A saúde na América Latina e Caribe a partir dos indicadores da Agenda 2030

Wanessa Debôrtoli de Miranda
Fabrício Silveira
Ana Luísa Jorge Martins
Rômulo Paes de Sousa

Criada em 2015 pelos 193 Estados-membros da Organização das Nações Unidas, a Agenda 2030 é um plano de ação global, que articula as dimensões ambiental, social e economica, visando a erradicação da pobreza e promoção de uma vida digna para todos, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de satisfazerem as suas próprias necessidades. A Agenda apresenta 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), abordando questões como: superação da pobreza e fome, agricultura sustentável, saúde, educação, igualdade de gênero, água potável e saneamento, energia acessível e limpa, trabalho, redução de desigualdades, cidades e comunidades sustentáveis, consumo e meio ambiente. Para cada objetivo foram criadas metas, 169 ao todo, e indicadores para que cada país possa monitorá-las, identificando seus pontos críticos. Desta forma, a Agenda funciona como uma referência, orientando o desenho e implementação de políticas públicas mais efetivas, revisões da lógica de produção e consumo, e  mudanças de atitudes individuais frente ao meio ambiente e a outras pessoas.

Com o objetivo de contribuir para o debate no campo da saúde e implementação da Agenda 2030, o Grupo de Pesquisa de Política em Saúde e Proteção Social do Instituto de Pesquisas René Rachou – Fiocruz Minas, vem desenvolvendo uma série de pesquisas sobre a temática desde 2018. Dentre as quais, a avaliação dos indicadores da Agenda, tanto ao nível local quanto global.

No âmbito do presente trabalho, foram analisados 42 indicadores relacionados à saúde presentes na Plataforma dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável da Organização Mundial da Saúde (OMS). A partir da utilização de técnicas estatísticas, o estudo reconstruiu a trajetória global de evoluçãodecada um desses indicadores. Os países podem ser comparados a partir do seu nível de Produto Interno Bruto (PIB) per capita, que é utilizado como um índice resumo do processo de desenvolvimento. Ou seja, a trajetória global estimada permite uma medida contrafactual, hipotética, de onde o país deveria estar, em relação àqueles com PIB semelhante, e fazer as comparações. Desta forma, é possível identificar os temas nos quais os países apresentam evoluções ou fragilidades relativas.

O estudo destacou os países da América Latina e Caribe. Apesar da proximidade geográfica e relativa similaridade quanto ao nível de desenvolvimento econômico, os resultados mostraram grandes disparidades nos indicadores relacionados à saúde nos países da região. Os indicadores com nível melhor que o esperado para os países da América Latina e Caribe foram aqueles que avaliam riscos ambientais, como uso de serviços básicos de água potável e saneamento. De outro lado, os maiores desafios para a região parecem estar nos seguintes indicadores: homicídios, do qual Honduras, por exemplo, apresentou taxa de 60 homicídios por 100.000 habitantes enquanto a média global é de 8,17; gravidez na adolescência, que diferentemente dos demais indicadores de saúde reprodutiva é um problema para todos os países, assim como a mortalidade materna. Atenção especial também é necessária ao consumo de álcool e de cigarro e também ao sobrepeso de crianças, já que a evolução desses se dá no sentido oposto ao desejável, ou seja, aumentando com o aumento da renda e acesso a bens e serviços. Este fato em si exige um conjunto articulado de políticas para inibir esse caminho natural de aumento desses fatores de adoecimento.

Os resultados dessa pesquisa colocam em evidência fragilidades que demandam maiores esforços dos governos da região. De fato, busca-se um modelo de inclusão econômica e social com uso responsável dos recursos naturais para o atingimento do príncipio da Agenda de não deixar ninguém para trás. Nas grandes desigualdades regionais precisam ser combatidas por meio de políticas igualitárias para os grupos populacionais vulneráveis dentro de cada país. Isso se traduz na ampliaçãodo acesso desses grupos a um conjunto de bens e serviços públicos e também privados, para que possam compartilhar uma vida social em igualdade de direitos. O caminho certamente deve passar por intervenções universais e não apenas focadas em estratégias únicas/singulares, saindo de um contexto em que os sistemas setoriais atuam de forma isolada, para buscar uma articulação transversal e intersetorial em programas complexos. Destacando, sobretudo, a importância da implantação e fortalecimento de sistemas de saúde com cobertura e acesso amplo, por acreditar ser este o melhor caminho que um país pode ter em tempos de tamanha incerteza sanitária.

As autoras e autores são pesquisadores do Grupo de Pesquisa de Política de Saúde e Proteção Social da Fiocruz Minas, coordenado por Rômulo Paes de Sousa. Wanessa Debôrtoli de Mirandaé também do Departamento de Gestão em Saúde da Escola de Enfermagem da UFMG.

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Este texto integra uma parceria entre o Pensar a Educação, Pensar o Brasil 1822/2022 e o Instituto René Rachou (Fiocruz) para promover ações e reflexões em torno da Educação para a Saúde.


Imagem de destaque:  Mernestotz

 

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