Professor da Universidade de Pernambuco cria o Grupo de Intervenções e de Performances Poéticas (GIPP): a (in) utilidade da poesia em tempos difíceis
Vlader Nobre Leite
Uma questão que preocupa constantemente o professor-educador, especialmente, aquele que leciona a disciplina de Literatura, é a dificuldade que os alunos apresentam quando estão diante da leitura, seja dos mais diversos gêneros, seja, especificamente, do texto poético, que exige do leitor uma “aprendizagem de desaprender” (Alberto Caeiro). Tanto ler quanto interpretar textos tem sido uma tarefa difícil para os alunos. No que se refere ao texto poético, isto se intensifica ainda mais.
De um modo amplo, falar em leitura aponta sempre para a questão da produção de sentidos, aquilo que Wolfgang Iser conceitua como interação recíproca entre autor e leitor através do texto. Neste sentido, a leitura do texto poético permite afetar o leitor, tanto na sua subjetividade quanto nos seus valores e conhecimentos, pois a cada leitura, constroem-se novas significações. A linguagem poética, com toda sua impertinência e estranhamento, interfere, de maneira profunda, na busca do indivíduo em se inserir no mundo e compreendê-lo. Heidegger afirma que a linguagem poética é a “casa do ser”, pois proporciona um encontro com a existência humana, fugindo à trivialidade. Isso potencializa o percepção crítica do indivíduo, “ajudando-o a viver” (Todorov).
Sabe-se que a leitura favorece o conhecimento crítico do mundo, pois, além de seu caráter informativo, desperta para a fantasia e a ludicidade (“o sonho acordado das civilizações”, como bem aponta Candido). O texto literário oferece uma linguagem carregada de sentido que “consiste precisamente em incitar a humanidade a continuar a viver; em aliviar as tensões da mente, em nutri-la” (Pound).
Por essa razão, urge repensar o espaço dado à literatura e à poesia em sala de aula. Se os alunos demonstram dificuldades em assimilar a linguagem poética, parte da responsabilidade é escolar. Isso não quer dizer que a leitura se inicie na escola; na verdade, ela é anterior ao ambiente escolar, e deve ser continuada fora dele. É preciso incentivar os professores de Literatura (bem como os demais) a trabalharem o texto poético em sala de aula, para que se possa motivar os alunos a se encantarem com a linguagem poética. Seguindo o pensamento de Candido, poesia é mais que um dever da escola, é um direito humano.
Quer-se com este projeto estimular a leitura e produção de textos poéticos, levando-se em conta o papel do professor, bem como a percepção dos alunos. A escolha pelo texto poético baseia-se no seu caráter subversivo, insubordinado, desordeiro, pois “a poesia nos ensina a ver como se víssemos pela primeira vez” (Moisés). Isso encoraja os indivíduos a buscarem sentido no mundo e nas relações sociais, atingido a dimensão ética da leitura, “um exercício de conhecimento de mundo, de nós mesmos e de outros” revertendo “a favor da experiência de vida, geral e cumulativa” (Nunes).
Assim, pensa-se que a leitura, feita de modo prazeroso e metodologicamente bem orientado, transforma o leitor, em uma jornada da passividade à voz ativa.
O Grupo Interdisciplinar de Intervenção e Performance poética será criado com o propósito de potencializar a poesia e as demais linguagens artísticas nos diversos espaços da sociedade petrolinense: escolas, shopping, embarcações que cruzam o Velho Chico, presídios, abrigos, casa de passagem, universidades, no Café com Arte, escolas e praças entre outros espaços. Assim pensado, estaremos consolidando ações de caráter extensionista no sentido de atender a um dos pilares básicos que fazem a Universidade, ou seja, a extensão.
“Por essa razão, urge repensar o espaço dado à literatura e à poesia em sala de aula. Se os alunos demonstram dificuldades em assimilar a linguagem poética, parte da responsabilidade é escolar”.
Breve História
O projeto surgiu a partir do interesse que os professores-pesquisadores têm com o texto poético, seja em virtude da experiência que cada um possui em sala de aula (ensino), seja como leitores de poesia (natureza pessoal e particular), seja preocupados com o compartilhamento das leituras poéticas entre os alunos (aprendizagem). Assim, o projeto assume: uma preocupação de natureza teórica (os fundamentos teóricos acerca do texto poético, desde concepções tradicionais a conceitos contemporâneos); e um compromisso de ordem prático, ao direcionar o olhar para os alunos, desde o modo como entendem e percebem o texto poético, até a autonomia de construir os próprios textos. A partir de um olhar sobre a lírica dos poetas considerados ícones da literatura (nacional ou estrangeira), os alunos, envolvidos neste processo, mediados pelos professores-pesquisadores, que darão o suporte teórico-metodológico, serão estimulados a construírem e/ou exporem seus próprios textos, através de intervenções na Universidade, bem como nas escolas (públicas ou privadas). Com isso, estimula-se a leitura do texto literário e poético na escola, bem como permite ao aluno ter acesso ao mundo da literatura, e mais, ter visibilidade para interferir poeticamente neste mundo.
Isso aponta para o aspecto da humanização de que coerentemente trata Antonio Candido, pois, a partir da leitura dos textos literários, são estimulados “exercício da reflexão, a aquisição do saber, a boa disposição para com o próximo, o afinamento das emoções, a capacidade de penetrar nos problemas da vida, o senso da beleza, a percepção da complexidade do mundo e dos seres, o cultivo do humor.” (Candido, 1995). A literatura, assim, eleva-se A uma condição especial, torna-se um direito humano, “o sonho acordado das civilizações” (Candido, 1995).