As cenas públicas nos ensinam sobre direitos humanos

Sebastião Everton de Oliveira¹ 

As imagens produzidas nas interações públicas são recursos pedagógicos por excelência. Diante dos enquadramentos e recursos de registro, no reconhecimento da desigualdade envolvida na produção e no seu acesso, fica possível analisar contextos, perceber intenções ou até mesmo detectar descuidos, descontinuidades e contranarrativas de fatos e situações que constroem as nossas histórias. Isso, por exemplo, aconteceu nas jornadas de junho de 2013, onde as práticas de midiativismo conseguiram incidir numa estrutura de criminalização dos movimentos sociais e mobilizar pontos de vistas diferentes daqueles veiculados pelas grandes mídias de nosso país. Por essa razão, essas imagens públicas ao produzir códigos e sentidos, produzem também pontos de vistas diferentes, nos mobilizando para algum posicionamento diante deles.

Neste tempo de isolamento social também vimos muitas cenas, mundo afora, que expressaram situações local e globalmente atravessadas pelo direito de viver, de manifestar, de ir e vir, e até mesmo com efeito de nos silenciar.

Essas cenas acessadas trouxeram, por exemplo, posturas de rejeição, negação e desconfiança ao vírus da COVID 19, como aquelas assistidas nas nossas comunidades em que são expressas na masculinidade, quando principalmente os homens (para não afetar sua virilidade) rejeitavam o uso da máscara.  

Nessas imagens do cotidiano, vimos dolorosas relações que jamais serão esquecidas, caixões e corações em apuros (ou sufocados). Neste sentido, também assistimos nos noticiários à perpetuação de uma proliferada e contraditória política institucional, que esteve a todo tempo na contramão das vias de proteção do povo. Mas, ao interagir com elas, também temos a oportunidade de romper com leituras alienadas e ampliar tantas outras leituras de mundo. É aí que enxergamos também as denúncias, o repúdio, os improvisos e as resistências pelo direito de respirar, de viver o luto e de se vacinar. Assim concretamente a esperança ganha novas imagens e lugares.

Assim, entre a miopia, a disfunção das vistas, e o uso dos óculos, temos a oportunidade de desenvolver outras consciências, quem sabe mais coletivizadas e mais favoráveis à humanização dos processos sociais. 

Nessa perspectiva, as selfs que antes representavam certo narcisismo no culto à própria imagem e socialização no ambiente virtual, agora denotam esperança e testemunhos positivos, que podem e devem estar presentes nas narrativas coletivas. 

A exemplo disso, tirar uma foto tomando vacina no Brasil passou a significar muita coisa. Sua significação tem tido valor positivo, reinserindo novas interpretações, conforme revelam as representações que vêm sendo disputadas no cotidiano brasileiro.

Passamos lentamente de uma situação de rejeição ao acesso à vacina. Ser vacinado hoje significa usufruto do direito que se faz presente no “aqui” e “agora”, sendo o recurso fotográfico a garantia da memória e reconhecimento da participação, numa história que constitui nossa identidade e que pode ser apagada, e que se fabrica como testemunho de uma experiência viva, registrada e difundida para além de cada pessoa. 

Por essa razão, as imagens capturadas são educadoras. Assim como na pandemia, a visão oficial de um massacre planejado e autorizado pelo Estado, na comunidade do Jacarezinho, no Rio de Janeiro, fica contrastada com outras vozes silenciadas, que trazem múltiplas evidências de uma postura genocida e inadequada por parte do Estado. Essas imagens são mecanismos de reflexão e ação, no qual, em cenas que se contrapõem aos discursos oficiais e negacionistas, em que, por exemplo, podem construir novos pontos de vista na composição do cenário complexo vivido, como no caso da Pandemia no Brasil. 

Nessa reflexão, podemos dizer que essas imagens são recursos fundamentais para acalentar e pautar sobre os traumas, as perdas, as saídas possíveis desta grande crise humana. São elas que podem ser também suporte para acalentar a comunidade escolar, em suas vitalidades e generosidades, na esperança do reencontro presencial (seguro) e necessário.

Sem dúvidas ao olhar para as imagens e, consequentemente, para nós mesmos, trabalhamos nossa memória e fundamos uma proposta de identidade coletiva, com perspectiva de melhorias e superação de cenas, fatos que jamais gostaríamos que se repetissem. Que este estímulo, de contar histórias a partir das imagens, possa se fazer cada vez mais presente em nossos processos educativos. 

 

1 – Educador Social, Gestor Público, Doutorando em Educação e Integrante do Fórum das juventudes da RMBH e Observatório da Juventude da UFMG – E-mail sebastianpj06@gmail.com


Imagem de destaque: Pexels|Alexander Dummer

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