Ecologia humana enquanto morada do ser e do s(ab)er: estudos bioculturais como pressupostos na educação básica

Vagner Luciano de Andrade

Não tem nada mais claro e evidente que o ano de 2019 como um marco histórico no que se refere às políticas socioambientais brasileiras, para muito para além dos absurdos e retrocessos nas diferentes áreas da coletividade. Num plano maior, cito desastres nos quais, o meio ambiente e as relações humanas formataram o inicio de um pesadelo: a tragédia de Brumadinho, a questão das queimadas na Amazônia e do derrame de óleo nas praias do Nordeste. Porém, o que mais assombrou em 2019, foram as questões socioambientais tratadas de forma mercantilista, com seres e saberes ignorados. Até agora, vamos por nós mesmos, tentando entender o inconcebível: o golpe miliciano se instaurou e a democracia se desfaz, cotidianamente. Desconsertados seguimos, como perdidos numa névoa ou nevasca. O que houve é assustador: antagonismos e desigualdades historicamente vencidos, voltaram a perambular. Quantas histórias assombrosas nos cercam todos os dias, nos tirando o fôlego, desmotivando e protelando sonhos de uma sociedade mais justa e fraterna. Mais porque, muitas vezes, pensamos nos abismos do dia após dia, sendo que parcela da população nada percebe, por normalmente assimilar e aplicar coisas que o paradigma vigente impõe como absolutamente normais. Eis o processo capitalista neoliberal que usurpa, manipula, escraviza e destrói. Algo soa como uma alienação coletiva, em discursos ideológicos nocivos e na maioria das vezes, anestesiantes, pois não nos damos conta do quanto ainda somos marionetes do sistema.

Múltiplos analfabetismos, pois é comum dizer que futebol, política e religião não se discutem. Pensar o ano de 2019 é verificar que ele se potencializa demais agora em 2020, através das tratativas anti-ecológicas, da desconstrução dos direitos das mulheres, dos indígenas, dos negros e quilombolas, dos homoafetivos. E diversidades que se evidenciaram antes do Golpe de 31 de agosto de 2016, evaporaram quando a verdadeira democracia caiu e a mentira, a opressão e a manipulação se fizerem fétidas lápides a exalar os odores de uma minoria elitista, conservadora e criminosa. Anulação, intolerância e intimidação pra extirpar aquele que se opuser. Parecem que todos, sem excessão, foram adestrados e adesivados por ideologias incompatíveis com a justiça e equidade. Numa projeção que varia do local ao global e do individual para o coletivo temos que nos libertar, emancipar, protagonizar. Sobretudo, pensar numa Ecologia Humana, enquanto morada do ser e do saber. É preciso saber que se sabe numa nova diretriz societária de resistência e revolução. Sejamos mais do que praticantes, exímios vigilantes daquela “velha opinião formada sobre tudo” que se impõe através do fanatismo e da coersão.

Quando me refiro à questão socioambiental, a tentativa é de situar uma questão mais próxima do cotidiano das pessoas conectadas as suas realidades, à cronologia do seu dia a dia. Entendo como práticas ecológicas, algumas que fazemos, dia após dia, tentando reaprender a Ecologia do ser humano, em sua essência. É preciso dizer que laços entre seres humanos e meio ambiente foram rompidos e a reconstrução dessas conexões simbólicas é um processo bastante complexo, indispensável à educação. Vejo com esperança que algo pode ser feito no sentido da recuperação de uma consciência verdadeiramente ambiental, na qual o ser humano se conecte consigo mesmo, com o próximo, e com a biodiversidade. Certamente é a ecologia planetária, um diálogo, um exercício grande e complexo, mas sem o qual não se fundamentaria, sem as premissas da educação. O homem se rompeu, mas, é possível reestruturar os caminhos na construção de uma sociedade melhor, mais igualitária, mais fraterna. Livros para pensar e não armas para matar, florestas para preservar e não queimar. Enfim, conquistas a se apropriar, socializar e legitimar.

Nas cidades, o homem se reinventa e busca a ancestralidade perdida, a ecologia humana iniciando uma busca pelo ser e pelo saber, através dos elos ecológicos perdidos. É o pensar que move essas práticas cotidianas que tecem a vida de inúmeras pessoas para a mudança. E o mesmo homem que desmata florestas é o mesmo que abandona e maltrata animais nos centros urbanos. É o mesmo que adota um animal doméstico, ou planta árvores. É nesse ponto em que se inicia um processo significativo, cujas práticas ancestrais são cultivadas com esmero. No educar, está a busca pela essência das coisas. Então uma educação ecológica, ao mesmo homem são devolvidos elos perdidos, que ressignificados ofertam novos sentidos. A Ecologia humana é aquela que vai ao encontro do ser/saber, consigo mesmo e com sua verdadeira essência educativa. É a sua maior verdade, quando ele repensa a prática antiética, a lógica do dia a dia no sentido de ressignificar e de dar novas conotações ao corriqueiro, produzindo um significado verdadeiramente existencial. A prática de um homem pensador é um novo sentido e a materialização de uma pessoa ativa e genuinamente contribuinte para reconquistar a ordem societária e inovar beneficamente a Humanidade.


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