Projetos engavetados

Karina Finatto

A minha história é bem comum: nasci em Cascavel, no estado do Paraná, tenho um irmão. Meus pais eram comerciantes e, desde a pré-escola ao primeiro ano do ensino fundamental, estudei no bairro onde eu morava; não consigo me lembrar do nome da escola. Quando estava no segundo ano do ensino fundamental, precisei me transferir de escola, pois meus pais se separaram e ficamos com minha mãe. Ainda em Cascavel, mas em outro bairro, lembro que a escola era bem pequena em relação à anterior, que era de madeira, com carteiras para se sentar em duplas. Fiquei nesta instituição por poucos meses. Mudamos para a cidade Nova Prata, no Paraná, onde residia uma tia de minha mãe. Moramos com ela por alguns meses e nesse período não fui ao colégio.

Seguimos mudando de cidade. Nesta época, que durou alguns anos, eu nem sempre frequentava a escola. Então chegamos à cidade de Balneário Camboriú, no estado de Santa Catarina, foi quando voltei a estudar. O colégio se chamava Ivo Silveira e nele permaneci. Gostei tanto deste colégio que até participei do Jogos Estudantis de Balneário Camboriú (JEBC), mas novamente nos mudamos. Migramos para Curitiba, estado do Paraná, por motivos de saúde da minha mãe; ficamos lá por três anos e pude continuar os estudos. Lembro que tive uma professora de Português muito boa, que me incentivava: dizia que eu tinha potencial, recordo da sensação boa que sentia ao ouvir essas palavras. Isto fez com que me dedicasse aos estudos.

Retornamos para Balneário Camboriú, e eu estava somente com a sexta série, ainda incompleta, mas decidi trabalhar para ajudar na renda de casa e minha mãe apoiou. O tempo passou: eu tentei voltar a estudar, mas nunca concluí. Me casei, tive meu primeiro filho e minhas prioridades mudaram, veio minha filha caçula e foquei em comprar uma casa. Os estudos voltaram às vezes a ser prioridade, durante os anos que se seguiram, mas sempre acabavam como um projeto engavetado.

Quando meu filho mais velho já estava com 15 anos, resolvi que era a hora certa de voltar a estudar, e, assim, por incentivo da minha família e do meu filho em particular, disse que já era hora de eu terminar os estudos. Colocaram como condição que desta vez eu não podia desistir. Algumas vezes, não tinha vontade de ir para escola, devido a minha rotina de trabalho: durante o dia trabalhava como faxineira e estudava à noite, isso era cansativo, mas como fui proibida de desistir, prossegui. Terminei o ensino fundamental pelo Colégio particular Liceu Catarinense, por meio do ensino supletivo. Já o ensino médio fiz no Instituto Federal Catarinense – Campus Camboriú (IFC), pelo Programa da Educação Profissional com a Educação Básica, na Modalidade de Jovens e Adultos (PROEJA), que conheci pela escola dos meus filhos. Disseram para inscrever meu filho para a prova de ingresso no ensino médio do IFC, comentaram que nesta instituição tinha graduação, cursos técnicos, e sabendo do meu interesse em retornar aos estudos, falaram do PROEJA.

Fui me informar na secretaria do IFC sobre o ingresso do ensino médio para o meu filho e para mim no PROEJA, fiz o cadastro inicial. Havia duas opções de curso integrado, Agente de Observação de Segurança e Agroindústria, preferi a primeira opção, o que foi ótimo, pois tive bons colegas. Alguns desistiram ao longo do caminho, outros durante a pandemia e esta foi a parte mais difícil. Terminar o curso por meio de ensino remoto foi um obstáculo a mais para superar. Os professores nos ajudaram muito durante todo o curso, e, depois, ainda no modo remoto, o dia da formatura foi emocionante. Chorei muito, fui a oradora da minha agora tão pequena turma. Me emocionei porque sei o quanto esperei, e o quanto foi difícil chegar ao final, foi uma conquista.

Por incentivo de alguns dos meus professores me inscrevi e passei para o curso de Licenciatura em Pedagogia, também no IFC; esses incentivos estiveram presentes em todo o processo, e só eu sei como foram importantes nas minhas escolhas. Espero no futuro ser o que meus professores foram para mim, espero ser sinceramente incentivadora de muitos que não acreditam na educação como um direito. Eu realmente acreditava em uma frase que ouvi meu pai dizer “Uns nascem para estudar, outros para trabalhar”, sempre pensei que estava no segundo grupo, mas a escola me abriu os olhos, mostrando que eu poderia ser mais que uma trabalhadora esforçada, que poderia fazer a diferença na vida dos outros. E no processo descobri que poderia fazer isso ensinando. Através do estudo vislumbrei um caminho novo, o qual nunca tinha sonhado em trilhar. Pensando nisso percebo que, antes de tudo, foi a minha vida que mudou.

Sobre a autora
Estudante do curso de Licenciatura em Pedagogia do Instituto Federal Catarinense – campus Camboriú. Uma versão preliminar deste texto foi escrita como atividade avaliativa da disciplina História da Educação, do citado curso, ministrada pela Profa. Dra. Marilândes Mól Ribeiro de Melo. Sobre a nova série de textos de estudantes do Instituto Federal Catarinense na coluna Entrememórias. Acesse aqui.


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