Marileide Lázara Cassoli
Eu quero ser gente, quero ser alguma coisa na vida…
Capiná roça não…
Tenho pavor de terra…
do jeito que eu vi meu pai e minha mãe sofrer na terra dos outros…
(Dona Sebastiana, 2016)
Conheci Dona Sebastiana em novembro de 2015. Impossível resistir à força que emanava daquela mulher. Admirável! Foi durante o primeiro Canjerê¹ realizado no espaço da Funarte, em mês e ano citado acima, que ela entrou em minha vida e deu corpo, alma e voz, às mulheres e aos homens aos quais havia me dedicado a estudar e narrar suas trajetórias e lutas pela liberdade em meus estudos sobre a escravidão e o pós-abolição, em Minas Gerais. Ainda me recordo, emocionada, do cortejo realizado pelas Irmandades do Rosário, da Funarte à Igreja São José. Seguida pela Guarda de Moçambique de São Benedito (Carrapatos da Tabatinga), lá estava Dona Sebastiana. Descalça, caminhou todo o trajeto emanando força e graça nos passos e cantos de louvação à Senhora do Rosário. Outras duas edições do Canjerê foram realizadas em 2016 e 2018. Cultura, religiosidade, tradição e a luta pelos direitos das comunidades quilombolas foram os temas debatidos em diversas oficinas e mesas redondas. Um dos momentos mais marcantes, para mim, foi o encontro Chá com as Matriarcas de comunidades quilombolas da Região Metropolitana, realizado no Memorial Minas Gerais Vale, o qual reuniu as matriarcas dos Quilombos dos Luízes, Chacrinha, Mangueiras e Carrapatos da Tabatinga. Das histórias narradas por essas mulheres ficou o registro das imensas dificuldades enfrentadas (e por enfrentar) na preservação de suas identidades, memórias e reconhecimento de direitos sobre a terra. Maio chegou e com ele dia 13, dia da “áurea” Lei. Refletir criticamente sobre seus significados e legados é imprescindível para que a data seja, mais e mais, ressignificada. Em 6 de julho, no ano passado, Dona Sebastiana nos deixou. Contudo, sua força, graça e luz podem ser vistas no documentário que deixo aqui indicado: A Filha de São Sebastião.
Assim, passo a palavra para a filha de Oxóssi.
¹ O Canjerê, encontro das comunidades quilombolas de Minas Gerais, é realizado pela Federação das Comunidades Quilombolas de Minas Gerais -N’Golo e conta com parcerias diversas como o Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico (Iepha-MG), a Secretaria de Estado de Desenvolvimento Agrário (Seda-MG), a Prefeitura de Belo Horizonte, o Iphan, a Fundação Palmares e a Secretaria de Estado de Cultura (SEC/MG), entre outras instituições.
Imagem de Destaque: Caturra Digital