Uma questão que traz inquietações para todos aqueles que atuam profissionalmente na educação superior diz respeito ao futuro das universidades. Assumir como tarefa uma reflexão sobre esta instituição constitui-se em um exercício para produzirmos novas interrogações sobre a formação humana, em seus variados dilemas e complexidades. No contexto brasileiro esta questão se torna mais problemática à medida em que nossas instituições, em sua maioria, ainda não completaram um século de existência. Considerando que as universidades precisam pensar a formação humana à luz das demandas do seu tempo, poderíamos interrogar: que sentidos de formação humana atualmente predominam? Quais conhecimentos e saberes profissionais são privilegiados? Como tais experiências são organizadas no interior dos processos formativos que ocorrem nesta instituição?
Em obra recente, intitulada “Da Universidade à Commoditycidade”, Lucídio Bianchetti e Valdemar Sguissardi trazem importantes contribuições para compormos um quadro de interrogações. Os reconhecidos pesquisadores brasileiros propõem-se, nesta obra, a descrever o processo de constituição das instituições de ensino superior de nosso país sinalizando para um deslocamento importante: da instituição preocupada em preservar e ampliar as fronteiras do conhecimento para um cenário de “mercadorização” da formação humana.
Para os processos contemporâneos, os autores lançam mão de um neologismo, qual seja: “Commoditycidade”. Derivado de commodity, conhecida expressão do campo econômico, o neologismo remete-se a um contexto em que “as instituições privadas de educação superior – em especial as particulares ou mercantis – vão tornar-se protagonistas de uma expansão quantitativa de instituições e matrículas sem precedentes, e de uma transformação essencial na definição e funcionamento da universidade/educação superior”.
Concordemos ou não com o diagnóstico apresentado pelos pesquisadores, algumas inquietações, em nossa leitura, poderíamos colocar em nossas agendas com certa atitude de vigilância: 1) a universidade precisa seguir preservando o pluralismo de ideias e a diversificação metodológica; 2) a universidade não é uma agência de desenvolvimento, seus efeitos de inovação derivam-se do conhecimento que preserva e transforma; 3) ainda que continue sendo um espaço de ensino e certificação dos indivíduos, sua agenda formativa é global; 4) públicas ou privadas, corporativas ou comunitárias, as universidades devem zelar pelo “cultivo da humanidade”, como relembra-nos a filósofa Marta Nussbaum.
Enfim, as interrogações sobre a formação humana que ocorre nas universidades permitem-nos problematizar as formas de organização dos currículos dos cursos, assim como as articulações entre ensino, pesquisa e extensão. Tenho a compreensão de que esta instituição precisa atualizar-se aos dilemas do século XXI; todavia, concordamos com Bianchetti e Sguissardi que o melhor caminho não se encontra na formação/mercadoria adquirida por um aluno/cliente. Junto a filósofa Marta Nussbaum parece necessário defender o conceito de “cidadania inteligente” como vetor da organização de novas experiências formativas na universidade. Vale ressaltar, para finalizar este texto, que três eixos estruturariam este conceito, quais sejam: saber científico, relação com o mundo e construção de uma cultura democrática. Que as universidades deste século, ao preservarem as demandas dos indivíduos e dos variados grupos sociais (e profissionais) não abdiquem de currículos que fortaleçam nossa humanidade!
Imagem de destaque: Andre Hunter / Unsplash www.zp-pdl.com zp-pdl.com www.otc-certified-store.com