Pedro Demo
Chegaram os dados do PISA 2015 (Cruz & Bermúdez, 2016) e, “para variar”, nova ducha de água fria. Nem poderia ser diferente, porque não fizemos, literalmente, nada entrementes para mudar a situação. No entanto, como sempre acontece, passado o susto – que nem mais assusta tanto – voltamos ao “normal” – vamos continuar investindo neste defunto, como se nada houvesse acontecido. É impressionante a incapacidade de diagnóstico do MEC e do sistema de ensino vigente: os dados se repetem monotonamente em sua indicação de que o sistema é estúpido, para estúpidos, mas disso não se extrai nenhuma consequência útil. Vamos continuar apostando nesta farsa. O Relatório exara que o desempenho dos estudantes brasileiros em matemática e ciências piorou em comparação com 2012. Quanto à capacidade de leitura, os resultados persistem em patamares muito baixos, não mudando a média considerada ruim.
Em matemática (Tabela 1), 70.3% ficaram abaixo do nível 2 – patamar mínimo na OCDE como necessário para que o estudante exerça plenamente sua cidadania: os estudantes não conseguem responder às questões da disciplina com clareza e identificar/executar procedimentos rotineiros de acordo com instruções diretas.
A média obtida pelos brasileiros foi em 2015 de 377 pontos, muito abaixo da média da OCED (490) – os melhores colocados tiveram médias de 524 (Coreia0, 516 (Canadá0 e 511 (Finlândia). Em 2012, a média foi de 389, registrando-se, então, recuo em 2015. Habilidade em matemática é definida como capacidade individual de formular, empregar e interpretar a matemática numa série de contextos, incluindo raciocínio matemático e uso de conceitos, procedimentos, dados e ferramentas para descrever, explicar e prever fenômenos (com seis níveis de proficiência).
Quanto à leitura, metade dos brasileiros continua com dificuldades de interpretação (Tabela 2).
Consta que 51% dos estudantes não possuem o nível que a OCED fixa como necessário para que se possa exercer plenamente a cidadania – não ultrapassam o nível 2; há dificuldades de trabalhar textos e documentos oficiais, como notas públicas e notícias, com problemas em interpretar informações e integrar textos. O Brasil chegou em 2015 a 407 pontos, enquanto a OCEDE a 493 – o desempenho brasileiro estaria estagnado.
Brasileiros mostraram maior facilidade para lidar com textos pessoais, email, mensagens instantâneas, blogs, cartas pessoais e textos informativos, sendo também safos em localizar e recuperar informação de um texto. O Brasil ficou atrás do Canadá (em primeiro lugar com 527 pontos), Finlândia (526) e Coreia (517), estando o desempenho geral brasileiro abaixo da média da OCED, com hiato persistente.
Estagnação também consta em Ciências.
Quando se avaliam habilidades de investigação científica, o Brasil chegou a 401 pontos, bem abaixo da média da OCDE (493) e em queda desde 2012. Observou-se que 56.5% dos brasileiros tiveram desempenho abaixo do nível 2 – não são capazes de identificar uma explicação científica, interpretar dados e identificar a questão abordada em um projeto experimental simples de complexidade mediana.
Os dados, no entanto, mostraram um traço já reconhecido no Ideb: escolas públicas federais estão à frente das privadas. A média nas escolas federais chegou em ciências a 517 pontos, enquanto nas particulares a apenas 487 pontos. Em leitura, os desempenhos foram de 528 e 493, respectivamente; em matemática, de 488 e 463, respectivamente. Tais resultados poderiam indicar que nessas escolas públicas (as federais) existe algum cuidado maior com a aprendizagem, enquanto nas particulares o sistema de “ensino” instrucionista (decoreba) impera. Lembremos que no Ideb de 2015, no ensino médio, a escola privada vem caindo desde 2013, além de não ter atingido a meta em nenhum caso (anos iniciais, finais e EM). Indicaria que o instrucionismo típico da escola privada (conteudismo, entupimento de conteúdo, obsessão pela aula) está em xeque.
O estudo de 2015 incluiu 23.141 estudantes brasileiros de 841 escolas, nas idades de 15 e 16 anos. O Brasil nunca se saiu bem no PISA (Demo, 2014), postando-se na parte mais baixa da tabela geral dos participantes no teste. Também nunca tomou providências mínimas para melhorar. Há mais de 20 anos Chile fez seu “Ideb” e descobriu 900 escolas em condição insatisfatória. Hoje é possivelmente o país mais destacado em educação básica na América Latina. Pode-se mudar, sim, desde que se faça diagnóstico técnico honesto e produzamos ações preventivas adequadas. O Brasil é talvez o país com mais dados sobre seu desempenho escolar (Ideb, Enem etc.), mas também o que mais ignora os dados que produz. São para inglês ver. Colhemos o que plantamos.
Este PISA não traz nada de novo, propriamente. Repisa que seria imprescindível repensar radicalmente o atual sistema de ensino. Para ilustrar esta posição, dou o exemplo da falta crônica de professores de física (Foreque et alii, 2013) – menos de 20% dos professores de física possuem o curso de física. Muitos diriam que a reação correta é produzir mais professores de física, para preencher o hiato clamoroso. Ledo engano. Produzir os mesmos professores de física que a universidade produz hoje é, como se diz na gíria, chover no molhado. É precisão reinventar o curso de física completamente. Implica este reconhecimento que o atual sistema não tem como produzir o professor de física que a escola precisa. Produz o mesmo amador de sempre, no fundo, inútil para a escola. Não é culpa dele. É de um sistema que capricha numa proposta pedagógica intestinamente imbecilizante. O próprio fracasso atual da escola privada berra esta insanidade.
Mas a universidade sabe o que é “aprender bem”, não só porque é a detentora das melhores pesquisas e teorias da aprendizagem, mas sobretudo porque tem uma prática bem reconhecida (mesmo também bastante criticada hoje em dia), que é a pós-graduação stricto sensu (mestrado e doutorado). Para formar mestres e doutores, a universidade segue os resultados básicos da pesquisa sobre aprendizagem, que enfaticamente acentuam atividades autopoiéticas (biologicamente falando) como pesquisar, ler, estudar, elaborar, que “puxam” pela iniciativa e motivação estudantil. Não se baseia em aulas, mas em pesquisa, ostensivamente. Um mestre muda de patamar acadêmico, não por aula, mas por pesquisa. Ele é formado como “autor”, não papagaio de conteúdos alheios. A experiência do Pibic vai também nesta direção: sabemos que o estudante que mais bem aproveita a graduação é quem pesquisa (Calazans, 1999). No entanto, a universidade não universalizou esta experiência comprovadamente exitosa (com apoio de bolsa do CNPq), muito menos tenta montar a graduação no “espírito” do doutorado (com base na produção científica do estudante) (Bok, 2007).
Os reveses só valem a pena quando aprendemos deles.
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