Rômulo Radicchi
Vagner Luciano de Andrade
As águas límpidas são essenciais para que tenhamos uma boa qualidade de vida. Por meio delas, encontramos uma forma de hidratação e podemos aproveitá-las nas atividades diárias básicas. Por se enquadrarem como mananciais de água doce no Brasil carecem ser conservadas, uma vez que esse bem é insuficiente e, embora seja renovável, corre o ímpeto de faltar. No entanto, muitos cursos d’água se transformam em canais poluídos, gerando conflitos socioambientais para o ecossistema de lagos ou rios. Isso ocorre em função de vazões de esgotos, sem o devido tratamento, gerados pelas mais variadas atividades humanas.
A ausência de investimentos em saneamento básico pôs o Brasil em uma conjuntura crítica com relação a essa temática, com mais da metade do esgoto originado pela população, sem tratamento. O esgoto doméstico é mesclado por água (99%) e sólidos (1%). Esses rejeitos sólidos são, em sua maior parte, compostos por matéria orgânica em decomposição, gerada por fezes e atividades humanas em chuveiros, máquinas de lavar, pias, tanques, entre outros (detergentes, sabonetes e shampoos). Quando vazado nos rios sem tratamento, ele transforma o arranjo natural daquele ecossistema, acarretando agravos para a fauna e a flora aquática e para os seres humanos que habitam no entorno.
De acordo com o Instituto Trata Brasil, 35 milhões de pessoas não têm fornecimento de água potável em seus domicílios. Em muitos desses casos, a água é coletada e consumida diretamente dos rios, estando corrompidas pelo descarte inadequado do lixo e pelo esgoto sem tratamento das urbes, por exemplo. Essa ausência de saneamento promove a proliferação de doenças, especialmente entre crianças e idosos, que apresentam uma saúde mais fragilizada. Isso acontece quando a água dos rios não passa pelo devido tratamento, expondo elevadas quantidades de poluentes e de agentes biológicos que causam doenças, compreendendo bactérias, vírus, e parasitas.
Para se ter uma ideia, conforme relatório publicado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), quase 1,5 milhão de crianças falecem anualmente em consequência de diarreia em todo o mundo. E 88% desses óbitos poderiam ser impedidos com coleta e tratamento de esgoto e acesso à água tratada – ou seja, os serviços de saneamento básico. Outras doenças ocasionadas pelo contágio da água por esgoto são cólera, febre tifoide, hepatite A, infecções bacterianas e leptospirose. Além do conflito na saúde e bem estar das pessoas, elas custam muitos recursos financeiros ao Sistema Único de Saúde (SUS).
Sem equívoco, a carência de saneamento básico, notadamente os baixos índices de tratamento de esgoto, é um das maiores dificuldades socioambientais hoje em dia, ao lado do desmatamento. De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), cerca de 100 milhões de brasileiros convivem com a falta da coleta de esgoto e residem com os esgotos escoando a céu aberto, o que, além de infectar o solo, é fonte de graves patologias.
Ao desembocar nos rios, o esgoto muda toda a composição química da água, impactando inteiramente a vida aquática. Isso ocorre porque a acumulação de matéria orgânica propicia o aparecimento de micro-organismos que diminuem a abundância de oxigênio na água, danificando absolutamente a vida aquática e a qualidade dessa água. Além disso, os nutrientes existentes no esgoto, com proeminência para nitrogênio e fósforo, provocam a eutrofização, que é uma ação de proliferação de algas que se empilham na superfície do rio.
Dessa forma, a luz solar não penetra para o interior das águas e as plantas presentes no rio não realizam a fotossíntese, enfraquecendo a concentração de oxigênio. Assim, os animais expiram e o número de micro-organismos acresce, transformando todo o ecossistema.
Projeto Manuelzão: revitalização das bacias hidrográficas
Foi pensando nas águas poluídas, na saúde pública e no meio ambiente que surgiu no final da década de 1990, o Projeto Manuelzão. Dentre os cinco fundadores está o Professor Antônio Radicchi. Antônio Leite Alves Radicchi nasceu em Belo Horizonte/MG em 08 de agosto de 1954 e faleceu em 13 de novembro de 2017, vítima de violência urbana, durante um assalto à linha de ônibus 9805 (Renascença/Santa Efigênia), enquanto se dirigia para o trabalho. Médico pela Faculdade de Medicina da UFMG (julho de 1979) – FM/UFMG. Doutor em Medicina Social e Preventiva pela Universidade de São Paulo – USP. Professor Titular do Departamento de Medicina Preventiva e Social da Faculdade de Medicina da UFMG (DMPS/FM-UFMG) de julho de 1980 a novembro de 2017. Atuou no ensino de graduação e de pós-graduação, especialmente no Internato em Saúde Coletiva /Internato Rural e no Programa de Mestrado Profissional em Promoção da Saúde e Prevenção da Violência do DMPS/FM-UFMG. Foi um dos fundadores do Projeto Manuelzão (1996) da UFMG, que articula ações de saúde pública, meio ambiente e cidadania na Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas. Representante da sociedade civil no Conselho Municipal de Saneamento de Belo Horizonte. Professor da disciplina Saúde e Ambiente do Curso de Gestão de Serviços de Saúde da UFMG. Coordenador do grupo de pesquisa Ar e Saúde. Cidadão honorário do município de Várzea da Palma/MG. Após sua morte, recebeu as seguintes homenagens: dá nome à sala dos professores da disciplina do Internato em Saúde Coletiva/Internato Rural; ao Núcleo de Promoção da Saúde e Prevenção da Violência do DMPS/FM-UFMG; Diploma de honra ao mérito in memoriam da Câmara Municipal de Belo Horizonte (vereador Juliano Lopes).
Para saber mais
https://blog.brkambiental.com.br/problemas-causados-pelo-esgoto/
https://ufmg.br/comunicacao/noticias/camara-de-bh-homenageia-professor-antonio-radicchi
Imagem de destaque: Foto Portal Nescom – UFMG