Diga os nomes deles, diga os nomes delas: uma leitura de Dois estranhos. 

Alexandra Lima da Silva

A cada 23 minutos, um jovem negro é morto no Brasil. O estudante João Pedro Mattos Pinto, de 14 anos, foi assassinado enquanto brincava com os primos dentro de casa. Tão perto, tão longe. Uma das cenas do curta-metragem de ficção Dois Estranhos (Netflix, 2020), me trouxe à mente a morte de João Pedro, em 18 de maio de 2020. Em 29 minutos, o jovem negro Carter James está preso num loop que parece eterno: ele sendo morto por um policial branco. De forma angustiante e sufocante, revivemos inúmeras cenas que tiveram o mesmo desfecho: policial branco assassina jovem negro, considerado “suspeito” pelo simples fato de fumar, de correr, de vestir-se, de brincar, de andar, de ir ao supermercado, de dormir dentro de casa, de brincar na porta de casa, de respirar, pelo simples fato de existir. 

“Mas por que você não conversa com ele?”

Esta foi uma das estratégias de sobrevivência do Carter James: convencer o policial que eles poderiam conversar, como pessoas. Que ele, Carter, tinha um cachorro, era do signo de Áries, era uma pessoa, e tinha o direito de viver, sem o medo de ser alvejado com um tiro na cabeça. Na primeira cena em que Carter é assassinado pelo policial Merk, revivemos a imagem do brutal assassinato de George Floyd. É brutal.  

Assisti Dois Estranhos na mesma semana em que o ex-policial Derek Chauvin foi condenado a uma pena de 40 anos pelo assassinato de George Floyd foi ainda mais amargo, pois horas antes da condenação de Derek, a adolescente a adolescente Ma’Khia Bryant, de 16 anos, foi morta pela polícia em Ohio. Não era ficção.

O nome de George Floyd é lembrado no curta Dois Estranhos: diga os nomes deles/as.

É perigoso voltar para casa quando você é sempre o alvo. 

Niterói, 20 de abril de 2021.


Imagem de destaque: Imagem aérea do filme Dois Estranhos/Netflix, 2020.

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