Wojciech Andrzej Kulesza
O primeiro embate expressivo em defesa da escola pública na era republicana ocorreu na década de 1930 e é frequentemente tratado como uma disputa ideológica entre católicos e liberais, destacando-se o confronto ensino laico versus ensino religioso, em detrimento da questão da gratuidade do ensino. Todavia, a Igreja Católica detinha na época praticamente o monopólio do ensino secundário, requisito fundamental para o acesso ao ensino superior. Ou seja, as elites pagavam as altas mensalidade dos colégios católicos para que seus filhos pudessem ingressar com segurança nas faculdades. Ainda que esses colégios não visassem propriamente obter lucros pecuniários, os recursos arrecadados contribuíam decisivamente para sustentar as atividades da Igreja. Ao se defender uma educação pública, laica e gratuita, a cargo do Estado, estava-se colocando em risco essa preciosa fonte de recursos.
Um segundo momento importante de mobilização em prol da escola pública se deu no final da década de 1950, no contexto da discussão de Lei de Diretrizes e Bases aprovada em 1961. Aos defensores do ensino religioso juntaram-se dessa vez os donos de escolas particulares, assustados com o aumento da oferta do ensino público oficial pelos Estados,atacando explicitamente a gratuidade do ensino que vinha associada à luta pela educação pública. Pode-se caracterizar esse confronto pela oposição entre ensino oficial, considerado ardilosamente pelos inimigos da educação pública como ensino estatal, e ensino particular. Este é o momento no qual os donos de escolas se metamorfoseiam em empresários do ensino, expandindo seus interesses para outros níveis de ensino, a começar do ensino superior, afirmando-se assim o valor econômico da educação.
Graças a essas lutas temos ainda hoje no Brasil escolas públicas e gratuitas em todos os níveis de ensino, porém, em todos esses momentos, os partidários do ensino privado sempre conseguiram aprovardispositivos legais para se apossar, direta ou indiretamente dos recursos públicos destinados à educação. O trivial abatimento na declaração do imposto de renda dos gastos com educação, ao diminuir a arrecadação do Estado, nada mais é do que uma subvenção concedida ao ensino privado. Um sem número de subsídios, doações, isenções fiscais e outros mecanismos têm financiado os estabelecimentos de ensino por meio da utilização deassociações, fundações, mantenedoras e outros entes jurídicos. No limite, esse processo visa fazer com que todoos ônus da educação seja responsabilidade do poder público, enquanto os bônus ficam para usufruto do setor privado.
Essa apropriação de recursos públicos viabilizou a formação de empresas educacionais gigantescas, como a Kroton Educacional que, a partir do grupo mineiro Pitágoras, se transformou numa empresa multinacionalgerida pelo capital financeiro controlado por fundos de investimento. Nas bolsas de valores, tanto aqui como no exterior, os papéis da Kroton são negociados da mesma forma que os da Apple ou da Nike. E essas empresas não se limitam a adquirir e administrar escolas, investem na produção de “pacote educacionais” que incluem planejamento de aulas, materiais didáticos, avaliação e tudo que se refere ao ensino, assumindo, inclusive, o controle das editoras de livros didáticos. Possuindo 75% das matrículas do ensino superior concentrados em poucos grupos, a ponto de configurar um verdadeiro cartel, essas empresas estão de olho em outras fatias do mercado e, como mostrou o pesquisador catarinense Allan Kenji, têm se voltado para a educação básica, um filão com mais de 80% das matrículas em escolas públicas.
Entretanto, como argumentavam os defensores do ensino religioso em 1930, a questão não pode se reduzir apenas ao seu aspecto material ou econômico. Como instância de produção e reprodução social, a educação está presente nas diferentes, e muitas vezes conflitantes, ideologias que habitam nosso cotidiano e que configuram representações distintas em disputa na sociedade. O entrevero dos dias de hoje marcado pela polarização entre uma “Escola sem Partido” e uma “Escola sem Mordaça” exemplifica bem essa dimensão da educação, para além de seus determinantes econômicos. Por isso, os ataques desferidos pelo governo eleito, ostensivamente neoliberal e privatizante, às universidades públicas, não podem ser tomados apenas, ou principalmente, pelo seu significado econômico.
De modo geral, podemos dizer que os 25% matriculados nas universidades públicas se diferenciam dos 75% das escolas privadas pela melhor qualidade do ensino secundário cursado por esses alunos, a maioria, ou pela qualidade dasperformances individuais viabilizadas pelo sistema de cotas. Que escola não gostaria de contar com tal corpo discente? Além do mais, os espaços frequentados por esses alunos são exclusivos das universidades públicas, pois é nelas que são realizadas praticamente todas as pesquisas, criações e inovações no Brasil, sem falar na gama de serviços de primeira qualidade prestados em editoras, oficinas, museus, laboratórios e hospitais. Quem não desejaria ter, ao seu dispor esse extraordinário patrimônio material e intelectual? Por isso o governo quer as universidades públicas só para si, mesmo que isso signifique destruí-las, pois sem democracia, autonomia universitária e liberdade de ensino, esse patrimônio não sobrevive.
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