Desigualdades sociais, Juventude(s) e ENEM: o alargamento do nível de escolaridade entre os jovens

Marcos Rogério dos Santos 

Nos últimos tempos a juventude tem sido foco de uma série de reflexões que se esforçam para compreendê-la em suas diversas dimensões. Áreas de expertise como a Psicologia e as Ciências Sociais têm empreendido esforços analíticos bastante significativos para o entendimento do conceito e da pluralidade de jovens. O mote das análises busca transcender os critérios biológicos e etários até então utilizados nas definições de juventude.

As novas perspectivas partem do pressuposto que juventude é uma construção social e cultural, o que significa dizer que cada época, lugar e cultura produzem uma noção de jovens. Essa constatação ganha maior relevância quando nela se entrelaçam questões de classe social, raça/cor, gênero, profissionalização, trabalho, religião, cultura, identidade, uso de tecnologias e, sobretudo, acesso e permanência na escola. São temas que ganham maior notoriedade num Brasil, como descreveu Darcy Ribeiro, tão repleto de “brasis”. Assim, apenas para ilustrar, ser um jovem, negro, trabalhador assalariado no Brasil e não ter acesso às diferentes formas de tecnologias é uma experiência bastante diferente de ser jovem, branco, estudante e que não necessita trabalhar para prover seu sustento ou de sua família. São condições que permitem experienciar a juventude sob as mais diversas circunstâncias sociais e culturais.

Hodiernamente, há o entendimento entre pesquisadores que o advento da pandemia e seus desdobramentos, além de evidenciar desigualdades, releva mações de diferentes ordens que contribuem para a manutenção e reprodução das desigualdades sociais existentes. No que amplia o quadro de diferenciação escolar entre os jovens, a insistência do poder público na realização do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) é vista como uma forma de naturalizar o opus operatum, de uma estrutura estruturante, que faz do mérito um dos condicionantes sociais capaz de delegar aos jovens diferentes destinos na esfera social.

É inegável que todos os terceiranistas que farão o ENEM sejam, de alguma maneira, afetados pela suspensão das aulas presenciais, mas são aqueles em situação de maior vulnerabilidade social que se afastarão ainda mais da porta de entrada do ensino superior. Estima-se que 81,7% dos candidatos ao ENEM sejam oriundos de escolas públicas, ou seja, um grupo social com características bem demarcadas, diferente, por exemplo, dos candidatos provenientes de escolas particulares.

A realização do ENEM ao final de um ano letivo em que as aulas foram oferecidas remotamente, num contexto em que parte dos estudantes não tem computador, celular ou acesso à internet, certamente contradiz uma das principais finalidades do exame, ou seja, a democratização do acesso ao ensino superior. Cabe destacar que o ENEM é uma avaliação classificatória e baseada no mérito. Portanto, exigir uma preparação adequada em meio ao cenário atual é injusto e poderá excluir ainda mais os jovens pobres do acesso às universidades. Essas são algumas das disparidades que se alargam quando consideramos a mediação das atividades remotas, à distância, e os fatores ligados à sua mínima execução junto aos jovens que estão se preparando para a realização do ENEM.

Em suma, a realização do ENEM não apenas nega a centralidade atribuída à educação escolar nos projetos modernos de Estado-Nação, de onde provém a recomendação deque cada nação deveria promover formação à sua juventude, mas reforça a naturalização de uma sociedade desigual e cada vez mais desigual. O ideário de que a educação deveria sanar urgências de realidades sociais, que historicamente têm distribuído bens materiais e imateriais de modo desigual, notadamente tem perdido espaço para a promoção de desigualdades múltiplas e cada vez mais toleráveis.


Imagem de destaque: Marcos Santos/USP Imagens

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