Memórias do passado: ajudando a compreender o futuro e o meu fazer pedagógico

Sonia Aparecida Bento

Escrever sobre meu trajeto escolar, relembrar esses momentos faz com que, de certa forma, eu possa reencontrar minha identidade, minhas raízes, valores e alguns dissabores também. Nasci em 16 de janeiro de 1982 em Guariba/São Paulo, mas logo meus pais se mudaram para Ivaiporã/PR, onde constitui toda minha infância e adolescência. Desde muito pequena frequentei a creche. Naquele tempo não era preciso ter qualquer formação para que se pudesse cuidar de criança. As creches serviam para que as mães pudessem trabalhar e ter onde deixar seus filhos, voltadas somente para alimentação, higiene e proteção das crianças. 

Com a ausência de políticas públicas, programas educacionais e a falta de docentes qualificados, no ano de 1988, a Constituição Federal foi aprovada pela Assembleia Nacional Constituinte e promulgada no dia 5 de outubro, durante o governo do presidente José Sarney. Conhecida como Constituição Cidadã, ela foi um grande marco. As creches e pré-escolas deixaram de ser organizadas com base em um modelo assistencialista, pois passaram a ser dever do Estado e foram inseridas no sistema de ensino, por meio da oferta da Educação Infantil.

Em 1989, aos 7 anos, ingressei na primeira série na escola Municipal Carlos Lacerda sendo constituídos, no âmbito político, meus direitos garantidos pela Constituição. No ano de 1993, já na quarta série, me deparei com uma mudança: meus pais estavam se deslocando de bairro, com isso, fui obrigada a deixar a escola. Mudamos para o Jardim Belo Horizonte, na mesma cidade, tive que me adaptar com novos professores, alunos e regras. Depois adentrei no Colégio Estadual Bento Mussurunga e concluí o 1º grau e, em seguida, o ensino médio no Colégio Estadual Barbosa Ferraz, no curso de magistério.

Sem perspectiva de realizar uma faculdade em minha cidade, em 2003, com 21 anos, tracei minha jornada para a cidade de Balneário Camboriú/SC, onde os desafios foram maiores do que imaginei. Tendo o trajeto escolar todo no ensino público, foi somente no ano de 2013 que ingressei na faculdade particular, onde em 2018 me graduei no curso de Psicologia. Trabalho na área e nesse intervalo concluí minha formação em Tanatologia. No ano de 2018, dei início a minha especialização em Arteterapia. 

Com o sonho de algum dia cursar uma Faculdade Federal, entrei em contato com o Instituto Federal Catarinense localizado no Município de Camboriú e, através do edital de Transferência Externa e Portadores de Diploma, dei início à minha jornada no curso de Pedagogia no ano de 2020. “Ironias do destino” à parte, nunca fui “fã” de cursos à distância e meu desafio começou justamente quando o Brasil e o mundo se depararam com uma pandemia que se alastrou muito rápido quebrando a economia e afetando diretamente o meio educacional, deixando muitos familiares enlutados e forçando as aulas presenciais a serem ofertadas de modo remoto, sendo desafiador tanto para os discentes quanto para os docentes. 

Com o Coronavírus se alastrando, no dia 17 de março de 2020 as aulas foram suspensas com o objetivo de diminuir os impactos causados: em meio ao caos, o que eu temia aconteceu, fui forçada a abandonar meus estágios da pós-graduação, atrasando a conclusão do curso. O mais desafiador tem sido dar continuidade à graduação de Pedagogia, mesmo com os professores se dedicando ao máximo no aspecto de nos apropriarmos dos conhecimentos do campo e, assim, constituirmos nossa identidade docente. Sinto falta do contato, do olho no olho, do abraço, daquele vínculo que só a presença física pode proporcionar. Esse distanciamento social afetou tanto o meio econômico, educacional e emocional, mas as atividades ofertadas de modo remoto me fizeram perceber que se pode aprender muito; consegui olhar o mundo com outras lentes, superei e, nesse mesmo ano, ouso iniciar uma formação em Libras. Tentando conciliar trabalho e estudo, pode me faltar tempo, mas me sobra coragem. 

Resta-me aceitar o que está disponível e encarar os fatos, na certeza de que mesmo remotamente estou conseguindo ter um ensino gratuito, laico e de qualidade. Expondo minha trajetória, vale dizer que mesmo meu currículo sendo “rico”, seja no ensino público ou privado, meu orgulho maior é ser filha de um pedreiro e uma cozinheira. Anoto: O meu maior e melhor currículo foi a educação e os conhecimentos que aprendi na infância vindo de meus pais. Mesmo sem muita educação escolarizada, a relação com o saber sempre foi muito intensa. Nenhuma formação poderá suprir o que meus pais me ensinaram, valores que recebi deles como herança. Finalizo afirmando o orgulho de ser educada em memória de meu pai, mas seguindo firme e apoiando minha mãe guerreira que sempre me ensinou que a vida pode ser bela mesmo nos piores momentos. 

Camboriú, fevereiro de 2021.

Texto escrito inicialmente como atividade avaliativa da disciplina História da Educação, do curso de Licenciatura em Pedagogia do Instituto Federal Catarinense – campus Camboriú, ministrada pela Profa. Dra. Marilândes Mól Ribeiro de Melo. 

1Estudante do curso de Licenciatura em Pedagogia do Instituto Federal Catarinense.


Imagem de destaque: jarmoluk / Pixabay

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