Pós-modernidade e educação para a cidadania (Parte I)

Antonio Carlos Will Ludwig

Embora os referenciais teóricos anteriormente examinados se caracterizem pela singularidade eles se mostram unidos em decorrência  de um aspecto essencial, ou seja,  todos são produtos da modernidade. O conceito liberal de cidadania que diz respeito a uma relação entre o indivíduo e o Estado baseada em obrigações recíprocas previstas em lei não é negada nem pelo comunitarismo e nem pelo marxismo. A prática da cidadania nesta tríade tem também em mira a vida em sociedade, sendo que no liberalismo e no comunitarismo o escopo principal é o de colaborar com a governabilidade visando manter o seu equilíbrio e a sua estabilidade enquanto que no marxismo a finalidade fundamental é a de transformá-la incessantemente rumo ao socialismo. Cabe questionar se estas inferências se aplicam à pós-modernidade. Para dar uma resposta plausível é preciso expor um entendimento a seu respeito.

Os adeptos da  pós-modernidade acreditam que ela se refere ao estágio contemporâneo da civilização  cujo marco inicial é datado a partir de meados do século vinte. Faz parte desta crença que a mesma exprime uma ultrapassagem do período moderno que por sua vez se constituiu numa superação da época pré-moderna. Apenas para auxiliar a compreensão é importante lembrar que os dois traços mais destacados da época pré-moderna, que perdurou por mais de dois mil anos e começou a ser deixada para traz no decorrer do Renascimento foram a visão de mundo que agregava o senso de equilíbrio, a harmonia universal, a finitude das fronteiras e a imutabilidade das coisas e o predomínio de concepções míticas, mágicas e religiosas. O ciclo da modernidade apresentou a industrialização, a ideia de homem como um ser autônomo e racional e a valorização da técnica e da ciência como características realçadas.

De modo sintético pode ser dito que a pós-modernidade se assenta em uma cosmovisão a qual indica que a realidade social é predominantemente instável, descontínua,  efêmera,  fragmentada,  mutável,  caótica,  incerta e que a história humana caminha em direção a rumos indefinidos. Para viver nesses novos tempos o ser humano tem que ser bastante flexível, exercitar ao máximo a sua liberdade, uma prescrição que o aproxima do liberalismo, exibir níveis elevados de protagonismo, construir sucessivos projetos de vida e comprometer-se com o desenvolvimento contínuo de suas múltiplas dimensões, dentre as quais se encontra a capacidade racional vista como tendo o mesmo valor das demais. Note-se que diversos acontecimentos contribuíram para a configuração do pensamento pós-moderno.

Um deles é a emergência da Física atual que se assenta no pressuposto indeterminista, segundo o qual  inexistem leis naturais e relações de causa e efeito, o que elimina a viabilidade de se estabelecer previsões. Este indeterminismo tem como principal ponto de apoio o “princípio da incerteza” reinante nas partículas atômicas. Tal princípio indica que não é possível em qualquer situação e ao mesmo tempo ter um conhecimento preciso e absoluto a respeito da posição e da velocidade dessas partículas. O indeterminismo também está presente no mundo macroscópico isto é no movimento dos corpos celestes. Assim sendo  tende a obrigar  os físicos a lançarem mãos  do cálculo probabilístico que se aplica a fenômenos imprevisíveis, porém com chances extremamente remotas de acerto dada a natureza deste tipo de cálculo.    

A matemática também fornece certos tipos de cálculo usados por aqueles pesquisadores ligados à Teoria do Caos. Segundo esta teoria, caso ocorra uma minúscula alteração no momento em que um evento qualquer se inicia, sérias, desconhecidas e imprevisíveis consequências podem emergir mais à frente. Tais cálculos são empregados em muitas áreas, tais como os fenômenos meteorológicos, os movimentos das placas tectônicas e o crescimento populacional.

Em meio a estas visões cosmológicas divergentes surgiram concepções diferentes no âmbito da Filosofia da Ciência. A esse respeito podemos mencionar Thomas Kuhn  que aponta a presença de paradigmas que são seguidos pelos pesquisadores. Estes paradigmas ou modelos de interpretação do mundo, devidamente reconhecidos no campo da ciência, apesar de durarem  certo tempo, frequentemente sofrem um processo de substituição, como por exemplo, a teoria da gravidade de Einstein que superou a de Newton.    

Outro exemplo faz referência a Karl Popper que defende a ideia da refutação de modelos cujo significado diz respeito à permanência de uma determinada teoria que é aceita como verdadeira até o momento em que seja possível contradizê-la por meio da experiência empírica. Cabe citar ainda Paul Feyerabend e sua proposta do “anarquismo epistemológico” cujo significado é o de que o pesquisador não deve recusar o exame de qualquer ideia que se apresente por mais absurda e imoral que seja, bem como deve considerar que método algum é imprescindível no trabalho de investigação, mesmo porque muitos conhecimentos foram produzidos de maneira alternativa e continuam se mostrando relevantes.

Também é importante o surgimento da denominada  “era pós-industrial”. Aqueles que acreditam que estamos imersos em um novo momento econômico da história  asseveram  que ele é bem diferente do anterior,  tende ao crescimento e absorve a maior parte dos trabalhadores. Esta ocorrência inclina-se a minar duas concepções fundamentais pertinentes tanto ao marxismo estruturalista quanto ao marxismo dialético. Uma delas é a da reprodução das relações de produção e a outra é a da luta de classes como motor da história, pois tais concepções encontram-se assentadas basicamente no capitalismo industrial.


Imagem de destaque: Gerd Altmann/Pixabay 

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