A indiferenciação entre o fundamental e o acessório no debate sobre a educação no Brasil

A indiferenciação entre o fundamental e o acessório no debate sobre a educação no Brasil

Nos últimos dias, com a indicação do nome da profa. Maria Helena Guimarães para a Secretaria Executiva do MEC, observamos que vai sendo produzido, por vários dos sujeitos, individuais e coletivos, certo consenso de que, com ela, a Base Nacional Comum Curricular ganhará mais centralidade ainda nas políticas do órgão.

Quem acompanha, nos últimos anos, o debate sobre educação pode perceber o quanto as discussões sobre as Bases Nacionais extrapolaram os limites dos especialistas em educação e da burocracia educacional e mobilizaram considerável número de instituições acadêmicas, movimentos sociais e sindicais e, mesmo, diversos outros sujeitos que se sentiram motivados a defender publicamente pontos de vista a respeito do assunto. Nessa ampla arena de debate, representada sobretudo pela internet, não raramente pareceu-nos assistir a um jogo do bem contra o mal ou, ainda, em que o futuro do Brasil e da pátria brasileira está a depender da aprovação ou não das Bases Nacionais Curriculares.

O grande problema, já se disse aqui, é que nesse debate público poucas vezes se considera a grande relatividade das Bases Nacionais Curriculares, sejam elas quais forem, no conjunto dos problemas estruturais da educação brasileira. Raramente se expressa nesse debate público a ideia de que, desde pelo menos o séculos XIX, o Estado brasileiro tem sido pródigo em reformar os currículos das escolas e a formação dos professores (inclusive as instituições), no mesmo modo como tem sido leniente no estabelecimento de carreiras, salários e condições de trabalho dignos para os professores.

Convenhamos que, independentemente de quais sejam as Bases, o seu impacto no cotidiano escolar e na qualidade da educação serão muito pequenas se não garantimos condições de trabalho, de carreira e salários dignos para os professores. Da mesma forma, professores capazes de colocar em marcha a metade do que se coloca nas Bases, seriam capazes também de virá-las de ponta-cabeça e recriá-las, se necessário, para fazer uma escola de qualidade.

É preciso fugir, nesse debate, da ideia do bem contra o mal. Verdadeiros defensores da qualidade da escola pública há tanto entre aqueles que defendem as Bases Nacionais quanto entre aqueles que as atacam.

No entanto, não deixa de ser assustador que neste momento, ao discutir a subida do governo Provisório ao poder e a nomeação dos dirigentes do MEC, quase todo o debate público se volte, mais uma vez, para a importância e centralidade das Bases Nacionais nas políticas do MEC. Dimensões muito mais importantes do que essa, com um poder de desestruturar completamente a escola pública, e abraçadas pelo governo golpista, não recebem nem uma fração mínima da atenção que foi (e tem sido) dadas às Bases Curriculares.

A proposta de desvinculação constitucional dos recursos para a educação e para a saúde é, desse ponto de vista, muito mais devastadora do que aprovar ou não as Bases Nacionais. No entanto, seja no mundo acadêmico seja entre aqueles que se mobilizam para o debate nas mídias, a questão tem sido muito pouco debatida. Há que se perguntar sobre as razões desse silêncio.

O certo é que, enquanto estivermos enquadrados nessa pauta e no discurso que, no espaço público, defendem que as Bases Nacionais são o principal item de discussão da política educacional do MEC, vamos deixar o caminho livre para as reformas estruturais que tornarão obsoletas tais Bases antes mesmo que venham a ser aprovadas. Obsoletas não por serem desatualizadas ou pouco precisas, mas porque a escola pública brasileira, e com ela os professores, podem ser enviados de volta para o século XIX, momento em que, aliás, o discurso que funda a qualidade da escola na excelência dos currículos e da formação de professores foi elaborado.

 

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