Conflitos na conservação da água em paisagens minerarias

Charles de Oliveira Fonseca*

Vagner Luciano de Andrade

A maior cidade do país, São Paulo, com seus mais de doze milhões de habitantes, apresenta sérios problemas de racionamento e desabastecimento de água potável. Além de duas grandes represas ao sul – Billings e Guarapiranga –, a capital paulista dispõe de outros meios de captação, tratamento e distribuição. Ao norte da Grande São Paulo, encontra-se o Manancial da Serra da Cantareira, na qual unidades de conservação protegem nascentes e corpos d’água que encherão inúmeras barragens naquela região. No Brasil, outras grandes metrópoles sofrem com a questão da segurança hídrica, mas há cidades que contam com água da melhor qualidade. Em algumas partes do mundo, a água potável representa um conflito geopolítico de dimensões e gravidades assustadoras. A água é indispensável à sobrevivência e evolução de todas as formas de vida, bem como agente modelador da crosta terrestre, tendo efeitos diretos no clima. O homem deveria gerir sabiamente este precioso recurso natural, porém não o tem feito. Quando se fala em mananciais públicos direcionados ao atendimento da Região Metropolitana de Belo Horizonte algumas palavras-chave, como preservação e sustentabilidade, se fazem necessárias, porém obsoletas.

Isso porque no caminho há um grande impasse: a descontrolada mineração, que por sua vez desconstrói possibilidades e potencialidades do desenvolvimento socioambiental. Paisagens geoecológicas se tornam paisagens minerárias com impacto significativo no entorno. Entretanto, na região das paisagens minerárias do Quadrilátero Ferrífero (QF) encontram-se os principais mananciais e sistemas de abastecimento hídrico da capital e adjacências. O entorno de Belo Horizonte, por sua vez, tendo litologia e geomorfologia favoráveis à manutenção de aquíferos e nascentes é local privilegiado neste sentido, porém se formata enquanto território de inúmeros conflitos. Esta questão tem uma fundamentação socioeconômica historicamente alicerçada na Mineiridade.

A atividade minerária descaraterizadora de paisagens é parte integrante da cultura e da história do povo mineiro desde os primórdios da colonização. A degradação e descaracterização de paisagens ambientais e culturais é uma herança desde os tempos coloniais, onde os elementos espaciais da geologia e da geomorfologia possuíam importância se gerassem divisas à Coroa Portuguesa.  Assim, em Minas Gerais, de norte a sul e de leste a oeste, importantes recortes do patrimônio geoecológico são apropriados pela mineração, consolidando-se cenários de impactos e conflitos. Hoje, além do ouro de outrora, o estado protagoniza grande parte dos minérios necessários às indústrias, sobretudo, as internacionais por meio de saídas da commodity.

Foto: Reprodução/ TV Globo

Nessa concepção é preciso rever o modelo econômico da sociedade vigente, pois territórios geológicos vão além das prerrogativas de reservas minerárias e das cifras milionárias a ela associadas. Quando se vislumbram as perspectivas do patrimônio geológico, empreende-se discussão a favor da defesa dos legados que permitem compreender a história de formação geomorfológica do planeta Terra.

Assim, não podem ser vistos apenas como fonte de minerais estratégicos para a sociedade urbano-industrial capitalista dos tempos atuais, na qual o lucro minerário fica nas mãos das grandes empresas e a sociedade apenas recebe os passivos e problemas. Diante do exposto, o presente texto apresenta as possibilidades e potencialidades da Pedra Grande, noroeste do Quadrilátero Ferrífero–MG, elevação localizada entre os municípios de Igarapé e Itatiaiuçu, na Grande BH, na região de preservação ambiental das represas do Rio Manso e Serra Azul e que dimensiona impactos significativos decorrentes da mineração. Mas estas áreas de mananciais não se encontram biologicamente conectadas, dada à existência de extrações minerais em pleno funcionamento.

A partir da premissa da Sustentabilidade, são áreas potencializadoras do turismo sustentável e da interpretação ambiental, porém a égide econômica se sobrepõe, sobrepujando lugares e comunidades. Na paisagem minerária da parte noroeste do QF encontra-se um importante recorte geoambiental, a Pedra Grande ou Pico do Itatiaiuçu, que se encontra no divisor de águas de dois importantes sistemas, o Rio Manso, com 65.778 hectares, e a Serra Azul,com 26.058 hectares, ambos declarados como Áreas Estaduais de Proteção Especial – APEE em decorrência da relevância dos serviços ecossistêmicos prestados à coletividade. Criados respectivamente em 15/03/1988 e 08/07/1980 compõem-se de represas artificiais cercadas de vegetação nativa e com uso restritivo, além de entrada proibida. A conexão ecológica direta entre os mananciais se faz necessária através da criação de alguma unidade de conservação de proteção integral no âmbito da legislação estadual.

Imagen: Silva & Menezes (2011. p. 363)

PARA SABER MAIS

Silva, E.G.; Meneses, L.F. Inventário de geossítios como subsídio para o geoturismo no município de Gurjão (PB). Revista Brasileira de Ecoturismo, São Paulo, v.4, n.3, 2011, pp.361-382.

* Charles de Oliveira Fonseca é Bacharel em Turismo (IGC-UFMG/2010) e Mestre em Geografia e Análise Ambiental (IGC-UFMG/2014).

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