“Passos”

Hérika de Mello Cézaz 

Minha primeira inserção em uma escola se deu quando eu tinha dois anos. Segundo minha mãe, não havia vagas na creche do nosso bairro; então acabei indo estudar no Centro da cidade, no Centro de Educação Infantil Odete Ramos Poltronieri. Após pouco tempo, surgiu a vaga que minha mãe almejava e fui matriculada em nosso bairro, no pré-escolar Mariza Galdine. Ainda me lembro de algumas experiências neste último: estávamos aprendendo nossos nomes e a professora tentava me ensinar a escrever Hérika com “c”. Lembro também que eu já havia aprendido a escrever meu nome com “k” e que eu falava para ela “mas tia, meu nome não é assim” e ela insistia que era com “c”. Não lembro como essa história acabou, mas restou uma certa frustração, pois Hérica com “c” não era eu. 

Após o pré-escolar Mariza Galdine, muitas coisas mudaram, tanto na minha vida escolar como na minha casa. Como só havia as turmas seguintes (de 1º ano a 5º ano) em outra escola, acabei tendo que mudar, porém nessa época mudanças não me agradavam tanto. Fui para o Grupo Escolar Municipal Joaquim Magalhães. Foi então que aprendi a ler e mais tarde a gostar de ler. Lembro de quase todas as minhas professoras. De vez em quando encontro com algumas e acho maravilhoso que ainda se lembrem de mim. Foi nesta escola que fiz amigos que tenho até hoje: passamos por todas as outras fases juntos e ainda permanecemos unidos. 

Já em minha família, foi a época em que meus pais se divorciaram. No início foi difícil, mas aos poucos fui me acostumando com a ideia e pouco tempo depois acabei percebendo o quanto conseguia aproveitar melhor os dois dessa maneira. Depois de um tempo, ambos se casaram novamente e eu ganhei duas famílias, então percebi o quão importantes as mudanças são. 

Na segunda etapa do Ensino Fundamental, estudei na Escola Básica Municipal Lucinira Melo Rebelo, que tinha turmas de 6° ano ao 9° ano. Foi lá que percebi o quanto gostava de fazer parte das atividades da escola: rodas de leitura, gincanas ecológicas etc. Fui líder de turma e adorava sentir que eu fazia parte disso. No ano de 2015, minha família se mudou para a cidade de Bombinhas/SC e tive que estudar em outra escola. Foi nesse ano também que minha percepção de mundo aumentou. Resolvi sair da minha bolha e prestar atenção aos fatos que aconteciam ao meu redor.

Percebi como as escolas infelizmente mudam dependendo do lugar. Nessa nova escola eu tinha colegas mais difíceis de lidar. Até o final do ano acabei me adaptando e criando carinho pelos professores, em especial a professora de Geografia, que me deixava maravilhada com o entusiasmo com que dava aulas. Ela realmente gostava do que fazia e o fazia muito bem. Percebi também o quanto os professores vinham sendo desvalorizados e como eles lutavam por melhores condições (ocorreram duas greves naquele ano). 

Em 2016 nós voltamos para Camboriú e eu acabei voltando para minha antiga escola. Já não sentia mais a necessidade de fazer parte de tudo, então não fui a líder da turma. Comecei a pensar sobre meus próximos passos e resolvi fazer a prova de ingresso para cursar o Ensino Médio integrado no Instituto Federal Catarinense – Campus Camboriú. Passei o ano estudando. Quando chegou o dia da prova eu estava preparada, afinal havia estudado. Só não contava com a minha insegurança e foi ela que decidiu meu caminho. Na hora de fazer o gabarito, passou pela minha cabeça que as sequências eram muito repetitivas e as mudei aleatoriamente. Por eu ter mudado as respostas, acabei não sendo selecionada e fui estudar o Ensino Médio na Escola de Educação Básica Professor José Arantes. 

Iniciei os estudos no E.E.B Professor José Arantes e comecei a refletir sobre “qual o meu papel na sociedade?”. Também senti minha vida muito parada e que precisava inventar algo para me ocupar. Fiz 16 anos e fiz minha carteira de trabalho e título de eleitor. Queria começar a trabalhar e ter meu dinheiro. Queria poder exercer meu direito como cidadã. Conversando com a minha mãe, ela me convenceu de que nessa idade o melhor seria somente estudar e que eu poderia fazer um curso. Fiquei um pouco decepcionada por não ouvir o que eu queria, mas seguindo o conselho, no ano seguinte comecei a fazer um curso de inglês. Assim, posso afirmar que fui uma estudante privilegiada: podia somente estudar sem ter que me preocupar em ajudar financeiramente minha família.  

Meu último ano do Ensino Médio foi um ano de tensões. Pensava muito em como seria o depois, porque afinal uma etapa estava se encerrando. Eu precisava decidir o que fazer ou o que cursar, mas acabei terminando o ano sem ter certezas sobre isso. Sabia que queria continuar estudando, então entrei em um cursinho pré-vestibular e em novembro fiz o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM).

Enquanto isso acontecia na minha vida, outras mudanças aconteciam no país. No ano de 2003, Luiz Inácio Lula da Silva assumiu a presidência do Brasil. Nessa época eu ainda não sabia, mas esse fato político foi fundamental para eu chegar onde estou hoje. Foi no governo dele que entraram em prática algumas políticas para a democratização de acesso à educação de nível superior e a interiorização deste ensino. Programas estudantis do Governo, como o Programa Universidade para Todos (ProUni) e o Sistema de Seleção Unificada (SiSU), mais especificamente ao SiSU, me possibilitaram ingressar no curso de Licenciatura em Pedagogia do IFC – Campus Camboriú: um curso superior de referência, gratuito, de qualidade e para todos. Acredito que é um direito que temos, o ter acesso à educação de qualidade com todos esses referenciais e entrei me sentindo realizada. 

Olhando para trás, eu vejo como cada decisão que tomei, as mudanças na minha vida e cada fato ocorrido, me trouxeram onde estou hoje. Independente se foram momentos bons ou ruins, foram decisões que me levaram a viver. Todos esses passos compõem quem sou hoje e eu me orgulho deles. Não há como olhar para esses momentos sem sentir carinho por todos, afinal, é a história da minha vida e é por eles que estou aqui, hoje. A escola pública seguiu comigo até aqui, em cada passo.

 

Este é um texto escrito inicialmente como memorial para a disciplina História da Educação, do curso de Licenciatura em Pedagogia do Instituto Federal Catarinense – campus Camboriú, ministrada pela Profa. Dra. Marilândes Mól Ribeiro de Melo. Nele, conto sobre meus primeiros passos, mas no mundo acadêmico. São esses primeiros passos, juntos a outros pequenos passos, que me trouxeram onde estou e não há como lembrá-los sem sentir gratidão por todos eles. Meu nome é Hérika de Mello Cézar, nasci em 03/11/2001 (tenho 19 anos) e sempre morei em Camboriú/SC com meus pais. 


Imagem de destaque: Element5 Digital / Unsplash

 

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