Diários na EJA: “Narrativas de Si, Poesias do Eu” recebe Prêmio no 25º Encontro de Extensão da UFMG

Manuela Lopes Silva
Juliana Ferreira de Melo

Entre os dias 17 e 21 de outubro de 2022, ocorreu a 31ª Semana do Conhecimento da UFMG, que reuniu trabalhos produzidos por estudantes, docentes e servidores técnico-administrativos da nossa Universidade. Entre os 627 trabalhos inscritos no 25º Encontro de Extensão, 16 foram premiados como Destaque na Cerimônia de Encerramento do evento.

O trabalho “Narrativas de Si, Poesias do Eu” do Centro Pedagógico (CP/UFMG) foi um dos premiados como ‘Destaque de Extensão’, entre os quatro que receberam o Prêmio na área da Educação. Ele teve como objetivo a leitura e a escrita de diários, realizadas com a Turma de Iniciantes do Projeto de Ensino Fundamental de Jovens e Adultos – 2º Segmento (PROEF-2), na Escola, no primeiro semestre de 2022.

O projeto foi baseado na importância do ato de ler e escrever (FREIRE, 1982) como ferramenta que estimula o autoconhecimento, a leitura e a compreensão da realidade, o reconhecimento de si como sujeito histórico e social. Assim, o gênero textual diário foi explorado de forma interdisciplinar nas aulas de História, Língua Portuguesa, como também nas oficinas de Alfabetização e Letramento, por meio da leitura compartilhada e da interpretação da obra: “Quarto de Despejo – diário de uma favelada” (1960), de Carolina Maria de Jesus (1914-1977). Também foram promovidas discussões sobre a trajetória de vida da escritora, bem como a respeito do contexto histórico e social vivido por ela. Além disso, a apropriação do livro de Carolina Maria de Jesus foi acompanhada pela produção dos educandos de seus próprios diários pessoais.

A escolha da obra ocorreu devido às suas convergências com a EJA, à atualidade das temáticas aí abordadas, além da nossa hipótese, segundo a qual conhecer a vida e a obra de Carolina Maria de Jesus possibilitaria, aos educandos, o fortalecimento de suas identidades, a inspiração para a produção de seus próprios diários, bem como para seguir com sua escolarização no PROEF-2. Dessa forma, ao lerem “Quarto de despejo”, nossos educandos perceberam como a trajetória da autora se assemelha, em diversos aspectos, com os seus próprios percursos.

Com a realização do projeto, foi possível perceber que a leitura da obra serviu como motivação e referência para os educandos. Ao lerem o diário de Carolina, identificaram-se com a escritora e sentiram-se capazes de traçar (não somente no papel) seus caminhos, valorizando a bagagem cultural que carregam. Com trajetórias semelhantes a da autora, nas quais o Direito à Educação lhes foi negado durante anos, o estudo da obra promoveu, em sala de aula, debates sobre desigualdade social, racial e de gênero, maternidade, trabalho, segregação e consequências da escravidão – temas abordados no livro e presentes na vida dos estudantes da EJA. A escrita dos diários realizada pelos estudantes possibilitou reflexões sobre si, seus sentimentos, suas trajetórias e vivências, o desenvolvimento do autoconhecimento, da autoconfiança, da capacidade de observação cuidadosa na direção do olhar crítico sobre a realidade, das habilidades de escrita e da criatividade. Os educandos relataram que o contato com os diários foi transformador. Os resultados dessa experiência evidenciaram que o projeto despertou nos educandos o desejo pela transformação de sua própria realidade.

Dessa forma, acreditamos que o fato de este trabalho ter recebido o Prêmio de Destaque no 25º Encontro de Extensão na 31ª Semana do Conhecimento de nossa Universidade, em 2022, “UFMG, 95; Brasil, 200: interseções”, às vésperas das eleições presidenciais, nas quais tivemos a oportunidade de optar por um Projeto de Nação a favor do Povo Brasileiro e contra a barbárie, é de extrema importância. Representa, reconhece e valoriza a luta de uma população que teve e tem, reiteradamente, historicamente, seus Direitos básicos negados, atacados. A premiação de nosso trabalho evidencia que, diante da constante negligência e marginalização que os mais pobres têm sofrido, sem dúvidas, será, em espaços de construção do conhecimento científico, que resistiremos e seguiremos com a batalha pelo Direito Constitucional à Educação, pública, gratuita e de qualidade. Com isso, agradecemos aos educandos e às educandas da Turma de Iniciantes do PROEF-2, que, com sua dedicação e sabedoria, tornaram possível a riqueza deste trabalho.

Sobre as autoras
Juliana Ferreira de Melo é doutora e mestre em Educação pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), com estágio de doutoramento na Université Paris Ouest, Nanterre La Défense (Paris X) e estágio pós-doutoral na Universidad Nacional de La Plata. Licenciada e bacharel em Letras também pela UFMG, atua como professora de Língua Portuguesa no Centro Pedagógico desta universidade, onde integra o Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Cultura Escrita e o Centro de Pesquisa em História da Educação.

Manuela Lopes Silva é graduanda em Pedagogia pela Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais (FaE-UFMG). Atua como Articuladora Pedagógica no Projeto de Ensino Fundamental de Jovens e Adultos – 2º Segmento (PROEF-2). Já trabalhou como estagiária na Miguel Arcanjo Escola Waldorf, monitora de Educação Ambiental no Programa Estação Ecológica (PROECO) e integrou o Grupo de Astronomia da UFMG.

Para saber mais
FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler em três artigos que se completam. 2.ed. São Paulo: Cortez Editora & Autores Associados, 1982.

JESUS, Carolina Maria de. Quarto de despejo – diário de uma favelada. São Paulo: Francisco Alves, 1960.


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