E as aulas começam

Ivane Laurete Perotti

 

Professora… de boa! Como esse homem conseguiu escrever sobre tantas coisas que a gente pensa e não consegue dizer? (fala de um aluno do 1º ano, ensino médio, escola pública, acerca de Fernando Pessoa).

Na boa, não sei! Imagino que ele tenha se permitido sentir – tartamudeei enquanto risos ecoavam pela sala apertada. Já antecipando a polissemia elástica do verbo sentir em espaço tão rico na verborragia, preparei-me para a torrente de palavras visceralmente sensualizadas.

–Rimos? Ele levantou uma questão poderosa!

–Rimos de você, professora!

–… ah?!

–Não é na boa… é de boa!

–Claro! Tá suave!

Gargalhadas! Fernando Pessoa cedia um espaço para a Língua Portuguesa Brasileira entrar em sala na abundante manhã de junho:

Temos, todos que vivemos

Uma vida que é vivida

E outra vida que é pensada,

E a única vida que temos

É essa que é dividida

Entre a verdadeira e a errada.

Qual porém é verdadeira

E qual errada,

Ninguém nos saberá explicar;

E vivemos de maneira

Que a vida que a gente tem

É a que tem que pensar.

(Fernando Pessoa, em Cartas a Armando Côrtes-Rodrigues)

Quando pensamos ter pouco, temos muito: a oportunidade de pegar no laço o momentum de produzir linguagens nas ações de língua portuguesa brasileira acontece assim. E por assim, diz-se do continuum processo constituidor de nossos espaços sociais. Quem fala, do lugar que fala, não se ausenta do/no ato de falar/pensar/sentir/identificar/produzir/escrever/dizer/ser: somos as palavras que vão e vêm na tábula das experiências vividas em contratos mais ou menos des/acordados. Somos o verbo que nem sempre cabe nas salas preparadas para as aulas de aprender/ensinar língua. Uma língua? Quantas línguas? Um rio em cheia corre voraz pelas veias de nossa identidade linguística. Sujeitos enamorados pela vida cultuam as possibilidades de pensar além do posto.

–Que posto, professora? Cabô o combustível, fragra?

–O que é tábula?

–Ela disse rábula!

Véi… isso daí é outra coisa, mano!

–Qual é? Aquilo é…

–Ó, psora! Dá prá voltar pru homem do chapéu?

–Não precisa , prá isso… mané!

–Mas… ela que falô em namorá, tá ligado!

–…

Estamos todos ligados, sem exceção, a Fernando Pessoa. Revestimo-nos de outros espaços para compor novos Aurélios de Campos, Albertos Caeiro, Ricardos Reis neste teatro de tantas cenas incompletas. Talvez, no espaço das eternas aprendizagens, pudéssemos pensar em não perder o laço: laçaço?

–Tope de fita, pró!

–Fifa? nessa…


Referências:

PESSOA, Fernando. Cartas a Armando Côrtes-Rodrigues. Introdução de Joel Serrão, Lisboa: Editora Confluência, (s.d.). In: BERALDINELI, Cleonice. Fernando Pessoa: Antologia Poética:organização, apresentação e ensaios.1ª edição, Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2012.

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