deveria ser “Do Povo” e “Para o Povo” jamais cumpriu seus compromissos junto à imensa maioria da população. Pelo contrário, o processo político-educativo que se estabeleceu visou afastar o povo, pelo convencimento e, sobretudo, pela força, do exercício do poder e da efetiva proclamação da República. Nesta perspectiva, não é que a República não tenha dado certo já que, para nossas elites políticas, empresariais e religiosas, ela tem sido “tudo de bom!”.

Do calendário oficial, marcadamente cristão e católico, à explícita proteção aos interesses das elites contra os ideais democráticos e igualitários cultivados pelas forças contrárias à ordem vigente, a República brasileira sempre mostrou sua face perversa e violenta. Tal “pedagogia da ordem” tem sido uma poderosa ferramenta de cultivo dos corpos e das mentes brasileiras.

A efetiva publicização da República é, ainda, apenas uma das possibilidades postas nos movimentos da história. E, a considerar os acontecimentos dos últimos anos, estamos hoje mais distantes da “República dos nossos sonhos” do que estávamos no início deste século. Avançamos para trás e quem mais paga pela crescente privatização da res-publica é a população mais pobre. 

É urgente a retomada das utopias que ao longo do tempo animaram milhões de brasileiras e brasileiros a lutarem por uma República em que as ações das instituições públicas e, mesmo, da iniciativa privada tem como meta o bem estar do conjunto da população. E isto passa pelo sonho, pela utopia, de uma República efetivamente democrática, laica, igualitária e contrária a todo e qualquer tipo de violência e discriminação. Esta não é, ainda, a República que comemoramos no dia 15 de novembro, mas é preciso mantê-la como horizonte de nossas lutas e de nossas melhores utopias! 


Imagem de destaque: Béria Lima de Rodríguez 

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