Memórias norte-mineiras e formação de professores: criação da Escola Normal de Porteirinha – Wilney Fernando Silva

Memórias norte-mineiras e formação de professores: criação da Escola Normal de Porteirinha

Wilney Fernando Silva

Constituindo um espaço institucional, as escolas normais, instaladas no Brasil desde o século XIX, concederam uma grande importância à política de formação de professores. No norte de Minas Gerais, em especial, a Escola Normal de Porteirinha foi instalada em 1964, pelo Decreto Estadual n. 3.284, no período político conturbado da tomada do governo pelos militares e a decretação do Ato Institucional nº 1. O projeto para a sua instalação foi bastante disputado, fazendo parte dos interesses e do jogo político regional, pois mais cinco municípios queriam a construção desta escola em suas cidades. O município de Porteirinha foi escolhido pela combinação de dois fatores: graves carências sociais e escolares que assolavam a região e por situar-se no centro geográfico da área mineira da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE). A escola, desta maneira, poderia servir à formação dos professores pertencentes a toda região do extremo norte de Minas Gerais e até mesmo de municípios da Bahia.

A criação da Escola Normal se deu num momento marcado por forte idealização da educação que se caracterizou por uma crença no poder desenvolvimentista. Para Alcides Mendes da Silva, prefeito municipal da época, a principal causa do atraso e do subdesenvolvimento no país residia na falta de uma economia forte. Alcides Mendes da Silva foi uma das figuras centrais para a instalação da Escola Normal. No decorrer dos tempos, trabalhando como comerciante e fazendeiro, tornou-se um dos chefes políticos mais poderosos da região. Possuía à sua volta um grupo que o auxiliava para que a escola fosse instalada no município.

Observando-se a estrutura da Escola no momento de sua criação em 1964, podemos perceber a relação entre a experiência local e o projeto maior de direção político-educacional. Com os dados que puderam ser reunidos, foi possível observar que a trajetória da Escola Normal de Porteirinha foi importante no sentido de formar os professores leigos, de capacitá-los profissionalmente para atuar nas diversas escolas da região norte-mineira. Conforme o primeiro Regimento Interno os pretendentes à matrícula na primeira série do curso ginasial tinham que se submeter aos Exames de Admissão, que consistiam em testes para o ingresso. Para matricular-se, era necessária a apresentação de documento que atestasse a vacinação antivariólica e tifo, além da comprovação da conclusão de curso primário ou atestado idôneo de haver o candidato recebido satisfatória educação primária.

O capítulo XVIII do Regimento trata do Currículo e número de aulas. O seu artigo 42o reza que “o currículo e o número de aulas semanais das disciplinas e prática educativas, para o curso secundário, são os constantes dos anexos do presente Regimento”. O currículo adotado pelo estabelecimento só poderá ser modificado pela direção e só poderão prevalecer as modificações no ano seguinte, com prévia aprovação do Conselho Estadual de Educação. Já o capítulo XXIII, que baliza o assunto referente ao uso do livro didático, expressa que: “É livre aos professores a escolha dos livros didáticos para adoção em suas classes”, porém esta “liberdade” ficava dependente do aval do diretor, que julgava se os compêndios não feriam os “bons costumes morais, religiosos e pedagógicos”. O artigo deflagra a figura do Diretor Escolar enquanto aquele que detinha o poder interno na instituição e era responsável pela guarda dos “bons costumes”. Para garantir a unidade da formação cultural, moral e técnica dos alunos, os professores da mesma disciplina, lecionada em séries idênticas do mesmo curso, deveriam adotar o mesmo livro. Os alunos, ao final da formação, deveriam ser submetidos a uma prova constando de exames orais e escritos que atestassem sua competência técnica para o exercício da docência, uma espécie de prova de conclusão de curso.

A Escola Normal de Porterinha foi uma das últimas escolas normais a serem construídas. De 1964 para cá, mudou sua denominação quatro vezes e teve que se adaptar às inúmeras reformas político-educacionais. Finalmente, ao analisar a história desta Escola Normal e rememorar os atos da sua criação, descatam-se, sobretudo, a importância da instituição enquanto formadora de professores, além de ser uma instituição que colocou em prática o projeto político de dirigentes do município, de Minas Gerais e da Nação.

Wilney Fernando Silva – Professor do Instituto Federal do Norte de Minas Gerais. Doutorando em Educação pela Universidade Federal de Uberlândia

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