O Observatório de Educação Especial no estado do Espírito Santo
Alexandro Braga Vieira
Desde o ano de 2005, o Ministério da Educação vem implementando o Programa Sala de Recursos Multifuncionais, que objetiva ampliar as possibilidades de trabalho pedagógico na escola de ensino regular para a inclusão de alunos com deficiência, com transtornos globais do desenvolvimento e com altas habilidades/superdotação.
De 2005 a 2009, foram implementadas 15.551 salas de recursos multifuncionaisem 4.564 municípios brasileiros e políticas de formação continuada – por meio de cursos de capacitação e de especialização lato senso – para que os professores de Educação Especial pudessem mediar a oferta do atendimento educacional especializado, definido, segundo a Política Nacional de Educação Especial, em uma perspectiva inclusiva (BRASIL, 2008). Essas ações, realizadas no contraturno de matrícula do ensino regular nas salas de recursos multifuncionais, visam a contemplar as especificidades de aprendizagem dos alunos público-alvo da Educação Especial – ação necessária para acesso ao currículo escolar.
Objetivando avaliar as contribuições dessa política na escolarização dos alunos, foi realizado um estudo denominado Observatório Nacional de Educação Especial: Estudo em rede nacional sobre as salas de recursos multifuncionais nas escolas comuns (ONEESP), envolvendo pesquisadores de várias universidades públicas brasileiras. No Estado do Espírito Santo, o estudo focalizou 10 redes de ensino, sendo cinco delas localizadas na Região Metropolitana (Vitória, Cariacica, Vila Velha, Serra e Guarapari) e outras cinco no norte do Estado (Nova Venécia, São Mateus, Linhares, Sooretama e Rio Bananal).
O Observatório de Educação Especial foi desenvolvido, no contexto capixaba, por meio de duas fases. Na primeira fase, de dezembro de 2011 a dezembro de 2012, envolvendo 139 professores de Educação Especial, objetivou-se coletar narrativas para entender como era realizada a avaliação dos alunos, as estratégias pedagógicas utilizadas nos atendimentos e a formação do professor para realização desse tipo de intervenção. A segunda fase desenvolveu-se de novembro de 2013 a julho de 2014, envolvendo 52 professores que participaram de encontros de formação a partir de uma proposta curricular organizada pelos próprios professores e dos desafios da prática.
O processo de formação apontou possibilidades de articulação de questões teóricas com as práticas pedagógicas cotidianas, mas também um conjunto de questionamentos que se colocam como desafios para o processo de escolarização de alunos público-alvo da Educação Especial na escola de ensino regular. Nesse contexto, coloca-se como pergunta: como conjugar a sala de aula e a sala de recursos multifuncionais como espaços parceiros? Para muitos professores, as respostas a essa pergunta ainda são frágeis.
Outra questão destacada pelos professores diz respeito ao cuidado de não subjetivar as salas de recursos multifuncionais como espaços que agregam alunos impróprios à sala de aula comum, pois, conforme sinalizam as normatizações brasileiras, a sala de aula comum e a sala de recursos multifuncionais se complementam.
Um terceiro desafio se constitui quando pensamos a apropriação do conhecimento propriamente dito. Muitos docentes nutrem dúvidas sobre o que ensinar aos alunos, pois não se sentem capacitados para mediar a aprendizagem de estudantes que fogem ao padrão historicamente valorado pela escola, situação fortalecida pelos currículos que se colocam hegemônicos e padronizados.
O desenvolvimento de ações de colaboração entre os professores da sala de aula comum e da sala de recursos multifuncionais também é acenado como uma ação necessária para a inclusão dos alunos nas práticas pedagógicas cotidianas, pois essa ação pode desencadear ricas oportunidades de mediação pedagógica e construção de experiências docentes sobre como garantir a aprendizagem no contexto da diferença humana.
No que se refere à formação dos profissionais da Educação, os docentes apontam a necessidade de reorganização dos processos de formação inicial para que as questões da Educação Especial possam ser amplamente debatidas pelos vários componentes curriculares, tanto no campo teórico quanto no prático. Sobre a formação continuada, os professores apontam a necessidade de se garantir espaços de planejamento e de formação para os professores aprofundarem seus conhecimentos e o desenvolvimento de posturas mais críticas dos profissionais da Educação para promoção da tradução dos conhecimentos e experiências de pedagogos, professores de ensino comum e de Educação Especial, pois trabalhar de maneira coletiva se coloca ainda como um desafio para a escola que caminha numa perspectiva inclusiva.
Um último apontamento se reporta às práticas pedagógicas, pois, muitas vezes, temos assumido os espaços de intervenções especializadas como momentos reduzidos ao trabalho com jogos, materiais concretos, uso do computador e atividades de alfabetização, sem uma proposta sistematizada e sem um acompanhamento nascido a partir das necessidades do aluno. Assim, há de se pensar que a aprendizagem contextualizada se coloca como uma ação necessária para falarmos de apropriação de conhecimentos emancipatórios e significativos para os estudantes, independentemente de suas condições físicas, psíquicas, sensoriais, emocionais, econômicas e intelectuais.
A participação do Espírito Santo no Observatório Nacional de Educação Especial apontou linhas de análise que nos ajudam a pensar em desafios que precisam ser superados para que os estudantes com deficiência, com transtornos globais do desenvolvimento e com altas habilidades/superdotação tenham garantido o direito à Educação, conforme prescreve a legislação educacional brasileira. É preciso constituir um olhar de aposta na aprendizagem dos alunos, investimentos na formação dos profissionais da Educação, articulação dos serviços de apoio às ações da sala de aula comum e um debate mais profícuo sobre os currículos escolares para que se tornem mais abertos e flexíveis a incorporar os vários conhecimentos existentes na esfera social.
Renata Duarte Simões e Alexandro Braga Vieira são professores da Universidade Federal do Espírito Santo, atuando no Curso de Licenciatura em Educação do Campo.
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