Por onde andam os adolescentes da EJA?

Adelson França Júnior

A presença de jovens de 15 a 17 anos cada vez maior na Educação de Jovens e Adultos tem sido um tema bastante debatido nos últimos anos. Aqui mesmo, nesta editoria, já fiz uma discussão que levantou a questão de como o direito à educação destes sujeitos é considerado quando estão na transição do Ensino Fundamental para crianças e adolescentes e a EJA. O texto pode ser acessado aqui.

Entretanto, esta maciça presença que, desde a sua regulamentação em 2010, têm ocupado entre 25% e 30 % das matrículas no Ensino Fundamental teve uma forte redução nos dois últimos anos, 2021 e 2022. A tabela abaixo mostra os dados nacionais das matrículas da última década.

Evolução do número de matrículas 15 a 17 anos na EJA-EF no Brasil – 2010-2022
Ano Matrículas EJA/EF 15 a 17 anos % Alteração %
2013 2.504.890 690.742 27,6 +2,2%
2014 2.344.484 642.972 27,4 -0,7%
2015 2.182.611 611.189 28,0 +2,2%
2016 2.105.535 576.806 27,4 -2,1%
2017 2.172.904 560.356 25,8 -5,8%
2018 2.108.155 525.291 24,9 -3,5%
2019 1.937.583 493.795 25,5 +2,4%
2020 1.750.169 434.639 24,8 -2,7%
2021 1.725.129 267.992 15,5 -37,5%
2022 1.691.821 266.815 15,7 1,3%

Fonte: Sinopse Estatística da Educação Básica 2010-2022. (INEP). Elaboração própria

Numa primeira análise é fundamental destacar a redução sistemática do número de matrículas, que demonstra, especialmente, a fragilização da modalidade enquanto política pública. Mas isso é tema para outro momento, pois se trata de outra análise complexa. A pergunta que nos mobiliza hoje surge da percepção de que, apesar da redução do número de matrículas gerais, a redução na faixa etária de 15 a 17 anos foi muito maior a partir de 2021, algo em torno de 37% em relação ao ano anterior.

Vale destacar que os dados aqui indicados têm origem no Censo Escolar que é realizado anualmente pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira considerando, tradicionalmente, como data-base a última quarta-feira do mês de maio. Entretanto, em 2020, por conta da pandemia do coronavírus, a data foi antecipada para 11 de março conforme a Portaria Inep nº 357, de 22 de maio de 2020.

Assim, apenas dos dados relacionados aos anos de 2021 e 2022 são os que podem refletir o impacto da suspensão das aulas presenciais e consequente adoção do ensino remoto emergencial para os jovens adolescentes da EJA.

Neste ponto está nossa principal hipótese para a elaboração da resposta à pergunta que dá título a este texto. Junto com Boaventura Sousa Santos, ecoamos a ideia de que a pandemia impactou de forma muito mais cruel a vida de sujeitos que já viviam o processo de exclusão e outro isolamento social que remete às vulnerabilidades econômicas e territoriais que potencializam os preconceitos raciais, de gênero e orientação sexual, religiosos e demais formas de opressão. Nas palavras dele

Qualquer quarentena é sempre discriminatória, mais difícil para uns grupos sociais do que para outros e impossível para um vasto grupo de cuidadores, cuja missão é tornar possível a quarentena ao conjunto da população. Neste capítulo, porém, analiso outros grupos para os quais a quarentena é particularmente difícil. São os grupos que têm em comum padecerem de uma especial vulnerabilidade que precede a quarentena e se agrava com ela[…]. (SANTOS, 2020, p.15)

Nesse sentido, a exclusão a que estão submetidos os jovens adolescentes da EJA pode ter potencializado a ausência deles na escola. Como já dissemos, o lugar que este jovem ocupa acaba se configurando em uma espécie de “não-lugar”, pois são excluídos do Ensino Fundamental para crianças e adolescentes porque estão “fora de faixa”, mas também sofrem outros processos excludentes na EJA por se tratar, tradicionalmente, de uma modalidade centrada nos adultos e idosos. A afirmação deste “não-lugar”, ou um lugar periférico, amplifica a falta de pertencimento e a ausência de contextualização pedagógica e política da escola. Sobretudo no período de ensino remoto emergencial, em que as escolas enfrentaram enormes desafios.

Cabe agora analisarmos cada um dos contextos e territórios para saber por onde andam pelo menos 160 mil estudantes brasileiros que novamente estão fora da escola. Aguardemos os dados de 2023 para saber se a tendência estatística se mantém. O fundamental é reafirmarmos nossa perspectiva da educação como direito humano e social especialmente para os sujeitos da EJA que já têm tantos direitos negados.

 

Sobre o autor
Educador da EJA na PBH e professor na UEMG-Ibirité. Pedagogo e Mestre em Educação

Para saber mais
SANTOS, Boaventura de Sousa. A cruel pedagogia do vírus. Boitempo Editorial, 2020.


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