Alimentando sonhos

Aline Mathias da Silva

O ensino sempre esteve presente na minha vida, porém não havia me dado conta disso. Minha mãe trabalhou a vida toda em escola como agente educacional, mais conhecida pelos alunos como “a tia da limpeza”. Sempre gostei de estar na escola com ela no turno inverso às minhas aulas. Eu sempre estava por perto para usar o quadro negro quando as aulas terminavam; de certa forma um giz e um quadro negro, em minha posse, fazia com que minha imaginação voasse.

Meu irmão gêmeo, por outro lado, era o oposto; só frequentava a escola por obrigação e, consequentemente, as suas notas e comportamento na escola nunca foram dos melhores. Desde o ensino primário sempre fui colega dele; isto aconteceu até o terceiro ano do ensino médio. Minha mãe depositava em mim a responsabilidade de ajudar meu irmão com as tarefas da escola, as de português principalmente, pois ele não as dominava tanto quanto eu. Sendo assim, ganhei um pequeno quadro negro e giz, para me tornar uma pequena professora particular do meu irmão. Após nossa aula, eu procurava ajudá-lo nas tarefas e ele me orientava com os terríveis cálculos de matemática, expressões, divisões, frações e tudo que me deixava apavorada no “mundo das exatas”.

Já na adolescência tive uma experiência docente em uma escolinha infantil de uma igreja que minha mãe frequentava na época. Todo domingo eu era responsável por ser a auxiliar da “salinha das crianças”, e eu amava essa troca e interação com as crianças. Acredito que a partir dali foi que a “sementinha da pedagogia” foi plantada e cresceu esse desejo por me tornar educadora. Há alguns anos tive a oportunidade de trabalhar em um projeto pelo qual eu era apaixonada. Neste projeto eu atendia em torno de 20 famílias semanalmente; eram crianças de zero a três anos de idade e eu realizava entrevistas com as famílias atendidas. Também verificava o que a criança precisava para aprimorar aspectos nos quais elas não estivesse obtendo êxito, de acordo com a sua faixa etária, como, por exemplo, coordenação motora fina, ampla, aspecto cognitivo, entre outros.

A experiência que vivenciei nesse período, por meio do acompanhamento das crianças e suas famílias, foi o que me motivou a cursar Serviço Social. Acreditei que escolhendo essa profissão poderia mudar/ajudar as famílias que mais precisam de auxílio, e nem me refiro à questão financeira, mas às vezes uma simples conversa ou desabafo com uma mãe cansada e que cuida sozinha da casa e dos filhos. Este procedimento, aparentemente simples, mudava completamente o dia daquelas mães. Pude perceber que fiz a diferença na vida de mães que eu visitava; não estive presente apenas na vida dos filhos, mas também na vida delas, pois com o tempo foram me dando liberdade e confiança para desenvolver uma amizade. Algumas tenho contato até os dias de hoje e já se passaram cinco anos.

No entanto, na prática percebi que ser assistente social não é exatamente ajudar as pessoas. Então me senti desmotivada, e compreendi que as coisas não são tão simples como se apresentam, principalmente por termos que cumprir regras e leis, o que tornava alguns desejos inatingíveis. Foi então que decidi trancar meu curso e migrar para outra área, aquela que já estava há um bom tempo no meu coração, a Pedagogia. Diante disso, olho para trás e observo o quanto foi engrandecedor e gratificante fazer a diferença na vida de algumas pessoas, por mais que fossem coisas mínimas, sei o quanto significam para quem às vezes precisa de tão pouco para melhorar o seu dia. Minha família sempre foi humilde; minha mãe trabalhou muito para não deixar faltar nada para mim e meus irmãos, porém, para nós, cursar uma faculdade parecia uma utopia: os preços ainda são altíssimos em instituições de ensino superior particulares. Decidi que eu só cursaria uma faculdade se fosse gratuita e, desde então, era atrás deste sonho que eu corria o tempo todo. Acredito que a universidade pública e de qualidade é direito de todo estudante.

Na minha cidade natal, Cruz Alta, só cursam o Ensino Superior pessoas cujos pais podem pagar ou quem consegue acesso pelo Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM). Internalizei a ideia de que um ensino superior público não seria a minha realidade se continuasse morando em Cruz Alta, interior do Rio Grande do Sul. Acredito que minha mãe tenha me criado para o mundo, nunca fui medrosa e sempre encontrei muita força para conquistar meus objetivos, visto que ninguém poderá fazer isso por mim. Pensando assim foi que decidi vir morar em Santa Catarina; este é um estado deslumbrante e que faz a gente sonhar com mais força ainda. Parti de “mala e cuia”; inicialmente com meu irmão, mas a vida dele tomou outros rumos e ele voltou para nossa cidade natal.

Desde que cheguei em terras catarinenses meus objetivos foram trabalhar e conseguir uma bolsa integral na faculdade. Não demorou muito e consegui um emprego que, por coincidência, era em uma universidade, onde eu recebia um bom desconto por ser funcionária, mas infelizmente meus horários coincidiam com as aulas e se tornou inviável, fazendo com que eu adiasse um pouquinho mais meu projeto. Um tempo depois, fiquei sabendo sobre o processo seletivo do Instituto Federal Catarinense, o IFC. Pesquisei se ofertavam o curso de Pedagogia e fiz logo a minha inscrição. Como eu havia feito o ENEM anos atrás, consegui uma vaga. A minha felicidade é enorme, pois sinto que estou no caminho certo: realizada, trabalhando e estudando. É fácil perceber o quanto o IFC investe em seus alunos e os valoriza; a instituição tem um peso enorme. É realmente um ensino público, gratuito e de qualidade. Mesmo com as aulas acontecendo de maneira remota, a qualidade do ensino e a didática dos professores são excelentes.

A cada dia que passa me sinto mais parte do IFC; sei o quanto esta instituição me abrirá portas no decorrer do curso e o quanto me sinto realizada como estudante e como pessoa. Novas metas foram criadas e sigo na procurando vencê-las, com o objetivo de ser uma estudante melhor e futuramente uma ótima professora: função apaixonante e de extrema responsabilidade. Como docente, estabelecerei contato com muitas vidas, que, em alguns momentos, serão transformadas e que me transformarão também. Espero até a conclusão do curso perceber o quanto me apropriei de conhecimentos anteriormente ignorados. Me sinto realizada e estou no caminho certo, meu lugar é na Pedagogia. É fascinante apresentar o mundo para uma criança; é instigante fazer parte desse processo. A educação é, assim, um processo que nos faz e refaz.

 

Sobre a autora
Estudante do curso de Licenciatura em Pedagogia do Instituto Federal Catarinense – campus Camboriú. Uma versão preliminar deste texto foi escrita como atividade avaliativa da disciplina História da Educação, do citado curso, ministrada pela Profa. Dra. Marilândes Mól Ribeiro de Melo. Sobre a nova série de textos de estudantes do Instituto Federal Catarinense na coluna Entrememórias, acesse aqui.


Imagem de destaque: Galeria de imagens

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *