A reorganização da escola paulista: entre a esperteza e a responsabilidade

A reorganização da escola paulista: entre a esperteza e a responsabilidade

Nas últimas semanas a proposta do governo paulista de reorganizar as escolas estaduais ocupou de forma ostensiva o noticiário e mobilizou considerável número de professores, pais e pesquisadores interessados nos rumos da escola pública no Brasil. Seja pelo seu conteúdo, seja pela sua forma, a reforma tem causado muita polêmica.

O governo paulista comunicou aos professores, aos pais e à comunidade em geral que reorganizaria a educação básica, sob os seguintes argumentos: houve mudança no perfil etário da população, fazendo com que as escolas paulistas perdessem 2 milhões de alunos; as escolas que trabalham com apenas um seguimento (anos iniciais do ensino fundamental ou anos finais do ensino fundamental ou ensino médio) têm melhor rendimento. Os rumos dessa reorganização, no plano imediato, seriam a reunião, na mesma escola, apenas de alunos de um mesmo seguimento, medida que redundaria na melhoria do rendimento dos alunos e proporcionaria economia de recursos financeiros.

Se, por um lado, a defesa pública da proposta, seja pelos seus elaboradores seja por pesquisadores, foi muito tímida, por outro lado, ela sofreu críticas as mais diversas, vindas de praticamente todos os movimentos que se interessam pela escola pública no país. A estes, os argumentos apresentados para melhorar o rendimento dos alunos e para economizar recursos, inclusive com o fechamento de quase uma centena de escolas, não convenceram.

O episódio é um bom exemplo para pensarmos como a administração pública brasileira e, por consequência, nossas políticas públicas, não conseguem ultrapassar o regime de tempo imediato para planejar a médio e longo prazos. Se os problemas enfrentados pelas escolas paulistas apontam ou se assentam em mudanças em dimensões estruturais da e na sociedade, porque não discutir as soluções com aqueles e aquelas que estão diretamente implicados no problema, ou seja, os pais e professores? Se são problemas estruturais, se não surgiram da noite para o dia, por que a solução tem que ser elaborada em gabinetes e comunicada aos interessados?

É certo que a mudança da estrutura etária de nossa população – e não apenas da população escolar paulista, diga-se de passagem – está impondo novas questões e exigindo novas respostas de nossas políticas públicas, a direção dessas respostas precisa ser amplamente debatida, pois seus efeitos serão sentidos a médio e longo prazos.

No caso das escolas, por exemplo, ao invés de fecharmos escolas, uma solução poderia perfeitamente ser a ampliação do tempo escolar. É sabido que o Brasil, ao contrário de boa parte do mundo, manteve ao longo do século XX e começo do XXI, o mesmo tempo escolar diário do século XIX: em torno de 4 horas de aula por dia! A utilização intensa do espaço escolar para abrigar alunos de faixa etária diferentes – em até 4 turnos diários – aliada ao baixo investimento em educação, fez com que, para alargar o tempo escolar, tivéssemos que aumentar os dias letivos ao longo do ano.

A possibilidade, hoje, de utilizarmos a espaço escolar já construído para atender a um número menor de alunos, poderia ser uma solução para avançarmos efetivamente na organização da escola em tempo integral. Mas não num arremedo de tempo integral como observamos em quase todas as redes públicas do Brasil, utilizando espaços inadequados e mão de obra barata. Mas essa solução, que poderia ter um impacto importante na qualidade da educação, na qualidade de vida das crianças e no atendimento às necessidades das famílias, não se coaduna com a ideia de economizar os recursos da educação ou com a entrega das escolas públicas para a gestão da iniciativa privada.

Infelizmente, a administração pública paulista nos dá exemplo de que, diante de problemas estruturais e ótimas oportunidades de solucioná-los com criatividade e responsabilidade, nossos gestores preferem o caminho mais fácil e autoritário de sempre. Tratar com parcimônia e zelo os recursos públicos é responsabilidade primeira de todo e qualquer gestor da coisa pública. Achar atalhos para não enfrentar de frente os graves problemas da educação pública, é prática de políticos e gestores espertos!

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