Reforma do Ensino Médio e o fim do futuro dos educandos na EJA

Analise da Silva 

Quando juntamos todas as pessoas sujeitos do direito à escolarização com 18 anos ou mais no país sem Ensino Médio, chegamos a 22 milhões. Essa diversidade é característica da modalidade da EJA que atende SUJEITOS historicamente excluídos do sistema de ensino pensado para crianças e adolescentes. Porém, no cotidiano escolar, muitas vezes, a diversidade é tomada como sinônimo de desigualdade, acirrando as assimetrias sociais que reiteram o processo de exclusão e de negação dos direitos. Dentre eles, o direito à Educação de Qualidade Social.

Destes 22 milhões que têm o direito, somente 1.263.157 estão matriculados, segundo microdados do Censo Escolar/INEP 2019, divulgados em junho de 2020. Ou seja, 94,3% do total dos sujeitos que tiveram seu direito negado quando eram crianças e adolescentes continuam tendo-o negado agora que são jovens, adultos e idosos, segundo dados do Censo Escolar/Inep de 2019. 

E por que eu falei isso tudo aqui se o título deste artigo é sobre os impactos da reforma do EM na EJA? 

Porque o trabalho vai se tornar, nessa perspectiva, um direito cada vez mais escasso, e, quando o educando da EJA o encontra, em geral, apresenta baixo salário e qualidade precária. A ampliação do trabalho informal, dando lugar a ocupações temporárias e precárias e a uma relação emprego-salário cada vez mais instável, também é consequência perversa da expansão capitalista. A grande maioria dos educandos ocupados ou desocupados responde não usufruir os direitos sociais previstos em lei. Essa precarização os atinge diretamente, pois, dentre os que trabalham, as profissões são: babá, cuidadora de idosos, manequim, faxineira, entregador de aplicativo, mecânico, pintor de automóveis, pintor de paredes, doméstica, trabalhador da construção civil, vendedora, office boy, gari, carregador de supermercado, costureira, balconista, jardineiro, estofador de automóveis e jovem que trabalha por conta própria (aqui incluídos trabalhos ilegais). Importantíssimo ressaltar que muitos deles não têm a carteira de trabalho assinada e que muitos, também, recebem menos que um salário mínimo mensal. Devido à realidade em que vivem, não dispõem de recursos para se qualificarem profissionalmente, e, assim, permanecem inseguros num mercado de trabalho regido pela instabilidade e pela precariedade dos vínculos trabalhistas. Daí que esse quadro só piora, pela ausência de políticas públicas concretas, que viabilizem, de fato, a inserção desses cidadãos no mundo do trabalho, por meio da garantia de seus direitos sociais. O movimento de reestruturação capitalista amplia os mecanismos de aumento da produtividade, enquanto acirra a concorrência, no âmbito dos processos produtivos, e intensifica o trabalho, provocando mudanças de ordem política, social, econômica e cultural. 

Diante desse quadro, é possível entender porque a Reforma do Ensino Médio contribui, ao mesmo tempo em que é fruto, com o recuo do Estado nas políticas sociais, inclusive ao solapar as conquistas das lutas do século passado, e contribui para a diminuição do número de empregos ofertados, e isso afeta toda a sociedade. 

Não apenas o desemprego, mas também a forma específica da sua inserção no mercado de trabalho, revela marcas da exclusão social a que estão sendo submetidos. Sendo assim, a preocupação com questões como desemprego, abandono escolar temporário e os problemas de ajustamento social da juventude surgem como central na pauta de ação de alguns governos nas últimas décadas. Entretanto, os jovens da EJA não entraram na lista daqueles que deveriam ser contemplados pelas políticas públicas de juventude. Assim, a preocupação com a garantia do acesso dos jovens educandos, a serviços da mesma qualidade encontrada por aqueles pertencentes às classes médias e à classe alta, não é uma realidade.

Nossa referência precisa se manter na Educação de Qualidade Social o que implica fornecer educação escolar com padrões que atendam aos interesses da maioria da população, portanto, dos trabalhadores e, para isso, valores, como autonomia, coletividade, justiça, liberdade e solidariedade, ao serem trabalhados em cada espaço educativo, trazem como consequência, aos estudantes e profissionais da Educação que atuam com eles, a aptidão para a interpretação de texto e contexto, como dizia Paulo Freire, porque é dessa forma, que nos tornamos aptos à leitura do mundo e à leitura da palavra e, ao construir conhecimento, podemos nos apropriar da arte de propor possíveis caminhos para os desafios. E nessa perspectiva, dirige-se ao ser humano integral, considerando todas as dimensões de sua relação com o mundo.

A prevalecer o discurso e as práticas em defesa da meritocracia, do empreendedorismo e da individualização presentes na Reforma do Ensino Médio, não haverá futuro para os educandos. Nem a perspectiva dele, porque para a EJA não haverá opções, uma vez que o itinerário será apenas o que leva ao trabalho para garantir o sustento; que os jovens, adultos e idosos da EJA no EM não possuem recursos computacionais que lhes garantam acesso estável à internet; que a Reforma institui uma EJA aligeirada encurtada no tempo, e que tudo isso está em estreita e coerente afinação com todas as demais ações de recrudescimento da ideologia neoliberal, que prega estado social mínimo.


Imagem de destaque: Fiocruz

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