Gestão escolar pode ser terceirizada na cidade de São Paulo  

Edilson da Silva Cruz 

Administrar uma escola é uma tarefa complexa de gestão de pessoas e gestão de recursos materiais, da qual depende em parte o êxito do trabalho educativo. Na escola pública, o princípio da gestão democrática exige considerar sujeitos do processo educativo todas e todos que convivem na escola: estudantes, professores, gestores, funcionários, pais e comunidade.

Tal complexidade exige colocar no centro o pedagógico e considerar a dimensão administrativa do ensino. Por isso, é tarefa para educadores, devidamente habilitados, em cursos de Licenciatura e/ou Pedagogia, contratados via concurso público e escolhidos de modo transparente. Ora, é justamente essa realidade – escolas públicas geridas por profissionais devidamente habilitados e contratados para isso, de forma direta – que está em xeque no sistema municipal de ensino da cidade de São Paulo, graças a um projeto de lei que está tramitando na Câmara dos Vereadores, com a cumplicidade vergonhosa da gestão Ricardo Nunes (MDB). Trata-se de uma tentativa de ampliar um modelo de terceirização que já é hegemônico na educação infantil da cidade.

O PL 573/21 (1) prevê entregar a gestão de escolas municipais para OSs, dotando-as de autonomia para “estruturar a matriz curricular, o projeto político pedagógico, as metodologias de ensino e organização escolar, assim como os materiais pedagógicos da escola assistida”. Chamado de “gestão compartilhada”, esse modelo prevê também que as OSs possam “montar e gerir o time de professores, diretores, vice-diretores e secretário escolar”. Atualmente, o PP, conforme legislação federal e municipal, é elaborado pelos educadores das escolas, em diálogo com a comunidade, considerando a autonomia das instituições e o Currículo da Cidade. Os gestores – diretores, assistentes, coordenadores pedagógicos – são escolhidos via concurso público de acesso.

Em sua justificativa, o projeto, apresentado pelos vereadores Rubinho Nunes (União Brasil), Cris Monteiro (Novo) e Sandra Santana (PSDB), afirma que não se pretende provocar mudanças “na natureza administrativa das escolas, que permanecem públicas e gratuitas, integrantes da rede municipal”. O objetivo seria “a melhoria da qualidade do ensino a partir de um novo modelo de gestão, buscando diferentes estratégias para a implementação de uma grade curricular mais aberta ao pluralismo de ideias e concepções pedagógicas.”

Curiosamente, os princípios nos quais se baseiam a proposta – garantia de acesso, foco no aluno, ambiente educativo atrativo, estímulo a boas práticas, fortalecimento da sociedade civil – são obrigações já delimitadas no Plano Municipal de Educação e garantidas com o atual modelo de gestão, que prevê, além de concurso de acesso e estabilidade aos gestores escolares, também um PPP organizado pela escola em diálogo com a comunidade, a gestão compartilhada com o Conselho de Escola, o qual tem representação paritária entre servidores e membros da comunidade.

Sindicatos, profissionais da educação e parlamentares progressistas têm trazido à tona as contradições deste projeto. O SINPEEM (Sindicato dos Profissionais em Educação no Ensino Municipal de São Paulo) lembra que, anualmente, mais de 2 bilhões de reais são repassados às OSs que geram creches na cidade, as quais são maioria em relação às instituições diretas (2). No entanto, do ponto de vista da gestão, as terceirizadas deixam a desejar. O vereador Celso Gianazzi (PSOL) lembra que muitas dessas instituições carecem de estrutura física básica e os profissionais trabalham por mais horas e por um salário menor, em relação aos pares concursados da rede direta (3).

O mesmo vereador lembra que o modelo é um prato cheio para as “máfias” que já são investigadas na Educação Infantil, tendo o nome do atual prefeito, Ricardo Nunes, envolvido em denúncias de mau uso dos recursos públicos. A Prefeitura diz que “respeita a independência do poder Legislativo e que vai esperar a deliberação dos vereadores.” (4). Ou seja, supostamente “lava as mãos”.

O Sindsep (Sindicato os Trabalhadores na Administração Pública e Autarquias no Município de São Paulo) lembra que a terceirização já é uma realidade há décadas na educação fundamental paulistano, atingindo, até então, setores menos centrais do trabalho escolar: “Primeiro a cozinha, depois a limpeza e agora a gestão. Qual o próximo segmento a privatizar?” (5). O SINESP (Sindicato dos Especialistas em Educação do Ensino Público Municipal de São Paulo) questiona o suposto objetivo de “melhorar a qualidade do ensino” quando, na verdade, o projeto significa “dar o controle das verbas públicas da educação para entidades privadas e possibilitar que muitos negociem e barganhem com elas.”.

Como trabalhadores e pesquisadores da educação, cabe a todos nós, da cidade de São Paulo e também de outros lugares do Brasil, acompanhar esta discussão que pode significar um golpe fatal no princípio constitucional da gestão democrática e nas conquistas históricas acumuladas pelos educadores municipais em São Paulo, através de muitas lutas e mobilizações. Nas próximas semanas, esta coluna irá se aprofundar na crítica necessária a este projeto de lei, visando ampliar a concepção crítica a respeito.


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