Ciência e sociedade: oportunidades trazidas pela pandemia no campo da divulgação científica.

Cristina Toscano Fonseca¹

A Pandemia da COVID-19 trouxe medo, insegurança e grandes transformações. Entre as transformações vivenciadas, está uma maior aproximação da academia com a sociedade. Ficou ainda mais evidente o grande interesse da população em entender a ciência para aplicar seus conhecimentos na busca de soluções. No caso da Pandemia, buscou-se mitigar o impacto desta grande crise sanitária em suas vidas.  Nunca se falou tanto em diagnóstico, vacina, tratamento, dados epidemiológicos, entre outros assuntos em conversas entre amigos e familiares. E vimos vários pesquisadores se esforçando para transmitir e discutir com a sociedade os últimos achados da ciência no contexto da pandemia da COVID-19. 

Tanto a mídia tradicional como as redes sociais foram ferramentas importantes para a divulgação e popularização do conhecimento científico e muitos pesquisadores demonstraram um talento nato para a comunicação da ciência com a sociedade, enquanto outros se aperfeiçoaram no meio do caminho e, hoje, comunicam muito melhor do que o que faziam em março de 2020. 

Mesmo antes da pandemia, a divulgação científica, alfabetização científica e popularização da ciência já se mostravam de extrema relevância. Estávamos enfrentando um movimento anticiência e sucessivos cortes no financiamento da ciência no país. O desafio era engajar a sociedade na luta por uma causa que nem mesmo ela identificava como prioritária. Constatamos que, salvo raras exceções, falhamos na comunicação com a sociedade. 

No entanto, a Terra não é plana e o mundo dá voltas! Temos agora uma grande chance de mudança de comportamento da academia e seus pesquisadores. E já estamos vendo essa mudança na prática. Podemos usar este momento para estruturarmos uma via de comunicação clara e transparente dos resultados das nossas pesquisas para jornalistas e toda a população. 

Neste contexto, e para atingir uma comunicação efetiva com a sociedade, no meu ponto de vista, devemos focar em algumas ações: 

  1. Visto que o sucesso da divulgação científica está ancorado no sucesso da comunicação, há uma grande necessidade de aproximação do pesquisador com seu público-alvo. Acostumado a comunicar-se com os seus pares, os pesquisadores precisam adquirir habilidade de comunicação simples e direta, sob o risco de falar e não ser ouvido.    Independente de o pesquisador assumir o papel de divulgador por si só, ou nos casos em que o jornalista é a ponte entre a pesquisa e a sociedade, este perfil de comunicação se faz necessário. Uma vez que habilidades podem ser desenvolvidas, não seria este o momento de incluir uma disciplina sobre comunicação científica no rol de disciplinas dos programas de pós-graduação? 
  2. Outro grande desafio da comunicação científica com a sociedade esbarra na baixa alfabetização científica no país. Dados do PISA de 2018 demonstram que 55% dos estudantes de 15 anos não apresentaram nível básico de proficiência em ciências (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, 2020).  Sendo assim, devemos somar esforços para aproximar os cientistas dos educadores e para apoiar iniciativas que têm como objetivo melhorar o letramento científico no país. Criando estratégias para implementar estas ações mesmo que no contexto remoto imposto pela pandemia. 
  3. Assim como as demais áreas da ciência, a divulgação científica também é uma atividade colaborativa e, essencialmente, interdisciplinar. A formação de redes e grupos de profissionais com diferentes saberes em ações de divulgação científica é extremamente bem-vinda e deve ser incentivada pelas instituições de ciência e tecnologia.

A pandemia transformou todos os pesquisadores em divulgadores científicos, seja entre amigos, familiares, nas redes sociais ou mídia tradicional. E os desafios têm sido não apenas o desenvolvimento de habilidades de comunicação, mas a dificuldade para acompanhar o grande número de conhecimento que vem sendo gerado por cientistas do mundo todo em tempo recorde e a luta diária contra notícias falsas que vivem pipocando nas redes sociais. 

Nota da autora: Sou uma pesquisadora que assim como muitos colegas, da noite para o dia, fomos desafiados a explicar a ciência e seus resultados de uma forma clara para grupos de amigos e familiares. Constatando aquilo já suspeitava mesmo antes da pandemia, a importância da comunicação da ciência para a sociedade, me juntei ao comitê de divulgação científica do Instituto René Rachou – Fiocruz Minas. Juntos estamos aprendendo a cada dia e construindo de forma colaborativa materiais de divulgação científica customizados para diferentes públicos. Este texto, reflete minha percepção de oportunidade no campo da divulgação científica e sugere ações que julgo necessárias para uma grande mudança de aproximação da academia com a sociedade.  Certo de que outras percepções e visões sobre o tema existem, gostaria de convidá-los a contribuir com suas reflexões sobre o assunto deixando aqui seus comentários. 

 

1Cristina Toscano Fonseca é Pesquisadora em Saúde Pública e uma das líderes do Grupo de Pesquisa Biologia e Imunologia de Doenças Infecciosas e Parasitárias da Fiocruz Minas.

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Este texto integra uma parceria entre o Pensar a Educação, Pensar o Brasil 1822/2022 e o Instituto René Rachou (Fiocruz) para promover ações e reflexões em torno da Educação para a Saúde.

 

Para saber mais: 

Brasil. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Brasil no Pisa 2018 – Brasília : Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, 2020. 185 p. : il. ISBN 978-65-5801-039-5


Imagem de destaque: HVX

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