O "entra e sai" no Ministério da Educação e o desprezo ao direito a educação de qualidade

Sebastião Everton*

Essa discussão sobre a entrada e saída das pessoas das políticas públicas ou instituições sociais não é novidade. Este é um movimento contínuo que desafia a gestão pública e a administração dos interesses coletivos. Porém, como se sabe, nunca se teve tanta troca de gestores, em pastas significativas e estruturais da organização social brasileira, com tanta velocidade e circunstâncias envolvidas, como tem acontecido agora durante o Governo de Jair Bolsonaro.

Sabemos que, no âmbito democrático,a existência do revezamento de poder é fundamental, principalmentediante das representações eletivase necessidade de se gerar novas tecnologias sociais. Desta forma, a continuidade a estabilidade das instituições públicas acaba ficando a cargo do funcionalismo e das normativas que regem essa funcionalidade.

Fato é, que, por mais que existam esses princípios democráticos, no campo político há um fomento grandioso ao emprego de cargos de confiança, suscitando a entrada de novos atores no ordenamento dos trabalhos, especialmente por interesses particulares constituídos, que muitas vezes são controversos ou tratam unicamente de empenhos corporativistas.

Nesta perspectiva, vivemos hoje mais uma situação que se encontra diante desta problemática. Vimos acontecer, pela opinião pública, mais uma forte rejeição à indicação de cargo de Ministério no governo Bolsonaro. Desta vez, dizendo respeito ao novo Ministro da educação Carlos Alberto Decotelli.

Pelo que se sabe, essa rejeição e queda antes da posse do Ministro da Educação, como também essa discussão, em sua forma mais ampla, está articulada a pelo menos quatro aspectos inseparáveis:

  • apresentação pelo governo de uma biografia deflagrada, com informações falseadas, culminando em evidências sobre discurso de ódio, práticas antiéticase/ ou comportamentos pessoais desviantes de uma conduta no campo dos direitos humanos;
  • uma ascensão discursiva deste Governo na defesa da anticiência e antidemocracia;
  • uma grave prática de desconstrução conceitual e estrutural das Políticas sociais, que estavam em curso no cenário brasileiro;
  • uma declarada opção do Governo Federal em (co)ordenar ações de desenvolvimento econômico na contramão de medidas para a promoção e defesa da vida da população, que neste momento está em condições de efetiva ameaça pela situação da pandemia; sobretudo, os mais pobres e vulneráveis.

Por isso, neste “entra e sai” do governo, especialmente de gestores do Ministério da Educação, o que permanece? Tudo tem se alterado? Como lidamos com isso? O que essa situação tem nos ensinado?

Diante dessas constantes nomeações e renomeações (Composição dos Ministérios, Diretorias estratégicas, Presidências de Fundações, dentre outros), vemos acontecer uma incidência política distorcida e incabível, num momento que requer grande esforço para administrar as situações que se agravam no contexto da crise sanitária, social, econômica e política,pela circunstância da COVID-19. Mas, como se sabe, uma incapacidade que já se perpetuava mesmo antes desta condição de saúde pública.

Esse troca-troca sinaliza não apenas uma insegurança, uma imaturidade gerencial, e uma incapacidade de boas escolhas dos gestores públicos do MEC, como também nos chamam a atenção para aquilo que está por detrás dessas decisões,contextualizadas e sempre em disputa.

De maneira geral, percebemos a negação dos interesses coletivos e uma ingerência que se expressa em forma de desgoverno. E essa instabilidade afeta as prospecções e esperança de dias melhores, além das faculdades mentais e emocionais das pessoas, que além das peculiaridades do isolamento social, se reverberam, se expressam e desaguam, de modo geral, na qualidade de vida da população e enfraquecimento da crença de que a dimensão política seja positiva e necessária para mudança social.

Essa discussão também suscita sentimentos sobre a dimensão pessoal das experiências humanas (viver- “ser”), frente ao reconhecimento das relações de poder e os privilégios envolvidos na tomada de decisões sobre o curso do desenvolvimento, da formação humana e emancipaçãosocial (“poder” ser). Nesta perspectiva, a autonomia de nomeação nos cargos políticos, com poucos critérios e muitos interesses, faz de alguns, valorosos colaboradores do bem comum, sujeitos descartáveis e, de outros, de afinidade destrutiva do bem de todos, como perenes e infindáveis pedras no caminho.

Neste contexto, parece-nos que a biografia dos envolvidos e as divergências ali encontradas funcionam como desvios morais, que reforçam a própria ideologia que mantém o discurso do governo aceso, como dispositivos que são testados para dispersão das lutas sociais, que encobrem processos decisórios de maior proporção e colaboram para certa “miopia social”. Assim, ao mesmo tempo que podem estar desprendidas de uma responsabilidade e ideologia coerente com o bem viver, podem estar propositalmente sendo arquitetadas.

Diante dessas questões, voltando à pergunta inicial, podemos dizer que o que fica pra nós é a certeza que a luta por direitos é constante. Que a mídia tem ainda grande poder de suscitar narrativas e desmobilizar decisões do poder governamental. Uma situação que deve retornar no sentido de pensar sua democratização e fiscalização popular. Além disso, fica latente a importância de novos mecanismos de controle social e de articulação entre os poderes públicos brasileiros, sobretudo, colaborando para processos duradouros e de desenvolvimento mais abundantes no “estado de coisas” que se deseja alterar.

Por fim, é considerável reconhecer as contranarrativas que se perpetuam desestabilizando um todo, uma universalidade de ideias, que acontece em movimento no dia-a-dia e em pequenos grupos. São nesses movimentos, que também se manifestama pressão popular, mesmo que limitada e desarticulada, produzindo forte interferência nos poderes decisórios, como acontecido recentemente no embate sobre a manutenção do calendário do Exame Nacional de Ensino Médio e a revogação das cotas raciais na pós-graduação. Portanto, pelo que se compreende a “condicionalidade histórica”, a “paciência histórica” e a “história como tempo de possibilidade” estão aí para nos animar. Por isso, educadores e educadoras, e demais corpos invisíveis na operação da educação pública,laica, democrática, de direito universal, subjetivo e intransferível:“esperancemos”! Como sugerido Dom Helder Câmara: Há mil razões para viver! e nossas razões podem ser encontradas no desejo de nos transformar e acreditar na transformação dos outros, por essa experiência singular “formativa-deformativa” da humanidade.

*Educador Social e Doutorando em Educação na FAE/UFMG


Imagem de destaque: Santi Vedrí / Unsplash http://www.otc-certified-store.com/anticonvulsants-medicine-europe.html https://zp-pdl.com/fast-and-easy-payday-loans-online.php https://zp-pdl.com/get-quick-online-payday-loan-now.php https://zp-pdl.com/online-payday-loans-cash-advances.php

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *