A Academia também é espaço de militância: um pouco da história de Dalila Andrade Oliveira

Designada recentemente para o Conselho Deliberativo do CNPq, a pesquisadora e professora da UFMG, tem uma longa trajetória no movimento sindical, na pesquisa e na educação

Sabrina Moreira

Militância é o termo que se usa para caracterizar movimentações de pessoas que se mobilizam coletivamente em busca de direitos e transformações. Essas mobilizações podem acontecer através de organizações políticas ou não. E foi ainda no Ensino Médio que a professora da Faculdade de Educação da UFMG, Dalila Andrade Oliveira, iniciou sua militância, no movimento secundarista.

Em resposta às suas angústias e anseios de mudança, Dalila sempre entendeu a necessidade da luta coletiva, então em 1983, escolheu cursar a graduação em Ciências Sociais pela Universidade Federal de Minas Gerais, com o intuito de entender as relações que envolvem a nossa sociedade e a política. Ao se formar e se tornar uma Cientista Social, atuou como assessora de formação política de alguns sindicatos de Minas Gerais filiados à Central Única dos Trabalhadores – CUT. Nesse momento de sua vida, ela se encontrou com a Educação Popular e as obras de Paulo Freire, e assim, entendeu ainda mais a importância do lado político da educação para as transformações sociais que ansiava.

Depois de tal encontro, procurou a FaE/UFMG para realizar o mestrado em Educação em 1990. Logo após se tornou docente da Unidade. Quatro anos depois de terminar seu mestrado decidiu realizar o Doutorado na Universidade de São Paulo – USP no campo da política, estado e educação. Sua tese de doutorado foi publicada como livro pela Editora Vozes, Educação Básica, gestão do trabalho e da pobreza.

Foi no campo das políticas públicas em educação, mais especialmente em Trabalho e docência, que a pesquisadora encontrou respostas para os seus anseios ao cursar Ciências Sociais. Há anos se dedica a estudos sobre a políticas públicas em educação e sobre a profissão docente. Coordena o Grupo de Estudos sobre Política Educacional e Trabalho Docente (Gestrado/FaE/UFMG) onde publicou em 2010, junto as docentes Adriana Duarte e Lívia Vieira, o Dicionário de Verbetes: Trabalho, Profissão e Condição Docente. No mesmo Grupo de pesquisa tem realizado pesquisas de âmbito nacional e internacional sobre o trabalho docente na Educação Básica, com destaque para a pesquisa Trabalho docente na Educação Básica no Brasil, realizada em sete estados do país. Nesse mesmo período foi presidenta da Associação Nacional dos Pós-Graduandos e Pesquisa em Educação – ANPEd, por dois mandatos, tendo sido antes vice-presidente da entidade. Esse momento foi de intensa luta pelas melhorias na qualidade e de acesso à educação brasileira. Ao falar de tal período a educadora afirma a importância política da instituição, principalmente a relação dialógica da ANPEd, uma organização da sociedade civil, com as discussões sobre os rumos da educação.

“No período que estive na direção da ANPEd pude participar de espaços muito importantes de definição de políticas, como audiências públicas realizadas no Congresso Nacional e no Conselho Nacional de Educação, junto a outros órgãos públicos, como o IPEA e o INEP, além do Ministério da Educação. É muito interessante, do ponto de vista da interlocução política, que uma associação como a ANPEd, uma organização da sociedade civil, participe da discussão dos rumos da educação brasileira, da definição de sua agenda”.

Apesar de aposentada desde julho de 2019 da UFMG, Dalila continua professora titular de políticas públicas do Programa de Pós-graduação em Educação da FaE/UFMG e atualmente, é professora visitante do programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal da Paraíba – UFPB. Mas sua militância é cotidiana por meio de suas pesquisas e estudos. Mais recentemente foi designada a compor o Conselho Deliberativo do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq que é umas das instituições mais importantes quando se trata de fomento da pesquisa cientifica e tecnologia no Brasil.

Em sua instância de maior poder decisório, o Conselho Deliberativo tem como objetivo: formular propostas para o desenvolvimento científico e tecnológico do País; apreciar a programação orçamentária e definir critérios orientadores das ações da entidade; aprovar as normas de funcionamento dos colegiados, a composição dos comitês de assessoramento e o relatório anual de atividades. Dalila Andrade acredita que sua indicação para esse espaço, que é feito por meio de consulta à comunidade científica nacional, é devida a essa sua militância, “não é uma militância político-partidária, mas é uma militância acadêmica, em defesa da área da educação, da melhoria da oferta de ensino em todos os níveis e modalidades”. Pesquisadora do CNPq desde 2002, Dalila participou do Conselho de Assessoramento do qual esteve como coordenadora entre os anos de 2018 e 2019. Considera que essa experiência foi importante para lhe dar uma dimensão do funcionamento do CNPq e sua estrutura, sempre teve como princípio manter a coerência entre a sua trajetória como pesquisadora e a defesa por uma agenda mais justa e democrática para a educação.

A pesquisadora irá representar as Ciências Humanas e Sociais no órgão e afirma que a sua atuação não será fácil considerando o contexto político atual.

“Sabemos que o momento não é muito bom para o CNPq, nem para a Capes. Enfim, não é um momento muito bom para a ciência e a pesquisa acadêmica brasileira. O atual governo tem demonstrado pouca sensibilidade para lidar com a comunidade acadêmica e para entender a importância do desenvolvimento científico no país, em especial para ciências humanas e sociais.”

As instituições de fomento sofrem cortes orçamentários desde 2016, o que vem se acirrando ainda mais em 2020, e para 2021 a previsão é ainda pior. A professora manifesta seu receio de que devido à conjuntura nacional, o CNPq não consiga promover melhores cenários para a pesquisa brasileira. Relembra a portaria n° 1.122, publicada em março deste ano, que define as áreas prioritárias para os projetos de pesquisas, e as ciências humanas não são colocadas como área estratégica. Dessa forma, afirma a necessária revogação dessa medida como pauta prioritária nesse momento. Assim sendo, Dalila acredita que em momento de ataques, principalmente a ciências humanas e sociais, a sua presença nesse espaço deverá ser dedicada à defesa da importância desses campos para o desenvolvimento do país. Em diversos momentos de sua fala a pesquisadora retoma a militância, isso vem do enfrentamento e da coragem. Enfrentamento por se opor a realidade posta e coragem para propor saídas e lutar por elas. Dessa forma, pra ela que sempre teve a coerência como princípio, participar do Conselho Deliberativo é uma resposta de peso a sua trajetória.


Imagem de destaque: Thiago Rosado

 

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