Uberização e o futuro da educação no pós-pandemia: mais desigualdade social?

Lucas Carneiro Costa

O que é a uberização?

A uberização é um fenômeno recente no mundo. O nome deriva do serviço fornecido pelo aplicativo de celular “Uber”, que consiste, basicamente, em oferecer um serviço descentralizado. Ao invés da relação cliente-estado-serviço, foi criado a relação direta entre cliente-serviço, de caronas. A criação deste tipo de tecnologia e serviço pelo aplicativo Uber foi tão revolucionário que reinventou as comunicações e as relações interpessoais e institucionais, abrindo uma porta gigante de entrada para serviços descentralizados – a maioria através de um aplicativo de celular específico. Este processo parece ser irreversível.

Nos dias atuais, tudo “foge” da relação estatal e tudo é descentralizado. Pessoas se relacionam com pessoas, mas através de empresas. Até políticos prestam contas de seus mandatos por aplicativos e tecnologias do tipo. Redes sociais com o objetivo de fazer câmbio de dólares e euros, fugindo da regulamentação do Banco Central, foram inventadas. Qual é o perigo deste tipo de objeto? É que as empresas passam a monopolizar as relações interpessoais e ditar as regras do jogo institucional, fugindo muitas das vezes das mãos da justiça e até mesmo da autoridade do Estado.

A Uber não é uma rede social livre, onde pessoas contratam diretamente serviços de pessoas. É uma empresa que faz essa ligação – e que cobra abusivamente um preço por isso. Um motorista da Uber, por exemplo, trabalha mais do que 10 horas diárias para ganhar o equivalente a R$ 2 mil reais (sem qualquer tipo de garantias trabalhistas ou qualquer tipo de assistência). A característica que está mais presente na atualidade é que o capitalismo chegou num ponto onde o governo não é mais necessário, sendo apenas um órgão que pode ser substituído ou superado.

Que garantia as empresas podem dar se elas deterão o monopólio das relações humanas? Onde ficam as pessoas que não têm acesso a essa tecnologia? Ou seja, o que fazer com quem não possui smartphones, computadores ou mesmo o acesso à internet? Se os serviços e produtos passarem a ser fornecidos por aplicativos, qual será a situação de quem não tem acesso a eles? Devemo-nos perguntar o quão útil e positivo é este fenômeno e até que ponto ela segrega os seres humanos. Um motorista da Uber ou um prestador de serviço para empresas de tecnologia similares já não consegue mais recorrer à Justiça do Trabalho se houver abusos, já que a empresa teoricamente emprega o indivíduo de forma “autônoma”.

A pandemia de covid-19 e a educação

Nesse contexto, em qual lugar está a educação? A uberização tornará diferente a realidade do sistema educacional? Se sim, qual será a situação dos professores e alunos? A pandemia de covid-19 catalisou o processo de uberização da educação? Faremos, abaixo, algumas breves reflexões.

Na maioria dos modelos de ensino remoto ou de ensino à distância, o professor torna-se apenas um produtor de conteúdo. A sua função é muito mais restrita e seu papel como um educador libertador passa a não ser validado, muito por conta dos processos rígidos educacionais (aulas em modelos prontos, com materiais produzidos por grandes editoras em larga escala). As escolas passam a reduzir os salários e as condições de trabalho dos professores tanto para conter os problemas de receita gerados pela crise econômica quanto para privilegiar outros profissionais, como os área da tecnologia da informação (pois acreditam que estes serão muito mais úteis e que podem, em última instância, desenvolver o papel de professor). 

Num segundo momento, o ensino remoto no período pandêmico esboçou, para muitos, que negligenciaram as disparidades econômico-sociais, a utópica visão da existência de uma igualdade educacional brasileira – ou então, a famosa conquista meritocrática que justifica o sucesso de cada um, apenas, pelo “seu esforço”. Ainda que tardia, de uma forma geral, este movimento é benéfico, no sentido que revitaliza e evidencia uma pauta que deve permanecer e estar em constante debate.

Pensemos no processo educacional como um todo, que já era ineficiente e incansavelmente fraco. A busca pela manutenção da educação por vias remotas e à distância faz-se questionável, quando se pensa no sentido geral que o ensino educacional brasileiro, em especial em seu caráter público, vinha-se desmembrando. Alunos, que ficavam por dias sem aulas pela falta de professores, salas de aulas e materiais escolares, agora precisam transpor ainda mais barreiras. Isto é, há ainda mais fatores que impedem a execução das aulas.

Futuro

A desigualdade social e de oportunidades é o que marca o Brasil enquanto país. Em toda a nossa história (seja ela econômica, social ou política), o tema desigualdade é presente e um fator importante para determinar quem somos. Portanto, a desigualdade social será um fator determinante para o debate do futuro da educação no Brasil pós-pandemia e numa conjuntura de uberização.

No fim, todas essas “consequências” levantam as seguintes questões: se o Brasil não conseguir estabelecer um plano nacional de educação, ou implantar um novo sistema educacional, fazendo as reformas necessárias, haverá um retrocesso da educação e dos níveis educacionais? A desigualdade social, que já é grande, pode aumentar devido a esta grande diferença que será criada a partir da falta de acesso à educação e à renda? Seria este [ensino remoto] uma nova modalidade de ensino?

 

Sobre o autor

Mestrando em Economia Aplicada pela Universidade Federal de Viçosa e graduado em Pedagogia (Licenciatura) pela Universidade do Estado de Minas Gerais. 


Imagem de destaque: Galeria de Imagens

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