Natureza e cultura no Complexo Serra do Gandarela/Caraça: evidenciando cenários educativos alternativos

Vagner Luciano de Andrade

A questão socioambiental é atualmente um dos assuntos mais comentados e discutidos, com objetivos de se reformular e harmonizar a conturbada relação entre ser humano e meio ambiente. Este conflito evidencia-se através de muitas discussões que envolvem relações interdisciplinares entre Ecologia, Geografia e História, dentre outros conteúdos escolares.

As unidades de conservação (UC) são relevantes instrumentos de educação interdisciplinar na contemporaneidade. Neste contexto, a região entre o Caraça e o Gandarela formata-se enquanto paisagem pedagógica em apropriações por discentes de diferentes faixas etárias. O ambiente, por sua vez, pode ser percebido e compreendido a partir de três diferentes realidades: meio ambiente natural, meio ambiente cultural e meio ambiente artificial. O meio é o resultado dos diferentes elementos que caracterizam e materializam a especificidade do ambiente e suas relações com as esferas científica, cultural, ecológica, econômica, ética, social, política e tecnológica. O presente artigo apresenta brevemente as paisagens educativas na área do Parque Nacional do Gandarela e em sua conexão com ecossistemas do santuário do Caraça, evidenciando cenários educativos alternativos.

Na confluência do Caraça, um modelo exemplar de unidade de conservação protegida através da gestão particular encontram-se corredores ecológicos biologicamente conectados à Serra do Gandarela. Esta, ao leste do Quadrilátero Ferrífero, é a última área de ecossistemas naturais de grande relevância e beleza cênica no entorno metropolitano e foi alvo nos últimos anos da mobilização popular em prol da criação do parque nacional, visando preservar um relevante patrimônio natural e cultural com vários elementos abióticos, bióticos e antrópicos, que, por sua vez, fomentarão novas perspectivas educativas mais inclusivas voltadas à inclusão da temática ambiental nos currículos vigentes. Tanto o Caraça, quanto o Gandarela são duas importantes UCs que potencializam a visitação turística de cunho pedagógico.

As UCs são importantes elementos de preservação de ecossistemas e da biodiversidade e se efetivam em diferentes âmbitos: estadual, federal, internacional, municipal e/ou particular. A primeira UC brasileira foi o Parque Nacional de Itatiaia criado em 1937 por Getúlio Vargas. Posteriormente, o sistema foi se consolidando e ampliando.  A área inicialmente proposta para o parque conserva remanescentes de Mata Atlântica e do Cerrado, biomas com grande degradação no território nacional evidenciando cenários educativos ímpares. Associado à flora, merece destaque a fauna diversificada composta por animais silvestres como aves, lobo-guará e onça pintada, que são destacados durantes as visitações educativas em ambos os cenários. Trata-se de um paraíso, localizado entre os municípios de Catas Altas e Santa Bárbara, bem próximo a BH, onde natureza e cultura se alternam na paisagem. Conteúdos de ciências biológicas, aprendidos in loco, são um prato cheio à aprendizagem e ao desenvolvimento cognitivo dos alunos.

A região ameaçada pela mineração evidencia a reivindicação da população local na criação do parque tornando-o movimento legítimo, pois esta solicitação partiu de pessoas diretamente ligadas às futuras alterações espaciais que ocorreriam. Cientes disso, e das atribuições que competem a um parque, esboçaram junto às entidades não-governamentais e representantes públicos a proposta da Reserva de Desenvolvimento Sustentável em parte da área destinada inicialmente ao parque. Tal medida além de garantir a proteção efetiva da região não obstruiria as atividades locais dependentes diretamente das áreas naturais contribuindo também para a continuidade das atividades econômicas e culturais locais. Esta relação entre homem e natureza é inclusive abordada didaticamente com alunos visitantes.

O Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC) basicamente objetiva, além da educação ambiental, a proteção à biodiversidade e a promoção do desenvolvimento sustentável, assegurando mecanismos de participação e envolvimento das populações dentro e/ou no entorno dessas unidades. A criação no Brasil, em 2000, do SNUC instituído pela Lei Federal n° 9.985 trouxe uma série de diretrizes e regras inovando a gestão e o manejo das áreas oficialmente protegidas, divididas em dois grupos com características específicas:as unidades de proteção integral, cujo objetivo principal é a preservação da natureza, através do uso indireto dos recursos naturais e abrangendo as estações ecológicas, os monumentos naturais, os parques nacionais, os refúgios de vida silvestre e as reservas biológicas; e as unidades de uso sustentável que conjugam a conservação da natureza com o uso sustentável de parcela dos recursos ambientais, compreendendo áreas de proteção ambiental, de relevante interesse ecológico, as florestas nacionais, as reservas extrativistas, de fauna, de desenvolvimento sustentável e particulares de patrimônio natural.

A Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) do Caraça é um importante centro de educação ambiental e unidade de conservação com 11.233 hectares localizada aos pés da serra homônima, dentro dos limites da Área de Proteção Ambiental Sul da Região Metropolitana deBelo Horizonte. A reserva forma um importante corredor ecológico de extrema relevância com o Parque Nacional da Serra do Gandarela, criado na região em 2014. Acessível através da BR 381, sentido Vitória, para a visitação turística ou pedagógica de grupos é aconselhável o aluguel de ônibus, pois não há atendimento regular de linhas locais.

Nos tempos antes da chegada dos portugueses a região era habitada por indígenas. A região leste mineira, em áreas da bacia do Rio Doce era conhecida como “Mato Dentro” pela impenetrabilidade de suas matas e pelos temíveis botocudos, nome pejorativo dado aos aimorés, tribo com fama de antropofagia. Sua história remete à segunda metade do século XVIII, quando se refugiou na região, Carlos Mendonça Távora cuja família fora massacrada em Portugal por ordem do Marquês de Pombal. A motivação seria um atentado desta família contra a vida de Dom José I, rei português. Adotando o nome de Irmão Lourenço de Nossa Senhora, ele construiu um santuário barroco e um eremitério. Doou as terras ao Rei de Portugal, Dom João VI, mas quando de seu falecimento, as terras foram repassadas aos Irmãos Lazaristas.

No local funcionou um dos mais renomados colégios mineiros, por onde passaram ilustres políticos e intelectuais, entre eles, Afonso Pena e Arthur Bernardes, que chegaram à presidência do Brasil. O Colégio Caraça foi visitado por Dom Pedro I e por Dom Pedro II. Datado de 1820, o colégio funcionou até um incêndio acidental em 28 de maio de 1968 restando apenas ruínas, hoje transformadas num espaço cultural, formado por um museu com talheres de prata, porcelanas chinesas e objetos sacros em ouro, e uma biblioteca com um acervo raro composto por livros de 1500. O Santuário Nossa Senhora Mãe dos Homens, foi a primeira igreja em estilo neogótico construída no país, e apresenta as relíquias de São Pio Mártir, um soldado romano morto por assumir sua fé cristã. Elas chegaram ao Caraça em 1757 e foram presenteadas pelo Papa Paulo VI. Na igreja há o quadro “A Última Ceia” datado de 1827 atribuído ao Mestre Ataíde. Certamente, o cenário é único em termos de seu potencial pedagógico interdisciplinar.

Há lugares dos quais se obtêm excelentes vistas panorâmicas do entorno do Santuário do Caraça, como a Capelinha e o Calvário com imagens de gesso. Pode-se também contemplar a beleza das serras cobertas de campos rupestres, cerrados e mata atlântica e a pureza das águas cristalinas, formando um perfeito habitat natural de antas, jaguatiricas, lobos-guará, quatis, raposas, sagis, sauás, siriemas, tamanduás e tucanos de peito amarelo. Destacam-se na paisagem o Pico do Sol, com 2.072 metros, e o Pico do Inficionado, com 2.068 metros, ambos na Serra do Caraça, um dos caminhos para a gruta do Centenário, a maior gruta quartizítica do mundo, com 3.400 metros de extensão. A expressão tupi-guarani “caraça” se refere a uma silhueta natural, a “cara do Gigante”, adormecida nas verdes elevações e referencia visual no passado, para os muitos bandeirantes que por ali passaram em busca de ouro, prata e diamantes.Assim natureza e cultura se alternam num complexo emaranhado de paisagens educativas desses cenários entre as serras do Gandarela e Caraça.

 O local ideal para turismo ecológico e pedagógico proporciona vários passeios agradáveis, como as piscinas naturais da Cascatinha e da Cascatona, respectivamente com doze e cem metros de queda, as quedas d’água do Tanque Grande e da Região dos Taboões, o Rio Caraça e o Banho do Belchior, ambos com a prainha, a gruta da Bocaina, a Cascata da Bocaina com pedras em tom cor-de-rosa e piscinas naturais. Para aproveitar esses inúmeros e belos recantos guardados no Caraça, recheados de mistérios e surpresas, é possível se hospedar, pois o local dispõe de apartamentos e quartos, constituindo, assim confortáveis dormitórios, porém é proibido acampar. A alimentação também é disponibilizada em horários programados na cantina/restaurante. Ao educador que acredita na aula de campo interdisciplinar, o Caraça espera sua visita pedagógica. Certamente seus alunos se encantarão com a cultura e a natureza da região que entende múltiplos conteúdos da educação formal.


SABER MAIS

ANDRADE, Vagner Luciano de. LEITURA, PERCEPÇÃO E INTERPRETAÇÃO COMO ELEMENTO TEÓRICO-METODOLÓGICO EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS:Potencialidades interdisciplinares entre ecologia, geografia e história no Parque Natural do Caraça, Borda Leste do Quadrilátero Ferrífero, MG. Artigo de Conclusão de Curso – Especialização em Metodologia de Ensino de Ciências Biológicas. UNIASSELVI, Belo Horizonte, 2017

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