Quem teve a ideia de fazer sátiras com o absurdo? Convite à Ópera Massacre

João Victor da Fonseca Oliveira

“Como num recital improvisado de manicômio ou uma ópera regida pelo mestre horror, ‘Ópera Massacre’ é um oportuno encontro da tragicomédia e o gênero do absurdo. Inesperado, caótico e, ao mesmo tempo, extremamente sólido na sua dimensão humana. Nesta trama mirabolante uma família entra em colapso quando se vê obrigada a preparar o velório da matriarca, uma distinta cantora de ópera com um defeito singular: se recusar a morrer.”

É assim que o espetáculo Ópera Massacre, dirigido por Gustavo Des, dá tom a sua cena. De volta ao teatro, a peça foi a primeira que assisti, após um longo período de isolamento social em função da COVID-19. Pela mesma circunstância, o autor deu vida ao seu texto, ao escrevê-lo durante esse momento crítico. A construção narrativa do texto é impecável e nos leva a elogiar, diversas vezes, a robustez da obra. Sua encenação, igualmente. O elenco é outro ponto alto da peça. Formado por diferentes gerações de atrizes e atores, é um bom sintoma da capacidade criativa de quem é apaixonado pelo palco.

A composição de Ópera Massacre estende seus efeitos para fora do teatro. No limite entre a sátira e o absurdo, não é difícil recordar qualquer familiar disposto a enterrar seus vivos. Por essa razão, o espetáculo se torna uma relação tensa entre o despropósito da insensibilidade e a banalidade que o encerra.

As luzes, o cenário, o efeito do estrobo e da câmera lenta criam outra plasticidade na peça: ao ponto de até as coxias mal iluminadas revelarem toda intimidade reprimida. Em tempos como os nossos, em que o caos virou rotina e o disparate segue sendo servido no café da manhã, é essencial não se deixar impregnar da normalidade dos detalhes sórdidos, mesmo aqueles embalados por belas óperas. Uma das melhores maneiras de percebê-lo, talvez, possa estar aí: olhando e satirizando o despautério diante de nós.

Se recusar a morrer, quem sabe, seja o único jeito de afastar o absurdo.

 

Para saber mais


Texto e direção: Gustavo Des

Elenco: Axwell Godoi, Clarice Carvalho, Lucas Michielini, Laura Damada, Thiago Latalisa, Gabriel Oliveira e Tom Garcia

Cenário: Anderson Ferreira

Figurino: Laura Vexisto

Coreografia: Deborah Leal

Iluminação: Rafael Bertolacini

Produção: Ramon Moreira

Instagram: @opera_massacr3


Imagem de destaque: Enviada pelo elenco.

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